O SEPTUAGENÁRIO CORECON-SP, OS 72 ANOS DA LEI 1.411/1951 E O DETALHAMENTO DO CAMPO PROFISSIONAL QUE NÃO FOI APROVADO
É sabido que a Lei 1.411, regulamentadora da profissão do Economista, foi publicada em 13/08/1951, portanto há pouco mais de 72 anos.
Não tão conhecida é a luta travada pelos economistas de então, entre os quais diretores do Sindecon-SP e que comporiam os primeiros Plenários do Corecon-SP, a partir de 1953.
Houve enorme resistência de outras corporações profissionais, mas os pioneiros da nossa categoria conseguiram a tramitação simultânea de três projetos de lei, a fim de que ao menos um deles fosse aprovado:
- Em 21/08/1947, o deputado Pedroso Junior (PTB-SP) apresentou o PL 618/1947, que, ao final, restou arquivado.
- Em 08/10/1947, o deputado Berto Conde (PTB-SP) apresentou o PL 802/1947, igualmente arquivado.
- Em 25/05/1948, o deputado Pedroso Junior (PTB-SP) apresentou o PL 367/1948, que, finalmente, foi convertido na Lei 1.411/1951.
No livro “História do Conselho Regional de Economia da 2ª. Região – São Paulo”, republicado agora, em 3ª. edição, constam relatos preciosos do primeiro presidente daquele Corecon, Ubirajara Dib Zogaib, em sua posse, em 1953, sobre as pedras que foram colocadas no caminho desses projetos de lei, muito inteligentemente superadas com a eleição do deputado federal Fernando Ferrari (PTB-RS), economista, que levou adiante a causa, até conseguir a sanção presidencial.
Mas o objeto central deste artigo é o Projeto de Lei 2.367/1970, apresentado em 27/11/1970 pelo deputado Santilli Sobrinho (MDB-SP), que pretendia especificar, com mais detalhes, o campo de atuação do economista.
Note-se que, ao sancionar a lei, o presidente Getúlio Vargas havia vetado integralmente a redação dada ao art. 2º., que permitiria outorgar o título de economista a todos aqueles que já estivessem exercendo a profissão, qualquer que fosse a sua formação acadêmica.
“Passa a vigorar com a seguinte redação o art. 2º. da Lei no. 1.411, de 13 de agosto de 1951:
III – lados de peritagem ou relatório de feitos judiciais, quando o valor da causa seja igual ou superior a duzentas vezes o salário-mínimo da região, que envolvam aspectos referentes a:
- cálculo do capital ou patrimônio de pessoas jurídicas e aspectos correlatos de avaliação de ações o quotas de capital, reavaliações, valorizações e depreciações ou amortizações patrimoniais;
- fundo de comércio e resultados societários;
- arbitramento econômico de aluguéis e rendas;
- arbitramento ou fixação de preços de custo e de venda e de tarifas;
- pedidos de concordatas.
- estudo da renda nacional e regional e sua influência no consumo;
- classificação dos consumidores;
- análise do poder de compra;
- localização e otimização das matérias-primas e dos transportes;
- análise da mão-de-obra e do mercado de trabalho, exceto os aspectos ligados à administração do pessoal;
- estudo de mercados setoriais, agrícolas, industriais, comerciais, de transportes e de serviços.
- análise das oportunidades de exportação e das conveniências de importação;
- estudo de mercados regionais ou setoriais internacionais;
- análise da possibilidade de exportar tecnologia e serviços brasileiros;
- câmbio e comércio internacional.
- análise de produtividade, substituição e otimização de fatores e aproveitamento da capacidade ociosa;
- sistemas de trabalho e fixação de padrões de produção;
- estudos de tempos e movimentos, controle do trabalho e da técnica de automatização;
- controle econômico dos estoques, lotes econômicos de compras e de produção, estoques de produção e organização das reposições;
- programação de rede de distribuição e armazenamento de produtos e mercadorias.
