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Veja como foi o segundo dia do Congresso Paulista

O segundo dia do Congresso Paulista de Economia, realizado pelo Conselho Regional de Economia de São Paulo (Corecon-SP) manteve o foco na sustentabilidade, mas destinou bastante espaço para o desenvolvimento do setor industrial em si.

Para falar deste tema e da importância de a indústria crescer com base em conceitos sustentáveis, foram convidados representantes da academia, do poder público, de sindicatos de trabalhadores e da própria indústria.

Confira a cobertura dos debates:

Tema: Tributação e orçamento público e o desenvolvimento econômico e social sustentável

“O Estado é uma peça-chave no desenvolvimento e tem de funcionar independentemente de ideologias”.

A frase foi dita pelo vice-presidente do Corecon-SP, Odilon Guedes, durante sua participação no debate com o economista, escritor e professor da PUC-SP, Ladislau Dowbor.

Odilon disse que o Estado, para existir, precisa tributar e que essa tributação tem de ser justa porque não é correto cobrar impostos da maioria da população e deixar de fora grandes fortunas, por exemplo, ou mesmo dar isenção a determinados grupos econômicos.

Ele também ressaltou a importância de o governo poder definir o orçamento de forma estratégica, de acordo com os interesses do país e da população como um todo e não apenas visando a grupos específicos.  Ladislau Dowbor, por sua vez, comentou que se pegarmos o PIB mundial e dividirmos por toda a população existente no mundo, veremos que não há razão para haver pobreza extrema, pois a renda per capita seria suficiente para que cada cidadão vivesse com dignidade.

No Brasil, especificamente, não é diferente. O problema é que boa parte dos gastos do governo é com o pagamento de juros, que consome pelo menos 10% da arrecadação.

 “A taxa de juros atual é escandalosa. E o pior é que nossos impostos são transformados em lucro para os investidores financeiros. E são os próprios bancos que reaplicam o dinheiro do pagamento de juros, travando a economia e desestimulando a iniciativa produtiva”, disse Dowbor.

Ele também lembrou que os juro anual para pessoa física é de 51% no Brasil para uma inflação de 4%, enquanto na Europa o juro é de 4% ao ano.

Tema: Parques tecnológicos

Em um país que não só precisa se reindustrializar, mas também se desenvolver tecnologicamente para participar do “jogo econômico” mundial em situação de igualdade, uma das soluções é a implantação de parques tecnológicos pelo país. Foi sobre este tema que Walker Ferraz, administrador de empresas com MBA em gestão pública, e Welinton dos Santos, mestre em gestão pública, falaram durante suas apresentações.

Ferraz fez uma rápida apresentação sobre o Centro de Inovação de Jacareí, cidade do interior do Estado de São Paulo, enquanto Welinton apresentou uma amostragem mais geral sobre os diversos parques tecnológicos existentes no Estado. Ambos destacaram a importância desses parques no processo de desenvolvimento e inovação.

Eles se diferenciam das incubadoras porque não se limitam a fomentar novas empresas. O foco destes parques é a geração de soluções e o fomento de empresas capazes de criar serviços e produtos de alto valor agregado, assim como formar pessoal especializado.

As vantagens são muitas para uma cidade que implanta um parque tecnoilógico. A começar pelo fato de atrair mão de obra de alta qualidade, atrair investimentos de empresas de grande porte interessadas nas soluções que ali são criadas, além do que fazem a integração das cadeias produtivas já existentes. Os dois, porém, lembram que montar um parque tecnológico não é simples. Os existentes no Estado de São Paulo começaram a ser implantados há cerca de 15 anos. É preciso umprojeto bem elaborado e tempo de maturação.

Tema: Iniciativas de desenvolvimento econômico sustentável

O terceiro painel do segundo dia de Congresso foi particularmente interessante, pois tratou de iniciativas do poder público em prol do desenvolvimento sustentável dos pontos de vista macroeconômico e microeconômico. À frente desta discussão as palestrantes Aline Cardoso, especialista em inclusão produtiva e desenvolvimento sustentável, e Thalita Ferreira de Oliveira, economista e mestre em políticas públicas.

Thalita, que atua no Ministério da Fazenda, comentou sobre o trabalho que está sendo colocado em prática pelo governo federal com o objetivo de reindustrializar o país, porém, com foco na tecnologia e na sustentabilidade.

