O Congresso Brasileiro de Economia ocorreu de 06 a 10 de outubro no Plaza São Rafael Hotel, em Porto Alegre, com o tema “Desenvolvimento Sustentável: Reconstrução, Desafios e Oportunidades”. O evento reuniu cerca de 50 especialistas e 500 participantes (online e presencial) em torno de grandes temas que impactam o futuro do país, como reforma tributária, mudanças climáticas, comércio internacional, agronegócio, desigualdades regionais, inovação, economia comportamental, educação financeira e o papel do Estado na neoindustrialização. A promoção foi do Cofecon, em parceria com o Corecon/RS.
Confira como foram as discussões e os painéis do evento:
UFRGS é homenageada pelos 80 anos do curso de Ciências Econômicas
Reconhecimento ocorreu durante a abertura do XXVI Congresso Brasileiro de Economia, em Porto Alegre, celebrando a contribuição histórica da universidade à formação de economistas no país.
A noite de abertura do XXVI Congresso Brasileiro de Economia teve um momento de homenagem aos 80 anos do curso de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. A professora Maria de Lourdes Furno da Silva, diretora da Faculdade de Ciências Econômicas, foi chamada para representar a instituição no momento.
“A faculdade faz parte da história da minha vida e da vida de muitos colegas que estão aqui”, expressou a vice-presidente do Conselho Regional de Economia do Rio Grande do Sul, Angélica Massuquetti. “Eu me formei ali há 35 anos e tenho quase 30 como professora. Muitos dos meus colegas de graduação fizeram mestrado e doutorado e têm a Universidade Federal do Rio Grande do Sul como segunda mãe”.
Maria de Lourdes, por sua vez, contou que o curso de Ciências Econômicas está completando 80 anos, mas a Faculdade de Ciências Econômicas tem 115 anos. “Somos convidados para receber esta homenagem que nos gratifica muito. A UFRGS tem 29 unidades, a Faculdade de Ciências Econômicas é uma delas. Temos cinco programas de pós-graduação e, entre nossos egressos, estão a ex-presidente Dilma Rousseff e a ex-governadora Yeda Crusius, que foi docente na nossa instituição. Temos também o presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Marcio Pochmann, que está aqui no Congresso”.
XXVI CBE: Economistas defendem papel do Estado
Denise Gentil e Antonio Corrêa de Lacerda discutiram os limites impostos pela financeirização e pela austeridade fiscal ao crescimento brasileiro, destacando a urgência de uma estratégia nacional diante das transformações globais
A conjuntura internacional e seus impactos sobre as possibilidades de desenvolvimento nacional foram o centro das reflexões de Denise Gentil e Antonio Corrêa de Lacerda no XXVI Congresso Brasileiro de Economia, no painel sobre desenvolvimento nacional. Os economistas analisaram o esgotamento da globalização financeira, o retorno de políticas industriais e o desafio de reconstruir um projeto de Estado capaz de promover crescimento sustentável e reduzir desigualdades.
Denise Gentil iniciou sua fala com uma palavra sobre a guerra em Gaza, afirmando que ela “é resultado de uma deterioração da ordem internacional comandada pelo ocidente. Quando uma hegemonia entra em crise, ela costuma massacrar a periferia”. Na sequência, questionou: “Como ficam as nossas possibilidades de desenvolvimento nacional neste quadro? O mundo está explodindo de transformações: a pandemia, as crises de desigualdade, a volta do fascismo. Não há espaço para o desenvolvimento. Temos que construir uma estratégia com muita firmeza e liderança política”.
Ela citou a trajetória de crescimento brasileiro, com uma média de 7,5% ao ano entre 1947 e 1980 e 2,2% entre 1981 e 2022. “Existe uma disputa por hegemonia que impõe que nós nos consolidemos dando retorno aos ativos financeiros que chegam ao Brasil, compensando a perda da taxa de lucro dos países centrais”, argumentou Gentil. “Essa disputa se consolida entre uma elite altamente financeirizada e uma classe trabalhadora, com uma taxa de juros injustificável. A austeridade fiscal prende as pernas da nossa economia e é impossível fazer qualquer política de desenvolvimento com juros de 15% e este arcabouço fiscal que temos”.
A economista também apontou para um quadro de achatamento dos salários num país comandado pela dívida pública. “Ao manter os salários deprimidos, a economia em crescimento é terrível para o Banco Central, que é a majestade deste país. Esta situação impede uma luta de classes que seja digna para a classe trabalhadora”, afirmou. “Tenho uma indignação profunda em ver nosso estado diante de um país gigante, com recursos naturais, terras raras, e ficamos brincando de fazer ajuste fiscal. Enquanto isso a despesa com juros está liberada, sem teto, sem limites. Se não soltarmos as amarras, a fotografia de longo prazo jamais vai mudar”.
O conselho federal Antonio Corrêa de Lacerda iniciou sua fala com o cenário internacional. “A visão dominante pós anos 1990 era de globalização. A localização industrial partia do pressuposto de que era possível diminuir o custo aumentando a margem dos produtos e que seria possível terceirizar a produção suja, passando para a periferia do capitalismo as atividades mais poluentes”, comentou. “Depois várias crises trouxeram questionamentos sobre a globalização financeira, mas ela resistiu”.
“A pandemia de Covid-19 vulnerabilizou as cadeias internacionais. Várias delas se mostraram insuficientes para prover as nações com recursos necessários ao enfrentamento. Mesmo o Brasil, que caiu na lógica da liberalização, de que seria possível se abastecer, viu que não seria possível obter produtos e equipamentos de proteção individual”, criticou o economista. “Mais recentemente temos uma reversão histórica do conceito de liberalização, com o objetivo de recolocação da produção”.
Ao citar o quadro brasileiro, o economista mencionou um período (2003-2014) em que houve um crescimento na atividade econômica, com uma menor participação do Estado entre 2016-2022 e uma retomada de um projeto nacional no governo Lula 3. “Mas temos algumas restrições, como o conceito de que o Estado não pode gastar, além de uma meta de inflação irrealista e restrições fiscais”, observou. “Temos novos programas estruturantes e uma política industrial, que é algo que ainda sofre muito preconceito no Brasil. Não se desfaz em três anos uma destruição de décadas, mas há mudanças estruturais em curso, primeiro na tributação indireta. Além disso, temos a matriz energética mais limpa do mundo, com 50% de energias renováveis”.
XXVI CBE: Entre as contradições estruturais e a qualidade do gasto público
Na mesa sobre crescimento econômico, os economistas Luiz Eduardo de Souza e Erick Figueiredo analisaram diferentes dimensões do desenvolvimento brasileiro
O crescimento econômico brasileiro foi tema de uma mesa de debates realizada durante o XXVI Congresso Brasileiro de Economia. O professor Luiz Eduardo de Souza, da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), e o economista Erick Figueiredo, diretor-executivo do Instituto Mauro Borges, apresentaram perspectivas complementares: enquanto Souza abordou o papel da Constituição de 1988 e as contradições estruturais da economia nacional desde a redemocratização, Figueiredo destacou a importância de repensar o gasto público e a gestão da dívida para garantir um desenvolvimento sustentável e eficiente.
“O historiador econômico é um otimista no longo prazo”, afirmou Luiz Eduardo de Souza ao iniciar sua fala. O professor situou a análise a partir da Constituição de 1988, que, segundo ele, inaugura a chamada sexta república brasileira. O artigo 170 da Carta, na visão do professor, foi uma tentativa de conciliar capital e trabalho ao fundar a ordem econômica firmada na valorização do trabalho e na livre iniciativa. “Nessa tentativa de conciliação existem contradições que permanecem e nos ajudam a compreender as tensões atuais entre crescimento, estabilidade e inclusão”, explicou.
