Esta discussão é histórica. Thomas Hobbes, no Leviatã, assumiu que os seres humanos, em seu estado natural, são egoístas e, portanto, o conflito é uma tendência. Para ele, o Estado tem como missão: manter a ordem e evitar o caos. De outro lado, Jean-Jacques Rousseau, no Contrato Social, a partir de uma visão mais otimista, defendeu que o Estado deve ser uma expressão do interesse coletivo, ao passo que é um meio para alcançar a igualdade e a liberdade.
Governos conservadores ou progressistas usam os instrumentos estatais permanentemente para atingir os seus objetivos. É necessário aqui destacar que esse papel foi, e continua sendo, fundamental para o desenvolvimento social e econômico em nosso país e no mundo. No Brasil, sabemos de sua importância na industrialização e no desenvolvimento nacional. O pragmatismo precisa ser levado em conta, para além das narrativas.
Na década de 1940, o governo Getúlio Vargas convidou o setor privado para criar a Companhia Siderúrgica Nacional – CSN. Com a negativa desse setor, o Estado brasileiro, por meio de financiamentos, investiu na criação dessa empresa que foi fundamental para a industrialização. Na década de 1950, houve a criação da Petrobrás, do BNDE, de infraestrutura de estradas e hidroelétricas culminando com o Plano de Metas do período JK – 1956/1960 que elevou de patamar o desenvolvimento nacional. Na década de 1970 foi gerado o II PND, que avançou na implantação da indústria petroquímica e, em outros ramos industriais, como na exploração do petróleo e nas energias alternativas visando a complementação da matriz industrial.
O agronegócio teve, e continua tendo, o apoio decisivo do Estado, como foi com a criação da Embrapa e os bilhões de reais de seu orçamento investidos em pesquisas para esse setor. O Banco do Brasil, por meio do Plano Safra, disponibilizará R$ 400 bilhões, em 2024/2025, grande parcela com juros subsidiados.
A Embraer, hoje a terceira indústria de aviação do planeta, foi criada pelo Estado brasileiro e o BNDES, um dos maiores bancos de fomento do mundo, tem um papel fundamental no financiamento das exportações de seus aviões. E mais, centenas de bilhões de reais do orçamento público são direcionados como subsídios para os mais diversos setores industriais e de serviços.
É necessário destacar que 160 milhões de brasileiros não têm plano de saúde, dependendo do SUS. Isto é, recorrem ao Estado para tratar de sua saúde, conforme o contrato social definido em nossa Constituição no Art. 196. Mais de 80% de quem estuda no Brasil antes de alcançar a universidade frequentou escolas públicas e 95% das pesquisas são feitas em universidades e instituições públicas e os programas de transferência de renda são decisivos para melhorar a difícil qualidade de vida de dezenas de milhões de brasileiros.
Esse papel do Estado também é exercido nos mais diversos estados capitalistas. Um dos exemplos mais emblemáticos do Estado como catalizador de inovações radicais, com todas as externalidades positivas atreladas, talvez seja o programa espacial da NASA que levou o homem à Lua, trazendo-o de volta à Terra “em segurança”. A missão Apollo foi resultado do esforço estatal, no qual o governo dos EUA tomou para si os riscos que o setor privado não estava disposto a assumir, devido às incertezas envolvidas. O Pentágono, DARPA, o Departamento de Energia, os Institutos Nacionais de Saúde promovem e desenvolvem pesquisa científica e tecnológica nas fases mais arriscadas do P&D, que depois são utilizadas pelo setor privado. A internet, o GPS, os smart phones são alguns exemplos desta abordagem pragmática.
Ainda sobre o papel estratégico de estímulo ao desenvolvimento e estabilização em momentos de turbulência, mais recentemente, pode-se citar os dados da Agence Française de Developmenmt de 2018 que apontam a existência de cerca de 450 bancos públicos no mundo com capitais de US$ 11,2 trilhões com investimentos nas mais variadas áreas da economia. Na crise de 2008, o Estado americano investiu trilhões de dólares para salvar o sistema financeiro, o mesmo aconteceu na Europa. No Brasil, estima-se em R$ 350 bilhões, os aportes para essa finalidade.