Segundo ela, o Ministério da Fazenda foca na regulamentação dos setores e atua para criar os mecanismos de financiamento. Porém, o trabalho envolve outros nove ministérios. Regulação do mercado de carbono, Taxinomia sustentável, Estrutura produtiva das cadeias de valor e plano de transformação ecológica estão entre os pontos trabalhados. O plano traz um novo paradigma para a indústria nacional.

Aline Cardoso complementou dizendo concordar que para o Brasil se tornar um player importante e ter sua independência na produção industrial é preciso que o planejamento tenha uma visão macro e um direcionamento estratégico do Estado.

Ela só faz uma ressalva: “muitas vezes a gente não presta atenção na atuação local”. O que ela quis dizer é que o planejamento macro é importante, porém, é preciso também pensar a economia e a sustentabilidade em nível municipal. Até porque são nos bairros das cidades que estão os empreendedores que, no fim do dia, irão vivenciar na prática os resultados das políticas macro.

Tema: Nova política industrial e desenvolvimento

O painel foi reservado para falar do NIB (Nova Indústria Brasil) que é o programa do governo para fortalecer a indústria brasileira nos próximos anos e torná-la inovadora e competitiva internacionalmente, além de sustentável. Para o economista João Emilio Gonçalves, o país está melhor do que no governo anterior pelo simples fato de ter, novamente, uma política industrial.

Ele elogiou a interação do Ministério da Fazenda com outros ministérios para tornar esse projeto uma realidade, mas apontou alguns desafios que precisam de atenção. A agenda de financiamento parece caminhar mais rapidamente, no entanto ele observa que o fato de haver muitos ministérios envolvidos dificulta o andamento do processo porque existe mais de um protagonista envolvido, o que pode acender a “fogueira das vaidades”. Então, é preciso muita clareza sobre quem decide o que.

O economista e diretor de Desenvolvimento Industrial da CNI (Confederação Nacional da Indústria), Rafael Lucchesi, aproveitou sua participação para reforçar a importância desta política para os rumos do país.

A indústria é responsável por produtos de alto valor agregado, paga os melhores salários e não pode ser tratada de forma secundária. Ele lembrou que é o setor que mais paga impostas no Brasil, ao contrário do que ocorre com o agronegócio, que praticamente é isento.

Além disso, países como os Estados Unidos e outros da União Europeia, Japão, China etc, têm suas políticas industriais porque sabem da importância disso para a economia do país. Por que, então, o Brasil demorou tanto para colocar em prática uma política própria? Simultaneamente ao NIB, é importante que o país reveja a taxa de juros altíssima, pois isso inviabiliza novos empreendimentos.

Tema: trabalhadores e desenvolvimento econômico e social

O Congresso reservou espaço para uma mesa redonda envolvendo três representantes de sindicatos de trabalhadores. Afinal, não existe economia sem aqueles que produzem. Os sindicalistas em questão foram Adriano Lateri, vice-presidente da Força Sindical, Murilo Pinheiro, presidente do Sindicato dos Engenheiros de São Paulo, e Ricardo Patah, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT) e do Sindicato dos Comerciários de São Paulo.

Lateri lembrou que a reforma trabalhista foi feita prometendo mais empregos, o que não aconteceu. Pior, resultou em precarização do trabalho. Outro ponto lembrado foi o projeto aprovado pelo Congresso para acabar com o imposto sindical, o que quase matou o movimento sindical do país. Murilo Pinheiro até comentou que sua entidade oferecia cursos gratuitos aos associados, mas por causa do fim do imposto houve a necessidade de encerrar o projeto educacional por falta de recursos financeiros.

Ricardo Patah, por sua vez, disse que o movimento sindical não se limita a brigar por salários e condições de trabalho. Pelo contrário, as entidades que representam os trabalhadores também se envolvem em temas como educação, saúde e direitos dos trabalhadores em geral. Inclusive, na época da pandemia, diversos dirigentes sindicais se empenharam para ajudar a minimizar gargalos como falta de mácaras, por exemplo. Eles atuaram junto à empresas que tinha capacidade de produzir e suprir, mesmo que parcialmente, materiais e produtos importantes naquele momento de crise sanitária.

Por fim, os três se mostraram satisfeitos e apoiam as políticas de aumento real do salário mínimo, de reindustrialização, entre outros como o combate à fome. Quanto ao imposto sindical, eles são contrários à cobrança da forma como era feita, mas entendem que os sindicatos prestam serviços e é preciso debater uma forma de eles poderem cobrar pelo serviço prestado. Até porque precisam se manter.

