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O fantasma da inflação retorna ao cenário brasileiro, e com ele a mesma fórmula de sempre: elevação das taxas de juros.

Em sua última reunião, o Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, decidiu elevar a taxa Selic em 1 ponto percentual, para 14,25% a.a, reforçando a estratégia de controle inflacionário via aperto monetário. Esse mecanismo busca conter a alta dos preços ao desestimular o crédito e o consumo, mas tem efeitos colaterais severos, como a desaceleração da economia real e a inibição de investimentos produtivos.

Mas por que chegamos aqui?

Estamos correndo o risco de um novo surto inflacionário, e os alimentos estão no centro do debate. Aqui, existe uma série de fatores que tornam esse setor o vilão da vez.

Choques de oferta e clima adverso

Eventos climáticos extremos, como secas, tempestades e até terremotos, estão pressionando a produção agrícola global. Na semana passada, um terremoto de 7,7 pontos na escala Richter afetou a Tailândia, o que pode ter impactos indiretos no comércio de commodities. Além disso, secas severas no Brasil e em outros países produtores têm elevado os preços de grãos e proteínas, reforçando o efeito inflacionário.

A política fiscal como fator inflacionário

O governo busca o superávit primário, mas, ao mesmo tempo, tem elevado seus gastos e, para conquistar o equilíbrio fiscal, tem recorrido ao aumento de impostos. Isso cria uma armadilha: ainda que as contas públicas fiquem no azul no curto prazo, a carga tributária adicional será repassada ao consumidor final, gerando mais inflação e anulando parte do esforço fiscal.

Uma medida assertiva foi a redução dos impostos sobre uma cesta de alimentos importados, o que pode atenuar os preços. No entanto, é essencial avançar em outras frentes para garantir estabilidade no longo prazo.

Estoques reguladores

Uma alternativa para conter a inflação dos alimentos seria a adoção de estoques reguladores. Países como Estados Unidos e China utilizam essa estratégia para estabilizar preços em momentos de escassez. O Brasil já teve estoques públicos de grãos, mas, nos últimos anos, essa política foi deixada de lado. Retomar esse mecanismo poderia evitar oscilações bruscas e proteger o consumidor.

Impacto das decisões globais:

Trump e o ‘Dia da Libertação’
Nesta semana, surge um novo fator no cenário internacional: o chamado “Dia da Libertação”, anunciado por Donald Trump. Segundo o Presidente dos EUA, será o início de uma nova política de reciprocidade comercial, impondo tarifas contra países que, na visão americana, praticam concorrência desleal.

Esse movimento já gerou receio nos mercados globais, inclusive as principais Bolsas europeias fecharam em queda, na última sessão, o FTSE 100 de Londres, recuou 0,08%, fechando em 8.658,85 pontos. O DAX, de Frankfurt, caiu 0,98%, cotado em 22.455,90 pontos, enquanto o CAC 40, de Paris, recuou 0,93%, encerrando a sessão em 7.916,08 pontos.

Se o termômetro externo ficou vermelho, é preciso se atentar em relação a inflação dos Estados Unidos. Caso os preços nos Estados Unidos subam, o Federal Reserve pode ser forçado a manter os juros elevados por mais tempo, tornando os títulos americanos mais atrativos para investidores globais. Isso pressionaria o real, exigindo que o Copom mantenha juros altos para segurar a saída de capital do Brasil.

Diante desse cenário, não há muitas saídas fáceis. Os EUA possuem uma economia sólida e capacidade de atrair investimentos com juros competitivos, tornando o dilema brasileiro ainda mais complexo.

O problema central: a fórmula ultrapassada para lidar com a inflação

Temos um problema grave – e não é apenas a inflação em si. O verdadeiro dilema está na resposta automática do Brasil para qualquer alta de preços: subir os juros. Essa abordagem tradicional gera impactos desproporcionais na economia real e precisa ser complementada com medidas estruturais.

Como resolver?

Existem diversos caminhos para evitar que a única resposta ao problema inflacionário seja manter juros elevados:

Ajuste fiscal com credibilidade:

O governo precisa demonstrar compromisso real com o equilíbrio das contas públicas. Isso não significa subserviência ao mercado, mas sim adotar medidas concretas para reduzir déficits sem recorrer a aumentos excessivos de impostos.

Política econômica focada no crescimento sustentável:

Apostar apenas no consumo para impulsionar o PIB pode gerar crescimento de curto prazo, mas traz riscos inflacionários. Um modelo mais equilibrado deveria focar também em investimentos em infraestrutura e produtividade.

Alternativas ao crédito baseado no FGTS:

O governo autorizou que trabalhadores usem o FGTS como garantia para novos empréstimos. Mas, em vez de estimular mais endividamento, por que não liberar um saque especial do fundo? Isso injetaria dinheiro na economia sem aumentar o endividamento das famílias. Segundo a Confederação Nacional do Comércio (CNC), 76% das famílias brasileiras estão endividadas, e 28% estão inadimplentes.

Reforma tributária e desoneração:

Reduzir impostos seletivamente poderia estimular a oferta e reduzir preços. Menos burocracia e custos tributários sobre setores produtivos podem contribuir para maior eficiência econômica sem gerar pressão inflacionária.

INSS

Hoje, as alíquotas do INSS são progressivas, mas ainda pesam sobre quem ganha menos. Diminuir a tributação sobre faixas salariais mais baixas aumentaria o poder de compra dos trabalhadores formais.

Essa medida também colocaria mais dinheiro na economia, principalmente na ponta mais fraca, sem que ele precise fazer mais uma dívida.

Em resumo, o Brasil precisa modernizar sua política econômica. A inflação não pode ser combatida apenas com juros altos, e é hora de buscar soluções estruturais para garantir estabilidade sem sacrificar o crescimento.