- programação de investimentos, de sua rentabilidade e de sua reversão;
- programação de captação de recursos e custos destes;
- organização e controle das vendas a crédito, exceto os aspectos ligados à contabilização;
- análise do mercado de capitais.
- VIII – análise de custos, abrangendo:análise dos custos operacionais e setoriais;
análise do ponto de equilíbrio dos custos;
programação para redução dos custos;
análise das variações de custos e de suas influências internas e externas;
análise da política de fixação de preços e organização de tarifas.
- programação e controle orçamentários, exceto os aspectos ligados à contabilização;
- controle da gestão empresarial, incluindo análises sobre estrutura patrimonial, resultados operacionais, remuneração e participação de capitais próprios e alheios;
- crescimento econômico da empresa e dinâmica da situação financeira;
- análise do comportamento do mercado congênere.
- efeitos sócio-econõmicos resultantes da tributação;
- análise comparativa dos ônus fiscais;
- análise das opções em matéria fiscal.
- análise dos reflexos da conjuntura econômica sobre a empresa;
- apuração e análise dos índices da conjuntura econômica e dos índices de custo de vida;
- estudos para desenvolvimento ou programação econômica nacional, regional ou setorial.”Tal projeto, portanto, ampliava e especificava o campo profissional do economista, que fora fixado no regulamento anexo ao Decreto 31.794/1952, a saber:
“Art. 3º A atividade profissional privativa do economista exercita-se, liberalmente ou não por estudos, pesquisas, análises. relatórios, pareceres, perícias, arbitragens, laudos, esquemas ou certificados sobre os assuntos compreendidos no seu campo profissional, inclusive por meio de planejamento, implantação, orientação, supervisão ou assistência dos trabalhos relativos As atividades econômicas ou financeiras, em empreendimentos públicos privados ou mistos. ou por quaisquer outros meios que objetivem, técnica ou cientificamente, o aumento ou a conservação do rendimento econômico.”
Caso tal PL fosse aprovado, deixariam de existir dúvidas sobre a habilitação legal de o economista proceder a todo tipo de análise econômico-financeira, nos âmbitos pessoal, empresarial, setorial, regional, nacional e internacional.
A valoração de bens imateriais (cotas sociais, fundo de comércio, clientela, processos de produção e comercialização, por exemplo), para fins de valoração para o mercado ou em disputas judiciais – não se falava, ainda, em arbitragem e mediação – do mesmo modo, de forma inquestionável, seria dos economistas, incluída perícia e avaliação de natureza econômico-financeira.
Empresas que quisessem captar recursos no mercado (bolsa de valores) ou administrassem recursos de terceiros (bancos) ou mesmo desejassem financiamento ou benefícios públicos (incentivos fiscais, crédito, etc) deveriam contar com estudo de viabilidade econômico-financeira feita por economista.
Nas empresas, o estudo de produção, custos, preços, mercado e orçamento igualmente teria que contar com a participação destacada de economista.
No âmbito público, além do aspecto orçamentário, contribuiria o economista com a análise da tributação, seus aspectos sociais e econômicos e as alternativas menos custosas e mais eficazes.
E outras áreas, hoje muito importantes, também contariam com o trabalho do economista, como contam, embora ainda haja um debate sobre a habilitação legal, em alguns pontos.
Como ocorrera com o Projeto de Lei 367/1948, também o PL 2.367/1970 sofreu o combate de dois conselhos profissionais, alegando que o que dispunha iria afetar as prerrogativas dos profissionais que a eles eram ligados.
Entretanto, no âmbito da Câmara dos Deputados, a tramitação foi de todo favorável aos anseios dos economistas e das suas entidades representativas. As Comissões de Constituição e Justiça, de Trabalho e Legislação Social e de Economia foram unânimes em aprovar o projeto, sendo que, na última, o relator foi o então deputado Tancredo Neves (MDB-MG), cujo voto foi referendado em 27/06/1974.