Souza ainda divide a chamada sexta república em fases: as décadas perdidas de 1980 e 1990, marcadas pela busca da estabilização monetária; o início do século XXI, com o avanço do neodesenvolvimentismo; e o período de crise entre 2014 e 2022. “Nosso PIB começa a se estabilizar novamente entre 2% e 4% ao ano a partir de 2022”, observou. “Se olharmos para a média histórica, desde 1822 o crescimento brasileiro é de 1,5% ao ano — um padrão que reflete tanto nossas limitações estruturais quanto nossa resiliência”, argumentou. Ele também mostrou um gráfico comparando o desempenho econômico do Brasil com outros países emergentes. “Não chegamos tão alto nos picos, nem tão baixo nos vales”, observou.
Já o economista Erick Figueiredo apresentou uma leitura crítica da trajetória fiscal do país. “Comparar a relação dívida/PIB entre países é inadequado”, afirmou, lembrando o exemplo dos Estados Unidos e do Japão, que têm dívidas proporcionalmente maiores, mas custos de serviço muito menores. “No Brasil, gastamos cerca de 8% do PIB apenas com o serviço da dívida, o que mostra que o problema não é o tamanho da dívida, mas o custo de carregá-la.” Figueiredo provocou o público com uma análise direta: “Em 2023 e 2024, nossa dívida cresceu 1,6 bilhão de reais por dia, enquanto o PIB cresceu 1,1 bilhão. Se o gasto público é para impulsionar o PIB, está faltando alguma coisa”.
Ele também comentou que o Brasil tem um estoque pequeno de infraestrutura (cerca de 30% do PIB) na comparação com outros países – a China, por exemplo, tem 86%. “Não basta investir para crescer, é preciso ver a qualidade do gasto. Nosso custo-Brasil não é apenas o imposto, é o custo burocrático, é pagar por ineficiência”, observou. Para ele, um novo ciclo de crescimento depende de maior transparência fiscal e de uma gestão pública mais racional. “O brasileiro precisa entender o gasto público — e isso começa com um gasto de melhor qualidade”.
XXVI CBE: O futuro do trabalho e a disputa de futuro
Na mesa de debates sobre trabalho, Marcio Pochmann e Marcelo Manzano refletiram sobre as transformações estruturais do emprego, os desafios da era digital e o papel do Estado na promoção de trabalho decente e inclusão produtiva
As transformações do mundo do trabalho e os desafios para garantir emprego e renda em um cenário de mudanças profundas foram tema de uma mesa de debates durante o XXVI Congresso Brasileiro de Economia. Marcio Pochmann, presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e Marcelo Manzano, professor da Universidade Estadual de Campinas, discutiram as novas formas de trabalho, a crescente financeirização da economia e a necessidade de políticas públicas que defendam a vida, a dignidade e a saúde mental dos trabalhadores em meio à busca por produtividade e lucro.
“Vivemos uma mudança de época que redefine completamente o sentido do trabalho”, afirmou o presidente do IBGE. O economista destacou que a sociedade brasileira enfrenta o desafio de compreender as novas formas de ocupação em um contexto dominado pela tecnologia e pela individualização. “Há uma ênfase muito grande na individualização dos problemas e uma identidade que se conforma a partir de critérios muito diferentes do que se pensava no passado. Estamos prisioneiros do presente e, com isso, cancelando o futuro”, observou. Ele lembrou que a classe trabalhadora que formará o Brasil de 2050 “já nasceu” — e que sete em cada dez dessas crianças vieram de famílias miseráveis. “Como enfrentar a questão racial e a desigualdade estrutural num país que não está pensando o futuro?”, questionou.
Pochmann também comparou o momento atual a outros períodos de virada histórica, como a abolição da escravidão e a Revolução de 1930. “A cada mudança de época, há uma disputa sobre o futuro. Hoje, o que está em jogo é como lidar com o avanço tecnológico, com o trabalho morto das máquinas e o trabalho não pago que realizamos diariamente”, analisou. O economista defendeu que o país retome o debate sobre uma “CLT da era digital”, capaz de proteger os trabalhadores das plataformas e novas formas de ocupação. “Há milhões de brasileiros gerando renda nas redes sociais, fora das estatísticas formais. Precisamos repensar o conceito de trabalho e quem se apropria do valor produzido na economia digital”, concluiu.
Já o economista Marcelo Manzano estruturou sua análise a partir das diferentes dimensões em que o trabalho e o emprego ocorrem no Brasil. “Temos quatro grandes segmentos: o núcleo tipicamente capitalista, a administração pública, os arranjos econômicos de subsistência e as ocupações sociais”, explicou. O primeiro, segundo ele, historicamente liderou o crescimento capitalista e abrigou os empregos de melhor qualidade, mas hoje está cada vez menos industrial e mais dominado pelas finanças e plataformas digitais. “A baixa capacidade de geração de postos de trabalho e o descompasso com as demandas da transição ecológica revelam os limites desse modelo”, afirmou.
Manzano destacou que o avanço das plataformas digitais vem subordinando até mesmo atividades de subsistência, como pequenos negócios familiares e serviços domésticos, às lógicas de acumulação do capital financeiro. “O Airbnb é um exemplo de como o capital financeiro acumulando valor a partir do patrimônio dos outros, algo que não era alcançável pelo capital até a digitalização”, exemplificou. O economista apontou que, diante do encolhimento das oportunidades no setor privado e das restrições fiscais que travam o setor público, é nas ocupações sociais — como cultura, preservação ambiental, cuidados, esporte e lazer — que reside um potencial de expansão do trabalho decente. “Essas atividades produzem bem-estar, pertencimento e bens públicos. O Estado poderia liderar uma política de emprego inclusiva, abrindo vagas, por exemplo, para pessoas com deficiência e outros grupos com dificuldade de inserção no mercado de trabalho”, propôs.
XXVI CBE: Mesa discute tributação da renda e riqueza no Brasil
Debatedores discutiram justiça fiscal, competitividade econômica e financiamento do Estado brasileiro em um painel que reuniu visões do setor público e privado
Um dos temas mais importantes da agenda econômica brasileira é a tributação da renda e da riqueza, suas implicações para o crescimento, a justiça fiscal e o financiamento das políticas públicas. O XXVI Congresso Brasileiro de Economia contou com um painel específico para este debate, reunindo o advogado tributarista Santiago Nascimento, o deputado federal Luiz Carlos Hauly, o pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) Sergio Gobetti e o conselheiro federal do Cofecon Paulo Dantas da Costa.
Defesa da reforma tributária
Um dos principais formuladores da reforma tributária aprovada no Congresso, o ex-deputado Luiz Carlos Hauly defendeu o novo sistema baseado no imposto sobre valor agregado e reforçou a necessidade de simplificação. Segundo ele, “o sistema atual é um Frankenstein tributário que alimenta a guerra fiscal, a sonegação e o contencioso.” Hauly destacou que 75% da carga tributária brasileira incide sobre bens e serviços, o que, na sua avaliação, é injusto: “A tributação sobre renda e patrimônio é baixíssima no Brasil. Na OCDE, é 40%. Aqui, apenas 25%”. Ele também rebateu a ideia de que municípios são financeiramente inviáveis: “O que é inviável são estados e União que vivem do dinheiro dos municípios”.
Hauly defendeu a cobrança automática do imposto no ato do pagamento como forma de combater evasão e inadimplência. “Quando você passar o cartão, o imposto já será retido. Isso elimina crédito fictício e sonegação,” afirmou. Ele avaliou que a reforma é “suprapartidária, benigna e um ganha-ganha para o país”, porque, segundo ele, “derruba privilégios de quem vive de sonegação, guerra fiscal e contencioso tributário.” Hauly ainda afirmou que “a carga efetiva para o consumidor deve cair até 40%” com a simplificação do sistema.
O pesquisador Sérgio Gobetti destacou as distorções do Imposto de Renda no Brasil e defendeu que a segunda fase da reforma tributária deve focar na equidade. “Estamos há 20 anos sem reformas estruturais na renda. Enquanto isso, a concentração de riqueza aumentou e a legislação tributária passou a proteger rendas do capital.” O palestrante também lembrou que 24 dos 38 países da OCDE ampliaram a tributação sobre dividendos. “Grécia, México e Colômbia isentavam dividendos e voltaram atrás. O Brasil ficou para trás”.