O governo Biden lançou várias iniciativas para uma política industrial e de ciência e tecnologia (Infrastructure Investment and Jobs Ac- IIJA; Creating helpful incentives to produce semiconductors and Science Act-CHIPS; Inflation Reduction Act-IRA) mobilizando US$2 trilhões em 10 anos. Além disso, investiu mais US$ 6 bilhões na área de semicondutores. Elon Musk recebeu bilhões de dólares do governo da Califórnia para desenvolver suas indústrias e o Estado americano acabou de exigir que a chinesa Byte Dance, dona da Tik Tok, venda-a para empresas americanas.
Já no final de seu mandato, depois de ouvir um comitê de especialistas em segurança nacional e comércio, Biden acabou por impedir a aquisição da US Steel pela japonesa Nippon Steel, pois, mesmo sendo um negócio privado, entende que a indústria siderúrgica é estratégica para a economia e a soberania dos EUA.
Na União Europeia e no Japão as ações do Estado não são diferentes. Na Europa um consórcio de países está investindo cerca de € 6 bilhões na criação de indústria estatal de semicondutores para diminuir a dependência da China. O governo japonês, por sua vez, aprovou no dia 22 de novembro passado um pacote de estímulo de US$ 140 bilhões para reforçar o poder de compra e impulsionar o crescimento econômico daquele país.
Poderíamos continuar citando centenas de exemplos no Brasil e no mundo sobre a ação do Estado. Diante desses fatos incontestáveis, o CORECON/SP acentua que é necessário adotar uma abordagem pragmática sobre o papel do Estado. Um exemplo claro neste sentido é a relevância da regulação e das políticas públicas no combate à mudança climática, sobretudo por conta do papel que o país exercerá ao sediar a COP-30, na Amazônia, neste ano. Isso não significa deixar apontar os erros de sua ação e os caminhos para superá-los.
É necessário debater também a total transparência do orçamento público, que é o coração do Estado, desde sua elaboração e sua execução. Devemos defender um Estado que não seja mínimo nem máximo, mas adequado para desenvolver suas funções, controlado pela sociedade e que contribua, por meio das políticas públicas e dos investimentos necessários e suficientes, “para materializar o Art.3º da Constituição Federal, em seu item III, onde está definido: “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais.”
Conselho Regional de Economia CORECON/SP fevereiro de 2025
Meus Caros,
Claramente o documento do CORECON-SP é uma peça excelente e bem fundamentada na defesa de um Estado pragmático, que atue estrategicamente na economia. Porém, quero argumentar que a argumentação poderia ser enriquecida com uma análise mais equilibrada pontuando vantagens e desafios da atuação estatal, incluindo a importância do setor privado no contexto nacional, os riscos e consequências do excesso de intervenção estatal e dados concretos para embasar as afirmações. Uma visão mais crítica e técnica ajudaria a tornar o debate mais completo e útil para a formulação de políticas públicas eficazes.
Considerações Finais:
– O Estado deve atuar como regulador, não como protagonista.
– O Estado deve ser pragmático, atuando apenas onde o setor privado não consegue suprir as necessidades básicas (infraestrutura, defesa, pesquisa fundamental).
– A presença estatal excessiva gera ineficiência, tributos altos e inibe inovação.
– O setor privado é essencial para dinamizar a economia, promover inovação e gerar empregos.
– Estados mais eficientes equilibram regulação estatal com liberdade de mercado.
– O modelo ideal é aquele em que o Estado facilita o desenvolvimento e não compete com o setor privado.
Grato.
José Aluísio Vieira
Essa Nota possui um claro viés ideológico “desenvolvimentista”. Os autores do texto defendem um Estado ativo e indutor do desenvolvimento, porém ignora que, na maioria dos casos, a intervenção estatal resulta em ineficiência na alocação de recursos. Por operar sob forte influência dos interesses político-partidários e pessoais dos governantes sem incentivo à eficiência e sem a disciplina do lucro, frequentemente direciona recursos para projetos pouco produtivos, prejudicando a economia como um todo.
Subsídios seletivos criam distorções de mercado, favorecendo grupos apadrinhados e impedindo a inovação e a competitividade. Uma economia de mercado saudável se baseia no princípio de que empresas devem sobreviver pela qualidade de seus produtos e eficiência, e não por paternalismo estatal.
A Nota deveria considerar os graves problemas dos altos impostos, burocracia excessiva e Interferência política na economia.