Já em 11/10/1974, o então presidente do COFECON, Jamil Zantut, enviou ao presidente da Câmara dos Deputados, deputado Flávio Marcílio (ARENA-CE), o oficio 1.313/74, em que pedia urgência na aprovação do PL 2.367/1970, para que houvesse “melhores condições às atividades dos profissionais da economia que, exercendo papel preponderante nos interesses da coletividade brasileira, pugnam pela continuidade do desenvolvimento do Brasil”.
Apesar de ter passado pelo crivo das três comissões temáticas, a proposta foi rejeitada pelo Plenário e arquivado em 19/03/1975.
E, diga-se, numa época em que economistas de nomeada ocupavam cargo de enorme relevo nos governos federal, estaduais e municipais.
Acreditando ou não em forças ocultas, vale ponderar o dito popular espanhol: “No creo en brujas, mas que las hay, las hay”.
Com certeza, o detalhamento das atividades profissionais do economista, naquela época, teria mudado o enfoque não apenas da categoria, como dos currículos dos cursos de graduação em Ciências Econômicas e, mais importante porque objetivo final, a condução das atividades empresariais e governamentais, em benefício da sociedade brasileira.
Tal não ocorreu e houve algumas tentativas do Sistema COFECON/Corecon de obter o mesmo almejado no PL. 2.367/1970, com as adaptações que o tempo atual exige, a última delas do PLS 0658/2007, que, após 11 anos de tramitação e muitos bloqueios de entidades outras, restou arquivado definitivamente no Senado Federal.
Trata-se de uma contenda que se iniciou há 92 anos, exatamente no dia 30/06/1931, quando publicado o Decreto 20.158, criando o curso superior que concedia ao concluinte o diploma de Bacharel em Ciências Econômicas.
A primeira turma de Bacharéis em Ciências Econômicas em solo bandeirante, formada pela Faculdade de Ciências Econômicas de São Paulo (hoje FECAP) em 1934, criou o Sindicato dos Economistas no Estado de São Paulo, em 11/01/1935, ainda com o nome de Ordem dos Economistas de São Paulo, alterado quatro meses após.
Já pelo Decreto-Lei 7.988, de 22/09/1945, com a criação do grau de Bacharel em Ciências Contábeis e Atuarias, a profissão de Contador passou a ser de nível superior, como já o era a do Economista.
As lições do passado servem para o presente e o futuro da profissão.
E aqueles que dependem ou dependerão da regulamentação profissional devem colocar-se a postos, como se fez, segundo o relato do deputado Fernando Ferrari, após arquivamento de um anteprojeto, em 1945, nos escaninhos dos ministérios do Trabalho:
“Face o silêncio do Poder Público, os estudantes de Economia e Finanças, em todas as escolas superiores do país, e os bacharéis, reiniciaram a campanha com redobrado ardor. Todas as tribunas universitárias da Pátria repetiram o brado de luta. Era inconcebível que se pudesse mandar para as faculdades centenas e centenas de acadêmicos sem que estes soubessem, pelo menos, o que fariam depois de formados”
Se o Economista deixa-se acomodar com o que tem, em termos de mercado de trabalho, e não percebe o quanto poderia, com sua competência, contribuir para a vida econômica – em especial no que se refere à atividade produtiva que leva ao desenvolvimento – não serão outros que pedirão em seu favor.
À guisa de conclusão, embora sempre estejamos em caminho, trecho do discurso de Ubirajara Dib Zogaib, em sua posse como presidente do Corecon-SP, em 16/11/1953:
“De agora em diante, ninguém poderá intitular-se economista sem que esteja devidamente registrado e, portanto, sujeito às penalidades previstas na lei, por dolo, má fé, fraude ou incompetência profissional. De agora em diante, estará a classe preparada para a sua grande missão, humana e generosa, de lutar com afinco e com eficiência pela elevação do padrão de vida dos brasileiros. Estarão unidos os economistas numa luta nova, de libertação do povo da miséria, caminhando da atual predominante economia de escassez para uma aspirada e possível economia de abundância, em que os homens, despreocupados das necessidades materiais, poderão alçar-se às elevadas cogitações espirituais.”