Segundo Gobetti, “o Brasil tributa pouco a renda e muito o consumo, ao contrário do que fazem países desenvolvidos.” Ele também destacou as isenções que beneficiam os mais ricos: “Só em rendimentos financeiros isentos foram R$ 114 bilhões, quase 40% disso indo para o 0,1% mais rico.” Ao defender revisão dos regimes especiais e redução de brechas legais, o economista afirmou que “não se deve confundir porte da empresa com capacidade contributiva dos sócios.” Para ele, “o imposto mínimo global é apenas um paliativo — precisamos de uma reforma ampla para corrigir desigualdades.”
Tributação internacional
O conselheiro federal Paulo Dantas da Costa trouxe a debate uma proposta de tributação internacional como instrumento de desenvolvimento econômico e social. Ele citou a proposta da Taxa Tobin, sugerida pelo prêmio Nobel James Tobin, que previa tributar transações financeiras internacionais. “Hoje circulam no sistema financeiro global seis trilhões de dólares por dia – algo correspondente a três PIBs do Brasil”, comentou. “Uma alíquota de 0,1% significa uma base de cálculo fantástica para esta espécie de CPMF”
Dantas argumentou que instrumentos tributários globais poderiam financiar os objetivos da Agenda 2030 da ONU, sobretudo combate à pobreza e à fome. “A tributação pode ser uma ferramenta de cooperação internacional e justiça social. Precisamos pensar a partir de uma nova governança global”, afirmou. Ele concluiu ressaltando o papel do Estado e da tributação em sociedades democráticas: “É ilusório achar que é possível financiar bem-estar social sem uma base de arrecadação sólida e justa”.
Especialista questiona tributação da renda e da riqueza
Santiago Nascimento avaliou criticamente as propostas de tributação da renda e da riqueza em discussão no país. Segundo ele, a mudança “não é suficiente para alcançar justiça tributária” e a adoção de faixas de isenção com valores fixos “não corrige desigualdades.” Para Nascimento, o ideal seria adotar um critério baseado em múltiplos de salário mínimo (e sugeriu, como exemplo, três salários mínimos como algo que ajustaria melhor a tributação à realidade socioeconômica brasileira). Ele também mencionou que o governo tem tomado muitas medidas anti-elisivas. “O empresário vai utilizar todos os meios possíveis para reduzir sua taxa tributária e o governo federal vem fazendo esforços por todos os meios para diminuir esse quadro”.
Nascimento criticou a orientação do governo ao priorizar a tributação sobre patrimônio e herança. “O Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCMD) é um imposto estadual, mas a União está intervindo para elevar a tributação sem que os estados tenham pedido. É uma pauta contra a riqueza,” afirmou. Ele também apontou que o risco pode ser a fuga de capitais: “Na Europa, países que tentaram imposto sobre grandes fortunas viram investidores transferirem seu patrimônio para paraísos fiscais. Agora tentam reverter a distorção que criaram”. Segundo o tributarista, a carga sobre empresas no nosso país já é elevada. “Na França, a carga sobre as empresas mais os dividendos é de 34%. No Brasil, só a carga sobre empresas já é 32%”.
XXVI CBE: “O problema do mundo hoje não é econômico, é de organização política e social”, afirma Dowbor
Economista participou de painel de debates sobre cidades e desenvolvimento econômico
O economista Ladislau Dowbor, professor da PUC-SP, realizou uma análise dos desafios contemporâneos do desenvolvimento, destacando que vivemos uma contradição histórica: nunca houve tanta capacidade produtiva e tecnológica no mundo, mas a desigualdade social segue crescendo. Segundo ele, a concentração de riqueza e o domínio do sistema financeiro sobre a economia real representam os principais entraves à redução da pobreza e à promoção do bem-estar social.
Ao tratar das transformações aceleradas pela tecnologia, Dowbor afirmou que estamos numa mudança de era, não apenas de modelo produtivo. “A moeda mudou, o dinheiro se tornou imaterial e circula na velocidade da luz. O mundo está conectado e a base da economia hoje são sistemas de informação e conhecimento, não mais as máquinas”, disse, lembrando que a mudança em curso é considerada por cientistas “dez vezes maior que a Revolução Industrial”. Para ilustrar a diferença entre economia material e imaterial, Dowbor comparou: “Se alguém compra um relógio, outra pessoa fica sem relógio. Mas se compra uma ideia, duas pessoas ficam com a ideia. O conhecimento se multiplica com o uso, e isso muda tudo”.
Para o economista, a desigualdade deixou de ser um problema técnico e tornou-se uma escolha política. Ele lembrou que a concentração de renda atingiu níveis insustentáveis: “O 1% mais rico do planeta tem patrimônio de 213 trilhões de dólares, enquanto a metade mais pobre tem 5 trilhões. Um imposto de apenas 2,5% sobre esse 1% seria suficiente para dobrar a renda dos mais pobres.” Para ele, a solução passa por redistribuição de renda e fortalecimento da demanda: “Se colocar dinheiro na base da sociedade, gera produção, emprego e consumo. O Brasil está com 71% da capacidade industrial parada porque não tem para quem vender.”
Dowbor criticou o atual modelo financeiro e defendeu um novo paradigma econômico. “Hoje a exploração não é mais pelo salário baixo, porque para explorar via salário é preciso gerar emprego. Agora a extração de riqueza acontece pelo sistema financeiro, pelos juros abusivos. Só no Brasil, entre 7% e 10% do PIB é esterilizado pela Selic”, afirmou. Segundo ele, países como a China têm sucesso porque entenderam que desenvolvimento exige inclusão: “Eles inverteram a lógica neoliberal. Não esperaram o bolo crescer para distribuir, começaram distribuindo para crescer”. E concluiu com um chamado à reflexão: “Precisamos resgatar a função social da economia. É hora de pensar o que parece inatingível e mudar a visão sistêmica. A economia deve servir à sociedade, e não o contrário.”
XXVI CBE: Financiamento, inovação e desenvolvimento da economia criativa
Especialistas discutem financiamento, inovação e oportunidades para o crescimento do setor no Brasil
A economia criativa é um setor que vem ganhando relevância como vetor de desenvolvimento econômico e social, gerando emprego, renda e novas formas de produção baseadas em conhecimento e talento. No entanto, os desafios ainda são expressivos, especialmente no que diz respeito ao financiamento, à formação de ecossistemas de inovação e à transformação criativa em valor econômico. O XXVI Congresso Brasileiro de Economia teve um painel de debates sobre o tema, com participação dos economistas Leandro Antonio de Lemos, Luiz Alberto Machado e Abdon Barreto.
Lemos, que atua na área de desintermediação financeira no Brasil, abordou a questão do financiamento. “No setor de turismo temos quase 8% do PIB brasileiro. O setor de economia criativa, que envolve linhas de moda, design, gastronomia, games, economia digital, entre outras áreas, já gera em torno de 2%. Esportes, um setor extremamente amador, já gera em torno de 1% do PIB. O grande desafio é fazer estes ecossistemas atuarem de forma estratégica. Como financiar essas atividades, que muitas vezes não são protagonistas dos modelos de desenvolvimento e das políticas públicas?”, questionou. “Já vi R$ 100 milhões de dólares aprovados para 17 municípios e nenhum real ser utilizado porque faltou dentro dos municípios o conhecimento regulatório e capacidade de captação. O grande desafio não é dinheiro. É saber operar e estruturar projetos com inteligência financeira.”
