O Brasil vive um dilema histórico: o de ser o eterno país do futuro.
Entre os anos de 1940 e 1960, crescemos, em média, 5,8% ao ano. Durante o Milagre Econômico, de 1968 a 1973, rompemos a barreira dos 10%. De 1974 a 1980, a expansão desacelerou, mas ainda mantinha níveis robustos — cerca de 6% ao ano. A partir de 1981, porém, entramos numa trajetória de declínio.
Em 1980, o PIB brasileiro representava 4,3% do mundial. Desde então, a participação só caiu: 3,6% em 1990, 3,1% em 2000, 2,4% em 2020 e apenas 2,3% em 2022.
Esse crescimento do passado teve base em uma industrialização tardia, iniciada por Getúlio Vargas. Nos anos 1950, ergueu-se Brasília como símbolo de um novo Brasil. Vargas criou a indústria de base; o regime militar, por sua vez, expandiu essa ambição com a criação de um forte complexo industrial — Embraer, Correios, Proálcool, Embrapa — que alçou o Brasil à vanguarda do agronegócio.
Com a redemocratização, mudou também o modelo econômico. Em vez de aprofundar um projeto de nação, adotamos a cartilha neoliberal e o receituário do Consenso de Washington.
Sarney iniciou a abertura econômica. Collor a acelerou. FHC promoveu privatizações e desmontou parte da estrutura industrial. Empresas como a Embraer foram transferidas à iniciativa privada.
A Gurgel, que chegou a produzir um carro elétrico, foi abandonada em favor dos importados. Marcas como Arno, Gradiente, Miura e Varig desapareceram nos anos 1990. Culpar a hiperinflação ou a baixa renda seria simplista.
O verdadeiro problema foi a perda de produtividade provocada por uma abertura comercial sem planejamento estratégico, sem políticas de proteção ou modernização da indústria nacional.
Ao deixarmos de produzir, abrimos mão da produtividade. E produtividade importa: um trabalhador brasileiro leva uma hora para gerar o que um norte-americano faz em 15 minutos — ou um alemão, em 20. Isso não é falta de esforço, é um modelo produtivo ultrapassado.
Hoje, o Brasil é cada vez mais dependente de tecnologia e inovação externas. E a lição parece não ter sido aprendida: a Avibras, uma das últimas empresas nacionais de tecnologia de ponta, está sendo vendida.
Quando uma empresa assim desaparece, não é apenas um empresário que perde. É toda uma cadeia produtiva, intelectual e estratégica que se desfaz.
Talvez a desindustrialização brasileira não tenha sido só uma consequência — tenha sido uma escolha. Enquanto a economia real perdia espaço, o mercado de capitais se fortalecia. Nos anos 1990, muitos bancos quebraram, mas também houve fusões — e a concentração do sistema financeiro nas mãos de dois grandes bancos começou a se consolidar.
Eis a contradição: temos um sistema financeiro entre os mais modernos do mundo, enquanto nossa economia real permanece com baixa produtividade. Vivemos num país de baixos salários, com uma indústria estagnada em padrões do século XX e uma política monetária que, ao invés de incentivar a produção, frequentemente favorece o capital financeiro em detrimento da economia real.
A baixa produtividade, por sua vez, gera um efeito colateral: a estagnação dos salários. Embora países como China e Vietnã tenham produtividade superior e salários médios ainda baixos, há ali um movimento claro de acumulação tecnológica e ganho de competitividade global. Aqui, a baixa produtividade é estagnante, não ascendente.
Nos últimos 30 anos, seguimos na contramão do mundo. China e Vietnã, nesse mesmo período, se prepararam.
Pensar hoje em reindustrialização pode soar nostálgico. Mas não esqueçamos: durante a pandemia, até máscaras descartáveis vieram da China.
O leitor atento pode objetar: “Mas a China é competitiva porque o custo de produção no Brasil é alto.” Sim, é verdade. Mas para reduzi-lo, não basta baixar juros ou desburocratizar. E o principal: desregulamentar as leis trabalhistas, ou seja, tirar benefícios como FGTS ou mudar o regime celetista para PJ, via MEI.
Esses passos nominalmente reduzem o custo da mão de obra, mas ao tomar essas decisões, não se enfrentará a raiz do problema. Talvez aumente-se o lucro do empresário por um certo tempo. Mas é preciso, antes de tudo, aumentar a produtividade.
E produtividade não brota do acaso. Exige investimento em capital humano, tecnologia e, sobretudo, uma estratégia de desenvolvimento nacional. Se queremos deixar de ser o país do futuro, talvez seja a hora de construir — de verdade — o Brasil do presente.