 Tema: Solução de conflitos e desenvolvimento sustentável

Esse painel buscou criar um link sobre um problema que é a resolução de conflitos na Justiça e o impacto disso no desenvolvimento sustentável. Para tanto, o desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, Carlos Henrique Abrão, disse que o Brasil deve ocupar, no mundo, um lugar privilegiado em matéria de litígios.

São mais de 60 milhões de processos uma desvantagem quando o assunto é sustentabilidade porque além do custo, há uma demora muito grande para a resolução. Houve uma pequena melhora porque nos últimos cinco anos foram implantados métodos alternativos de mediação e arbitragem, sendo o último mais adequado para o mundo corporativo. O problema é que temos leis ainda obsoletas, criadas há 50 anos e que não foram atualizadas. E isso atrapalha muito na tomada de decisões por parte de quem está julgando.

O outro participante do painel, José Marcos de Campos, coordenador do Fórum de Perícias do Corecon-SP, fez uma relação sobre projetos de sustentabilidade e os riscos de conflitos que eles podem gerar. Ele tomou como exemplo o Plano Estadual de Energia de São Paulo para 2050, que visa modernizar a matriz energética tornando-a mais sustentável.

Em um país onde a quantidade de conflitos é gigante e a solução demora a chegar, mas problemas são esperados.

Por mais importante que a modernização da matriz energética possa ser, há contratos em vigor que precisarão ser modificados, impactos nas comunidades locais que serão alvos de ações, além do risco de a troca da matriz não ter a carga de carbono avaliada. Tudo pode gerar conflitos que precisarão ser solucionados. E o sistema judiciário precisará estar preparado para isso.

Tema: Financiamento para o desenvolvimento econômico e social sustentável

O presidente do Desenvolve SP, agência de fomento do Estado de São Paulo, Ricardo Brito, nos EUA a diferença média de produtividade entre os 10% de empresas mais produtivas e os 10% de empresas menos produtivas do setor é de 2 vezes. Já no Brasi, ao se fazer essa comparação usando a mesma equivalência a diferença é maior do que 5 vezes.

“Significa que as empresas brasileiras são muito menos produtivas e a razão disso é a falta de crédito. Como as empresas brasileiras não conseguem crédito, elas trabalham com tecnologias menos modernas e, desta forma, ficam menos produtivas” disse.

Neste sentido, o Assessor da presidência e membro da Comissão de Estudos Estratégicos do BNDES, Antonio Corrêa de Lacerda – informou que o volume de crédito concedido pelo órgão tem crescido em todos os setores, mas sobretudo na indústria e na infraestrutura. Com relação às micro e pequenas empresas, ele informou que, no primeiro semestre deste ano houve um aumento do financiamento da ordem de 53,2% em relação ao mesmo período de 2023 e de 106 % em relação aos primeiros seis meses de 2022.

Lacerda ressaltou ainda o fato de o BNDES ser o principal financiador do Nova Indústria Brasil (NIB) iniciativa que visa a neoindustrialização do país. “Além disso, trabalhamos em sintonia com o Plano Nacional de Transição Energética e o Novo PAC. Consideramos que estamos avançando no sentido de termos um novo BNDES porque as demandas são novas e ligadas à questão da sustentabilidade e outras inovações. Para isso, estamos utilizando também novos instrumentos de funding, como a, Letra de Crédito e Desenvolvimento (LCD), por exemplo”, disse.

O Sócio, Fundador e CEO do Banco Acreditar, Kiko Furtado provou os presentes sobre a necessidade de fazer com que a pauta da sustentabilidade entre nas agendas das empresas. “Os empresários deveriam procurar mais o Desenvolve-SP, o BNDES e as outras alternativas para captação de investimentos relacionados à sustentabilidade. Eles estão tão preocupados em pagar as contas que não pensam em buscar este tipo de alternativa”, disse.

Tema: Questões climáticas 

No painel que analisou as questões climáticas, a Doutora em Relações Internacionais pela London School of Economics e PHD em cooperação internacional, com especialidade em governança global (comércio, clima & sustentabilidade e gênero) e mercado europeu, Carolina Pavese contextualizou o assunto revelando que o Brasil tem perdas de R$ 13 bilhões anuais devido aos eventos climáticos extremos e que essa situação produzirá um total de 800 mil a 3 milhões de brasileiros vivendo em extrema pobreza até 2030.

“É impossível num cenário como esse achar que vamos conseguir desenvolver a economia com os modelos do passado para depois pensar em desenvolvimento sustentável”, disse.