“Estamos vivendo uma revolução financeira com a digitalização e a tokenização de ativos. Já estruturamos fundos internacionais com custo financeiro entre 1,5% e 4,5% ao ano, sem passar necessariamente por bancos. Hoje, qualquer projeto público, privado ou de terceiro setor pode se financiar de forma direta. Mas falta preparo: os economistas e advogados das prefeituras não sabem sequer formular perguntas sobre o marco regulatório dos fundos”, comentou. “De uma forma geral, estamos num momento em que é permitido que cada um de nós criar nossa moeda. As pessoas não entendem por que o bitcoin se valoriza mais que o dólar. Um criptoativo tem mais credibilidade que a moeda, tem várias camadas de segurança dentro da blockchain”.
Luiz Alberto Machado abordou a área da criatividade e, antes de explicar o que ela é, tratou de contextualizar o que ela não é. “A criatividade não é um dom reservado a poucos iluminados. Todos nascem criativos — o que acontece é que crescemos com bloqueios culturais que vão podando essa capacidade. Pais, professores, patrões, preguiça, perfeccionismo e preconceitos moldam nossa forma de perceber o mundo e limitam nosso potencial criativo”, comentou. Criatividade não é magia, nem loucura, nem inspiração mística. É uma função inventiva da imaginação que pode ser desenvolvida com método e disciplina.”
“Quando falamos de economia criativa, falamos de transformar talento em valor econômico”, afirmou o economista. Ele contextualizou cinco gerações de estudos sobre criatividade, começando com o desenvolvimento de habilidades na década de 1950 e evoluindo até chegar à economia criativa. Por fim, falou sobre cidades criativas: “Para que uma cidade seja criativa, precisa reunir os três Ts: Talento, Tecnologia e Tolerância. A UNESCO já reconhece mais de 350 cidades criativas no mundo, 14 delas no Brasil. Qualquer território pode se tornar criativo se for capaz de gerar oportunidades e atrair talentos”.
Na sequência, o economista Abdon Barreto falou sobre alguns casos práticos. “A economia criativa só faz sentido quando gera impacto real — e isso acontece quando criatividade encontra inovação. Todo mundo é criativo, mas nem todo mundo é inovador. Inovar exige testar, provar usabilidade, gerar resultados”, comentou. “Quando criei o primeiro sistema eletrônico de reservas de hotel do Brasil, ainda na era do telex, ninguém acreditava. Construímos uma ponte entre dois computadores e, anos depois, nos tornamos o primeiro hotel do país com reserva on-line. Criatividade sem aplicação é apenas ideia; inovação é execução”.
“Os setores criativos representam uma das maiores fronteiras de desenvolvimento do Brasil. Já são 4 milhões de trabalhadores criativos e a projeção é de mais 1 milhão de empregos até 2030. E com boa remuneração: o salário médio da economia criativa é de R$ 4.018, bem acima da média nacional. Isso envolve cultura, design, turismo, games, marketing, audiovisual, patrimônio, entretenimento e tecnologia. Com estratégia e visão, a criatividade pode transformar territórios”, mencionou Barreto. Ele também falou sobre um trabalho que realizou: a criação do mascote Dinotchê para incentivar o turismo paleontológico (o Rio Grande do Sul é reconhecido como a terra dos dinossauros mais antigos do mundo), que virou referência e conquistou reconhecimento internacional.
XXVI CBE: Cenário econômico e geopolítico mundial
Painel debate desglobalização, tarifaço de Trump e novos arranjos de poder internacional
O painel Relações Econômicas Internacionais – Cenário Econômico e Geopolítico Mundial com o Tarifaço promovido por Trump analisou tendências recentes da economia global e seus impactos nas relações internacionais. Com abordagens complementares, os economistas André Azevedo e Mauro Salvo trouxeram perspectivas críticas sobre a dinâmica do comércio internacional, o retorno do protecionismo, o papel dos EUA e a disputa de hegemonia no mundo multipolar.
Azevedo destacou que as transformações estruturais da economia mundial que resultaram na globalização remontam às décadas de 1970 e 1980, com o avanço da automação e das cadeias globais de valor. “A automação levou à substituição de trabalhadores menos qualificados por capital e abriu espaço para um modelo produtivo globalizado, no qual empresas passaram a deslocar etapas produtivas para países com baixos custos e crescente capacidade tecnológica”, afirmou. Segundo ele, esse processo foi viabilizado pela revolução das tecnologias da informação, que impulsionou a globalização produtiva e o comércio interindustrial entre Norte e Sul.
Azevedo também analisou o movimento de reversão da globalização observado desde eventos como a crise de 2008, o Brexit e a eleição de Donald Trump em 2016. “Estamos vivendo o fim do período conhecido como hiperglobalização. Desde 2020 o comércio mundial não cresce mais do que o PIB global, algo inédito desde a Segunda Guerra Mundial”, destacou. Ao comentar as tarifas comerciais implementadas pelo ex-presidente Donald Trump, foi enfático: “O tarifaço não tem suporte técnico. Nenhum argumento protecionista justifica uma proteção tão ampla e irrestrita como a proposta pelos EUA. Trata-se de uma resposta equivocada para um problema real”, concluiu. Ele citou ainda que as tarifas estão associadas à “doutrina da mágoa”, segundo a qual uma América gentil seguiu as regras e foi traída por seus parceiros comerciais, e que esta doutrina seria um mandato para parar com a “exploração estrangeira”, punindo quem traiu os Estados Unidos.
O economista Mauro Salvo explicou que sua fala reflete a posição pessoal, e não da instituição em que trabalha, e trouxe uma reflexão geopolítica sobre os impactos da guerra comercial entre Estados Unidos e China e os efeitos do isolacionismo econômico norte-americano. “Com as novas tarifas, Trump abandona a negociação multilateral e parte para uma estratégia de disputa bilateral na qual os EUA se sentem mais fortes para impor condições”, explicou. Para ele, esse movimento ameaça corroer o sistema internacional construído ao longo de décadas. “Essa postura rompe com instituições criadas para reduzir custos e promover cooperação, e tende a gerar reações estratégicas de outros países na formação de novos blocos econômicos”, afirmou.
Salvo também argumentou que a interdependência econômica entre nações está sendo redesenhada. “Todos os países que foram tarifados pelos EUA, inclusive o Brasil, vão buscar novos parceiros comerciais e, ao mesmo tempo, fortalecer suas cadeias produtivas internas”, avaliou. Ele encerrou destacando o papel da política doméstica nas decisões internacionais, com base na teoria dos jogos de dois níveis de Robert Putnam: “Não há política externa sem cálculo interno. Toda decisão no cenário internacional precisa ser ratificada pela opinião pública e pelos interesses domésticos”, concluiu.
XXVI CBE: A inteligência artificial e o futuro da profissão de economista
Economistas Lauro Chaves Neto e Nelson Seixas dos Santos discutem impactos, riscos e oportunidades da IA na atuação profissional
O painel sobre Inteligência Artificial trouxe reflexões profundas sobre o impacto das novas tecnologias na economia, no trabalho e no papel do economista. Os palestrantes Nelson Seixas dos Santos e Lauro Chaves Neto convergiram em uma mensagem central: a IA não é uma tendência distante, mas uma realidade que já transforma métodos analíticos, demandas de mercado e competências profissionais. Em vez de substituir economistas, afirmaram, ela reorganiza o trabalho e exige novos repertórios, especialmente na fronteira entre análise de dados, ciência econômica e programação.
Nelson abriu a mesa defendendo que o núcleo do trabalho analítico permanece o mesmo, ainda que o ferramental se transforme rapidamente: “Todos nós precisamos coletar dados, escolher modelos de análise e estimar parâmetros. Em alguma medida, nossos empregadores ou clientes esperam que tenhamos uma bola de cristal. Com a inteligência artificial, parte desse processo pode ser automatizada — mas isso torna o trabalho humano ainda mais necessário, e não o contrário”, afirmou. Para ele, o verdadeiro desafio é duplo: “Como evitar ser substituído pela IA e como usá-la para alavancar nossa carreira?”.
Seixas reforçou que a IA está para esta geração como a internet esteve para os profissionais nos anos 1990. “Quando a internet surgiu, muitos acharam que o conhecimento estaria tão disponível que os especialistas se tornariam desnecessários. Aconteceu exatamente o oposto: com um excesso de dados, aumentou a demanda por quem sabe transformar informação em análise”, disse. Ele também deixou um alerta direto aos jovens economistas: “Para os profissionais júnior, entender de ciência de dados e IA é condição sine qua non. E para os sênior, será indispensável aprender a dialogar com algoritmos e entender o que eles fazem. A IA veio para ficar — e a palavra final sobre seu uso ainda será nossa, dos profissionais”, concluiu.
Lauro trouxe uma reflexão estratégica sobre a transformação em curso e a necessidade de adaptação acelerada. “Estamos aqui mais para colocar dúvidas do que respostas. Nenhum especialista em IA hoje sabe dizer como estará essa tecnologia em um ano. A única certeza é que ela já mudou a forma de trabalhar e vai continuar mudando”, disse. Citando Garry Kasparov, ele resumiu a nova lógica produtiva: “Não se trata mais de competir com as máquinas, mas de colaborar com elas”.
Chaves destacou que a IA deve ser vista como oportunidade por quem souber usá-la: “A inteligência artificial não é sobre fazer mais — é sobre fazer melhor. Ela não substitui o humano: amplia o possível. A ameaça não é a IA, mas não aprender a utilizá-la. A verdade é simples: a IA não vai substituir economistas. Mas economistas que usam IA vão substituir os que não usam”, afirmou. Ele encerrou com uma provocação pragmática: “Quer saber qual a primeira regra para usar IA? Comece. Só aprende quem coloca na prática”.
XXVI CBE inclui Encontro de Funcionários do Sistema Cofecon/Corecons em sua programação
O evento reuniu colaboradores dos Conselhos Regionais de todo o país para discutir temas como fiscalização, gestão, inovação e sustentabilidade no âmbito do Sistema Cofecon/Corecons
Como parte da programação do XXVI Congresso Brasileiro de Economia (CBE 2025) — o mais tradicional evento do Sistema Cofecon/Corecons — foi realizado, nos dias 6 e 7 de outubro, o Encontro de Funcionários.
Gerentes, fiscais, advogados e profissionais da área administrativa de Conselhos Regionais de todo o Brasil participaram do encontro, que teve como objetivo debater os principais desafios e demandas das entidades, além de promover o compartilhamento de experiências, conhecimentos e boas práticas. Também foram discutidos caminhos para o aprimoramento da eficiência do Sistema Cofecon/Corecons.
A abertura contou com falas da presidenta do Cofecon, Tania Cristina Teixeira, e do presidente do Corecon-RS, Rodrigo Salvato de Assis, que destacaram a importância do trabalho conjunto e colaborativo entre os Corecons para o fortalecimento da categoria dos economistas em todo o país.
Lançamento do novo Manual de Fiscalização do Sistema Cofecon/Corecons
O encontro entre os colaboradores foi marcado pelo lançamento da edição atualizada do Manual de Fiscalização do Sistema Cofecon/Corecons, documento que norteia as práticas e os procedimentos fiscalizatórios no âmbito dos Conselhos Regionais.
A apresentação foi conduzida pela Comissão de Fiscalização e Registro do Cofecon, representada pela coordenadora Maria do Socorro Erculano e pelos membros Maria de Fátima Miranda e José Marcos de Campos. A moderação ficou a cargo da superintendente do Cofecon, Aline Tales Ferreira.
O novo manual apresenta atualizações importantes, com potencial para ampliar o alcance da atuação dos fiscais por meio da modernização e diversificação dos meios e ferramentas utilizados na identificação de profissionais em exercício ilegal da profissão. Além disso, contribui para o fortalecimento do controle e da conformidade dos procedimentos de fiscalização.
Maria do Socorro iniciou sua fala com a pergunta: “Qual o papel do fiscal?”, propondo uma reflexão ao público. Em seguida, respondeu que a função primordial do fiscal é proteger o mercado de trabalho do economista e a sociedade como um todo, garantindo o exercício legal, especializado e ético das atividades de Economia e Finanças no país.
A coordenadora da Comissão de Fiscalização do Cofecon também chamou atenção para um ponto preocupante: a redução no número de economistas registrados ao longo dos anos. Ela destacou que os fiscais desempenham um papel essencial na reversão desse cenário, reforçando a importância de uma fiscalização com caráter educativo. Segundo ela, ações como visitas a escolas, agendas em universidades e participação em eventos acadêmicos são fundamentais para conscientizar estudantes e profissionais recém-formados sobre a necessidade do registro no Conselho.
Maria de Fátima, por sua vez, enfatizou que “é essencial que as abordagens sejam feitas com diálogo e respeito”, a fim de convencer os profissionais sobre a importância do registro e os benefícios que ele representa tanto para os economistas quanto para a sociedade.
O membro da Comissão de Fiscalização e Registro e conselheiro do Corecon-SP, José Marcos de Campos, explicou que a revisão e o lançamento do novo Manual de Fiscalização surgiram da necessidade de atualizar um documento datado de 2019, que já não contemplava as diversas modificações e oportunidades trazidas pelos sistemas eletrônicos implementados no Sistema Cofecon/Corecons nesse período (SEI, BRC, Thomas Greg, entre outros).
“Era necessário atualizarmos o Manual e modernizarmos as práticas de fiscalização. Mas é importante destacar o protagonismo dos próprios fiscais na construção deste manual. Afinal, foram eles, com suas experiências e conhecimentos, que nos forneceram todos os subsídios e informações necessários para construirmos o manual mais eficaz possível, à luz das tecnologias e recursos atualmente disponíveis”, destacou.
Encerrando o primeiro bloco do encontro, dedicado à fiscalização profissional, a superintendente do Cofecon, Aline Tales Ferreira, afirmou: “Os economistas são fundamentais, estão na mídia todos os dias, e a profissão é considerada uma das carreiras mais promissoras. Precisamos trabalhar, portanto, para trazer mais economistas para o Conselho, e o trabalho dos departamentos de fiscalização é essencial nesse processo.”
O painel sobre fiscalização contou ainda com a participação de fiscais do Sistema Cofecon/Corecons: Angeilton Faleiro (Corecon-DF), Bruna Koski (Corecon-SP) e Mônica Silva (Corecon-RJ), como palestrantes, e Inara dos Santos Betat (Corecon-RS), como moderadora. Os profissionais compartilharam suas experiências, com foco em práticas eficazes de fiscalização profissional.
Recuperação de créditos como caminho para a sustentabilidade financeira do Sistema
Na terça-feira (07/10), o primeiro tema abordado foi a recuperação de créditos pelos Corecons. Os advogados Diego Freitas (Corecon-SP) e Alexandre Biansini (Corecon-RS) compartilharam experiências bem-sucedidas na recuperação judicial de valores inscritos em dívida ativa de seus respectivos Conselhos.
Na sequência, a chefe de Cobrança do Corecon-SP, Ticiane Viana, e a gerente do Corecon-PE, Rayssa Mercês, apresentaram estratégias e ferramentas eficientes voltadas para a cobrança administrativa — ou seja, de valores que ainda não foram judicializados.
O registro profissional dos economistas é uma exigência legal, assim como o pagamento das anuidades correspondentes. Nesse contexto, a diligência dos gestores dos Corecons nos procedimentos de cobrança constitui um dever inerente à responsabilidade do exercício de sua função pública.
Além disso, a eficiência nos processos de recuperação de crédito representa uma premissa fundamental para a saúde financeira e a sustentabilidade do Sistema Cofecon/Corecons.
Licitações e transparência
Na sequência, foi a vez de Júlia Bittencourt (Corecon-RS) e Fábio Ronan (Procurador-Geral do Cofecon) abordarem o tema licitações e contratos, com moderação de Ana Cláudia Ramos, coordenadora do Cofecon.