Ela defende a necessidade urgente de construir uma agenda que permita combater esse problema. Uma das alternativas seria a intensificação da economia circular. “É preciso reduzir o consumo e para isso uma das tendências é a lógica de transformar o consumo e o bem em serviço. De uma maneira prática, estamos falando, por exemplo, em compartilhamento de carros e utensílios domésticos. Por que todo mundo tem que ter um veículo se usamos ele apenas poucas horas em um dia? Porque todos precisam ter sua própria furadeira ou batedeira de bolos se usamos estas máquinas muito poucas vezes. Poderíamos ter um modelo no qual esse tipo de bem seja apenas emprestado para quem precisa naquele determinado momento. Essas práticas potencializariam uma industrialização responsável e orientada para uma rota de sustentabilidade e descarbonização coordenada”, disse.

Por sua vez, o Secretário Executivo de Mudanças Climáticas da prefeitura de São Paulo José Renato Nalini, chamou a atenção para as principais ameaças que rondam a capital paulista em uma projeção para os anos compreendidos entre 2030 e 2050. Neste sentido, foram apontadas as inundações, as secas meteorológicas e as ondas de calor, com o aquecimento da temperatura sendo considerado o problema mais grave.

“Por incrível que pareça, as ondas de calor matam mais do que as ondas de frio. Só para ter uma ideia, o ano de 2023 foi o mais quente da história e novembro o mês mais quente de todos. O dia nove daquele mês foi o mais quente dos dias e neste dia registramos um pico recorde de internação nos hospitais”, disse.

Nalini ressaltou os impactos das questões climáticas sobre o setor econômico apresentando dados de um estudo segundo o qual em 2023 o clima impactou 51% dos pequenos e médios empresários do município. Segundo ele, o Plano de Ação Climática do Município de São Paulo tem como meta reduzir em 20% as emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) da cidade até 2030 incondicionalmente e 50% condicionalmente.

Tema:  O sistema financeiro e o desenvolvimento econômico e social do Brasil

Na palestra de encerramento do congresso, o assessor da presidência e membro da Comissão de Estudos Estratégicos do BNDES, Antonio Corrêa de Lacerda, explicou que o Brasil tem o desafio de transformar suas potencialidades climáticas e energéticas em possibilidade de ampliação de sua capacidade de inovação e participação no comércio global.

“O volume de exportações do Brasil atualmente é incompatível com seu peso na economia global. Estamos entre as dez maiores economias do mundo, mas somos apenas o 24º em volume de exportação”, justificou.

De acordo com ele, o mundo vivencia um momento de grande oportunidade para mudar este cenário. “É um novo ambiente econômico internacional moldado principalmente pela recolocação das cadeias produtivas. Todos os paradigmas estão sendo revistos para garantir a independência em termos de estoque e fornecimento. Além disso, existe a perspectiva de um renascimento do setor automobilístico baseado numa melhora da questão ambiental e sustentável. O Brasil não precisa escolher entre comodities e serviços. As duas coisas podem conviver de forma harmoniosa e o conjunto de políticas que estão sendo adotadas vão neste sentido, tendo como foco a ampliação da capacidade de investimento e da realização de pesquisa e desenvolvimento”, declarou.

Relançamento de livros
Durante o Congresso Brasileiro de Economia, aconteceu o relançamento dos livros do professor doutor Antonio Corrêa de Lacerda, conselheiro do Cofecon:

  • Reindustrialização: para o Desenvolvimento do Brasil
    O Mito da Austeridade
    Celso Furtado 100 Anos: Pensamento e Ação

O público teve a oportunidade de adquirir os livros, pedir um autógrafo e interagir com o autor.

Agradecimento

Ao encerrar este evento, fica claro que o congresso não apenas atingiu seus objetivos, mas também estabeleceu um novo padrão de excelência e relevância.

Realizado na Fecap, em uma celebração que também marcou os 90 anos da primeira turma de Ciências Econômicas da instituição, o congresso destacou-se pela profundidade dos temas abordados. A parceria com a Gerando Falcões, com a reversão dos valores dos ingressos para a entidade, ressaltou o compromisso do Corecon-SP com a transformação social e a promoção de oportunidades para jovens em situações vulneráveis.

O Corecon-SP agradece a todos que contribuíram para a realização e o sucesso do evento.

Que este congresso seja lembrado como um marco significativo na trajetória do Corecon-SP e continue a inspirar ações e mudanças positivas no cenário econômico!