Os profissionais apresentaram os princípios e requisitos legais das compras públicas, com destaque para as modalidades de compras diretas — como dispensa de licitação, inexigibilidade e emergencial. Fábio Ronan concentrou-se nas questões legais que envolvem os processos de compra dos Corecons, enquanto Júlia Bittencourt demonstrou métodos, práticas e a organização dos processos de aquisição dentro do Sistema Eletrônico de Informações (SEI).
A mesa também tratou da obrigatoriedade da publicação de contratos no Portal Nacional de Compras Públicas, bem como da alimentação dos Portais de Transparência dos Corecons — ações fundamentais para o cumprimento do princípio da publicidade, da Lei de Acesso à Informação e da Lei da Transparência.
Gestão, Inteligência e Inovação
O período da tarde teve início com uma palestra da coordenadora da Comissão de Mercado de Trabalho do Cofecon, Lucia dos Santos Garcia, sobre saúde mental e prevenção ao assédio no ambiente de trabalho, com moderação de Maria do Socorro Erculano, coordenadora da Comissão de Governança do Cofecon.
Na sequência, Daniel Soares — gerente executivo do Corecon-DF e CEO da Exitum Auditoria, Consultoria & Compliance, empresa prestadora de serviços ao Cofecon — tratou da prestação de contas dos Conselhos. Durante sua apresentação, forneceu aos funcionários dos Corecons informações técnicas e legais para que os Conselhos Regionais possam entregar suas prestações de contas com total conformidade e adequação. Por determinação legal, os Conselhos de Fiscalização Profissional devem prestar contas aos Conselhos Federais, sendo submetidos à análise do Tribunal de Contas da União (TCU).
A última mesa do evento foi dedicada aos sistemas e tecnologias essenciais para o expediente dos Conselhos. Dwan Martiningue, chefe de Registro e Cobrança do Corecon-PR, apresentou diversas técnicas e funcionalidades do sistema informacional BRC — principal ferramenta de trabalho dos Corecons, responsável pelo armazenamento e tratamento de todos os dados dos economistas.
Na mesma mesa, o gerente executivo do Corecon-PR, Amarildo Santos, destacou a importância da integridade e adequação dos Portais da Transparência dos Conselhos, enfatizando a disponibilização das informações financeiras, contábeis e os atos normativos em vigor.
Encerrando o painel, Júlio Poloni, gerente executivo do Corecon-SP, apresentou a aplicação da inteligência artificial no cotidiano do Conselho. Ele demonstrou uma nova ferramenta de IA integrada ao Sistema Eletrônico de Informações (SEI), ambiente virtual que registra e formaliza todos os processos dos Corecons. Além disso, comentou outras soluções de IA utilizadas no Corecon-SP para apoio na produção e revisão de textos, bem como na organização e integração de informações diversas. A proposta, segundo ele, é compreender a IA como uma aliada na busca por mais eficiência e praticidade nas operações do Conselho — sem substituí-la pelo raciocínio humano, pela inteligência natural ou pelo planejamento estratégico.
XXVI CBE: Fórum de Perícia discute oportunidades de atuação
Painel destaca o crescimento do mercado para economistas peritos e a importância da credibilidade e imparcialidade na área
O exercício da perícia econômico-financeira vem ganhando cada vez mais relevância no cenário jurídico e no mercado de trabalho, abrindo novas possibilidades de atuação para economistas em processos judiciais e extrajudiciais. Esse foi o foco do painel “O Mercado de Trabalho do Economista Perito”, que reuniu os especialistas Margareth Bellinazo e Luis Adelar Ferreira. Os participantes destacaram que a perícia exige sólida formação técnica, responsabilidade ética e constante atualização, sendo uma área promissora — mas que só se sustenta com credibilidade profissional.
A economista Margareth Bellinazo, que atua como assistente técnica, destacou que a perícia econômica é um trabalho que exige rigor e atualização constante. “O assistente técnico é o economista que presta consultoria especializada a advogados e clientes, ajudando a traduzir dados e informações de forma precisa e compreensível para o juiz. É um trabalho de bastidor, mas que exige muito preparo”, explicou. Segundo ela, o domínio técnico e a qualidade das análises são determinantes para consolidar a credibilidade do profissional. “A qualidade do trabalho é o que constrói a credibilidade do profissional. Sem isso, o mercado não se sustenta”, reforçou.
Já Luis Adelar Ferreira, que atua como perito do juiz, lembrou que a imparcialidade é o elemento central da função. “O perito do juiz é o profissional de confiança do magistrado, responsável por analisar as provas técnicas e traduzir o conteúdo econômico com clareza e imparcialidade. O economista que assume essa função precisa compreender que seu trabalho pode ser determinante para a decisão judicial”, observou. Ele destacou ainda que “não basta dominar cálculos ou planilhas. O juiz precisa confiar que o economista está apresentando a verdade dos fatos, dentro da técnica e da ética”.
XXVI CBE: Perícia econômico-financeira como um instrumento de justiça
Durante o XXVI Congresso Brasileiro de Economia, especialistas destacaram a evolução da perícia técnica e sua importância para a construção da verdade processual
A perícia econômico-financeira vem se consolidando como ferramenta essencial para a Justiça brasileira, sobretudo diante da crescente complexidade das relações econômicas. Esse foi o ponto central da palestra “A importância da Perícia Econômico-Financeira no Judiciário”, apresentada pelo procurador federal José Márcio Azevedo Barbosa, da Advocacia-Geral da União, durante o XXVI Congresso Brasileiro de Economia (CBE). Com abordagem técnica e didática, Barbosa explicou como a perícia apoia magistrados na solução de litígios que envolvem contratos, cálculos financeiros, avaliação de empresas e liquidação de sentenças, reforçando o papel estratégico do economista no sistema de justiça.
Barbosa destacou a evolução da área, que antes era tratada como perícia contábil e hoje é reconhecida como perícia técnico-científica, refletindo o avanço das relações econômicas e a necessidade de análises mais amplas. Explicou também que a perícia é um meio de prova essencial para esclarecer fatos que exigem conhecimento técnico especializado, auxiliando o juiz em casos que envolvem cálculos de dívidas, avaliações de empresas, revisões contratuais e liquidação de sentenças trabalhistas. “Mesmo magistrados com formação econômica devem nomear peritos, já que o laudo precisa ser transparente e compreensível para todas as partes envolvidas”, observou.
Durante sua fala, ele detalhou o papel do perito e do assistente técnico: o primeiro atua como auxiliar do juiz, elaborando o laudo pericial, enquanto os assistentes técnicos, contratados pelas partes, produzem pareceres que reforçam ou contestam as conclusões apresentadas. Barbosa ressaltou que a perícia deve ser “necessária, útil e praticável”, sendo dispensada quando outros meios de prova já esclarecem os fatos.
O especialista destacou ainda o amplo campo de atuação do economista perito — que vai de ações cíveis e trabalhistas a perícias tributárias, bancárias e de recuperação judicial. Ele comentou também sobre a adaptação ao ambiente digital, que permite atuação em todo o país, e lembrou que, embora não haja curso específico exigido além da formação em Economia e inscrição no conselho profissional, “o conhecimento técnico e a experiência são os verdadeiros critérios que qualificam o perito”.
Encerrando sua fala, Barbosa destacou a relevância das perícias complexas e multidisciplinares, cada vez mais frequentes, e a inovação da prova técnica simplificada nos juizados especiais, que agiliza decisões sem comprometer a análise técnica.
XXVI CBE: Perícia econômico-financeira como instrumento de transparência e confiança no Judiciário
Conselheiro do Corecon-SP aborda prestação de contas como campo de atuação do economista perito que exige domínio técnico e jurídico
O economista José Marcos de Campos, conselheiro do Corecon-SP e coordenador da Comissão de Perícia, ressaltou que a perícia econômico-financeira desempenha um papel decisivo no Poder Judiciário na construção de soluções justas e tecnicamente fundamentadas. Ao abordar o tema “Perícia econômico-financeira de prestação de contas”, ele destacou que essa atividade exige não apenas rigor metodológico, mas também sólida compreensão dos fundamentos jurídicos que orientam os processos. “Trata-se de uma função de confiança do juiz, que lida diretamente com patrimônio, responsabilidade e interesse público”, observou.
“Nós precisamos ter um conhecimento aprofundado também das questões de direito. Os conceitos jurídicos são fundamentais para desempenhar com proficiência uma missão que é de confiança do juiz”, afirmou Campos, lembrando que o trabalho do perito envolve, em última instância, a vida e o patrimônio de terceiros.
O economista explicou que a perícia em ações de prestação de contas é uma prerrogativa compartilhada entre economistas e contadores, e que muitas vezes o Judiciário ainda associa esse tipo de processo exclusivamente à contabilidade. “É essencial reforçar que a prova em juízo, nesses casos, é econômico-financeira e está dentro da nossa prerrogativa profissional”, ressaltou.
Campos detalhou o funcionamento da ação de exigir contas prevista no Código de Processo Civil, esclarecendo que o perito não presta contas por ninguém, mas examina e elucida as informações apresentadas pelas partes. “Quando o perito assume a prestação, ele traz para si uma responsabilidade que não é dele”, alertou.
Com base em exemplos práticos — como casos envolvendo condomínios, fundos de investimento, inventários e curatelas —, o economista reforçou que a perícia é uma ferramenta de governança e transparência, essencial para garantir decisões técnicas e fundamentadas. “O perito não julga, ele fornece ao juiz os elementos técnicos que permitem uma decisão justa”, explicou.
XXVI CBE: Perícia bancária, um campo que exige domínio técnico e atualização constante
Economista Paulo Roberto Godoy destaca que maioria das perícias no Judiciário é econômico-financeira e defende protagonismo do economista na área
Com mais de 50 anos de atuação profissional, o economista Paulo Roberto Godoy trouxe ao XXVI Congresso Brasileiro de Economia uma análise direta e fundamentada sobre a perícia financeira bancária, área estratégica dentro dos processos judiciais que envolvem operações de crédito e contratos financeiros. Em sua palestra, ele enfatizou que esse tipo de perícia não deve ser tratado como um campo isolado, mas sim como parte essencial da perícia econômico-financeira – área de atuação legítima do economista perito.
“A grande maioria das perícias deferidas pelo Judiciário não são contábeis, mas sim econômico-financeiras. É fundamental que os tribunais reconheçam isso e passem a nomear economistas para esses casos”, defendeu o economista. Ele abordou operações como cartões de crédito, leasing, crédito consignado, financiamentos imobiliários e agrícolas, e explicou que o perito deve ter domínio absoluto das fórmulas e metodologias aplicadas nos contratos. “O perito é auxiliar do juiz. Ele não está ali para opinar, mas para apresentar conclusões objetivas, embasadas tecnicamente”, afirmou.
Entre os exemplos citados, destacou as diferenças entre ano civil e comercial nos cálculos de juros, a capitalização de juros em períodos inferiores a um ano e as mudanças trazidas pela Lei nº 14.905/2024 e pela Resolução 5.171 do Conselho Monetário Nacional, que introduziram o conceito de taxa legal com base na Selic e no IPCA-15. “Essas novas regras poderão ser aplicadas retroativamente, o que afetará milhares de ações em curso”, alertou.
Godoy defendeu que o economista perito deve dominar matemática financeira, correção monetária e interpretação contratual, além de manter constante atualização técnica. “Não basta ter curso superior. É preciso formação específica, ética, clareza na redação e constante atualização técnica”, reforçou.
XXVI CBE: A importância do economista na avaliação econômica de empresas
“O perito trabalha com o valor econômico, e não apenas com o preço de mercado”, apontou o economista perito Jaime Macadar
A relação entre perícia e justiça econômica também foi o ponto de partida para a palestra do economista Jaime Adrian Moron Macadar, na palestra “Avaliação econômica de empresas nos processos judiciais”. O especialista trouxe uma reflexão sobre o papel do economista perito nas disputas que envolvem o valor de companhias, ativos e passivos, destacando que a perícia é, antes de tudo, um exercício de responsabilidade técnica e social.
Segundo ele, a avaliação de empresas “vai muito além de fórmulas e balanços”. Macadar defendeu que o economista precisa compreender o contexto econômico, o ambiente concorrencial, as projeções de mercado e, principalmente, a realidade do negócio que está sendo avaliado. Ele lembrou que, em muitos casos, um laudo pericial pode definir o rumo de decisões judiciais com grande impacto financeiro e social, exigindo rigor e responsabilidade de quem o elabora.
O economista chamou atenção também para a diferença entre valor e preço, conceitos muitas vezes confundidos no senso comum. “O perito trabalha com o valor econômico — uma estimativa fundamentada no potencial de geração de resultados — e não apenas com o preço de mercado. São conceitos distintos, e o perito precisa dominar essa diferença para oferecer um trabalho de qualidade e credibilidade”, explicou.
Entre os métodos abordados por Macadar estiveram o fluxo de caixa descontado e o valor patrimonial, com destaque para a necessidade de atualização constante frente às transformações tecnológicas e regulatórias que afetam o mercado. “O economista perito precisa estar preparado para lidar com as mudanças no ambiente empresarial e com as novas ferramentas de análise que surgem a todo momento”, observou.
Ao final, ele reforçou que a perícia econômico-financeira é uma área em expansão e estratégica para a valorização da profissão. “A atuação do economista perito exige conhecimento técnico, ética e compromisso com a verdade dos fatos econômicos. É uma oportunidade de contribuir diretamente para a justiça e para o fortalecimento institucional do país”, concluiu.
XXVI CBE: “Inteligência artificial é aliada do economista perito”, afirma Nelson Seixas
Em palestra no Fórum de Perícia Econômico-Financeira, especialista mostra como IA pode aumentar produtividade e qualidade das perícias, desde que usada com responsabilidade e supervisão técnica
O avanço da inteligência artificial (IA) já está transformando profissões e criando novas formas de produzir conhecimento — e, no campo da perícia econômico-financeira, não será diferente. Foi com essa perspectiva que o economista Nelson Seixas dos Santos conduziu sua palestra no XXVI Congresso Brasileiro de Economia (CBE), defendendo que a tecnologia deve ser vista como uma ferramenta estratégica e não como competidora do trabalho humano. Com uma abordagem leve e prática, Seixas destacou que a IA amplia a capacidade de análise do perito ao automatizar tarefas repetitivas e liberar tempo para o que realmente importa: a interpretação crítica dos fatos econômicos e a construção de argumentos técnicos de qualidade.
O economista abriu a fala com uma provocação: “Muitos veem a IA como uma ameaça, mas o que precisamos é compreendê-la como uma aliada”. Segundo Seixas, a inteligência artificial ainda está em estágio inicial, mas já transforma o modo de trabalhar em diferentes áreas. “Assim como a internet mudou completamente o nosso modo de atuar, a IA também vai mudar. A diferença é que, neste momento, não há risco de substituição do perito humano. Pelo contrário, há novas oportunidades”, afirmou.
O professor demonstrou o potencial da tecnologia exibindo um vídeo totalmente produzido por IA, em apenas seis minutos, com ferramentas gratuitas como o Notebook LM e o Gamma App. “A IA permite que foquemos no que realmente importa: a análise econômica, o raciocínio crítico e a interpretação dos dados”, explicou. Ao mesmo tempo, alertou para as limitações do uso dessas ferramentas, como as chamadas “alucinações” — quando o sistema gera informações falsas — e a falta de transparência dos algoritmos. “Essas limitações reforçam que a IA deve ser supervisionada e validada por especialistas. Ela é uma ferramenta de auxílio, não de decisão autônoma”, pontuou.
Durante a palestra, Seixas apresentou também resultados de pesquisas em bases acadêmicas como o Google Scholar e o RePEc, que mostram o quanto o tema ainda é pouco explorado na literatura econômica. “Quando buscamos trabalhos sobre inteligência artificial aplicada à perícia econômica, encontramos quase nada. Isso mostra o tamanho da oportunidade que temos. Podemos e devemos ocupar esse espaço”, destacou.
Para ele, o domínio da IA não exige formação técnica avançada, mas sim curiosidade e disposição para aprender. “O perito não precisa ser programador, mas precisa entender o básico — o que é um algoritmo, como funcionam os modelos de linguagem, quais são suas limitações. Quando conhecemos, deixamos de temer. E é aí que a IA passa a trabalhar a nosso favor”, afirmou.
Encerrando com leveza, Seixas exibiu um vídeo gerado por IA intitulado “O Exterminador de Economistas” e brincou: “Ainda faltam 20 ou 30 anos para isso acontecer. Até lá, seguimos no controle”. Em seguida, concluiu com uma reflexão: “A IA não vai nos eliminar, mas vai exigir que sejamos melhores no que fazemos. Cabe a nós formar profissionais capazes de usá-la com propósito e eficiência.”
XXVI CBE: A perícia ambiental e a importância de agir antes do dano
Economista alerta que atuação na área não deve se limitar à mensuração de prejuízos, mas propor soluções para evitar danos socioambientais
Encerrando Fórum de Perícia Econômico-Financeira realizado durante o XXVI Congresso Brasileiro de Economia (CBE), o economista e professor Gustavo Inácio de Moraes apresentou uma abordagem inovadora sobre a atuação do economista na interface entre desenvolvimento econômico e sustentabilidade. Em sua palestra, intitulada “Perícia Econômica, Ambiental e Danos”, o doutor pela USP e docente da PUCRS destacou que a perícia ambiental ainda é majoritariamente reativa no Brasil, entrando em cena apenas após a ocorrência de desastres. Para ele, esse modelo está ultrapassado.
“O perito ambiental precisa propor antes de reagir. Ele não deve apenas mensurar prejuízos, mas atuar como instrumento para preveni-los”, defendeu. O professor destacou que a perícia ambiental é, por natureza, interdisciplinar, exigindo diálogo entre diferentes áreas do conhecimento. Apresentou cinco métodos de valoração econômica — custo da viagem, preço hedônico, lucros cessantes, valoração contingente e bens e insumos complementares —, cada um revelando dimensões diferentes do valor ambiental.
Entre os exemplos citados, Moraes relembrou o vazamento de petróleo na Baía de Paranaguá (2005) e o caso de Eldorado do Sul (RS), município que desempenha papel crucial na preservação da água do Guaíba. “É uma cidade que faz um esforço ambiental em benefício de todos os demais municípios da região metropolitana, e esse esforço precisa ser reconhecido e valorado”, destacou.
Ao concluir, defendeu que a perícia ambiental deve ser vista como uma forma de seguro. “O símbolo do seguro é o guarda-chuva: ele serve para evitar que a gente se molhe, não para secar depois. É assim que o economista deve pensar quando atua com o meio ambiente — com uma postura preventiva e propositiva”, afirmou.
XXVI CBE: O novo BNDES e o desafio de financiar o futuro sustentável do Brasil
Na palestra magna do evento, Gabriel Ferraz Aidar apresentou a visão estratégica do banco para combinar crédito, garantias e inovação na promoção do desenvolvimento equilibrado e de longo prazo
O economista Gabriel Ferraz Aidar, superintendente da área de Planejamento e Pesquisa Econômica do BNDES, foi o responsável pela palestra magna no XXVI Congresso Brasileiro de Economia. Ele abordou o papel que o banco vem exercendo para promover transparência e inovação em sua atuação, bem como sua importância no suporte ao desenvolvimento nacional. Aidar traçou uma linha histórica até os desafios contemporâneos, destacando a evolução e as novas atribuições do banco público no contexto de crise climática, desigualdades regionais e necessidade de modernização institucional.
“Hoje o BNDES é um aquário”. Com essa frase, Aidar enfatizou o compromisso do banco com mais visibilidade e responsabilidade em suas ações, especialmente com instrumentos que possam alavancar a transição energética e promover impactos positivos na sociedade. Ele lembrou também que o BNDES “foi e é a casa de grandes economistas”, citando nomes históricos como Inácio Rangel e Roberto Campos, e destacou que, além de atuar como instituição de crédito e financiamento, a instituição é “um banco de ideias para o país”.
Em sua exposição, Aidar apresentou números que refletem a amplitude do papel do banco, como aportes recentes em iniciativas de energia renovável, editais para transição energética, a atuação em garantias e participação outras atividades. “O BNDES lançou um edital focando na transição energética. Voltou a investir diretamente em empresas (a partir de fundos garantidores)”, contou Aidar. Ele também ressaltou que, diante de desastres naturais — como as enchentes ocorridas em 2024 no Rio Grande do Sul —, o banco teve importante atuação para apoiar o estado.
Por fim, olhando para o futuro, Aidar indicou que o banco irá continuar expandindo sua atuação em setores estratégicos, combinando políticas públicas, mercado e inovação. “O novo BNDES precisa focar na transição energética, sendo o principal banco que financia energias renováveis; hoje o banco está na fronteira da transição energética, com o hidrogênio verde”. Ele lembrou ainda que iniciativas como o Fundo Clima vêm ganhando escala. “Em 2024 o Fundo Clima mudou de patamar, graças ao desenho de captação sustentável. As operações aprovadas em 2024 removeram da atmosfera mais de 86 milhões de toneladas de CO2 equivalente ao longo da vida útil dos empreendimentos”. Aidar também frisou que isso se dá por meio de parcerias com o mercado, participação em fundos e instrumentos de crédito, garantias, financiamentos não reembolsáveis e serviços para modernização de estatais e infraestrutura.
Cofecon entrega XXXI Prêmio Brasil de Economia
Solenidade ocorreu em Porto Alegre, durante o XXVI Congresso Brasileiro de Economia. Ladislau Dowbor, Tomás Torezani, Luiz Gustavo Hellmann e Felipe Marcos Prado foram os vencedores de cada uma das categorias
O Conselho Federal de Economia realizou nesta terça-feira (07) a entrega do XXXI Prêmio Brasil de Economia, que distribuiu R$ 19 mil aos autores de trabalhos apresentados em quatro categorias: Livro de Economia, Artigo Técnico ou Científico, Artigo Temático e Monografia de Graduação. O evento foi realizado no Plaza São Rafael Hotel, em Porto Alegre, durante a abertura do XXVI Congresso Brasileiro de Economia.
Livro
Na categoria Livro de Economia, o prêmio de R$ 8 mil foi entregue ao economista Ladislau Dowbor. Ele é autor do livro “Os Desafios da Revolução Digital”. Ausente na solenidade de abertura do evento, Dowbor recebeu o prêmio no dia seguinte – ele participou do Congresso Brasileiro de Economia como palestrante.
O segundo lugar ficou com Alexandre de Freitas Barbosa, autor de “Celso Furtado: trajetória, pensamento e método”, e o terceiro colocado coube a Gustavo Nunes Mourão e Mari Aparecida dos Santos, autores de “Planejamento e Desenvolvimento Regional”.
Artigo Técnico ou Científico
Na categoria Artigo Técnico ou Científico, o vencedor foi o economista gaúcho Tomás Torezani. Ele é autor do texto “O Papel dos Setores Formal e Informal na Evolução da Produtividade Brasileira e recebeu o prêmio de R$ 4 mil correspondente ao primeiro lugar.
Em segundo lugar ficaram os economistas Ademir Antonio Moreira Rocha e Eduardo Gonçalves, autores do texto “Medindo o Efeito Causal da Adoção do Sistema de Plantio Direto sobre Áreas Naturais do Brasil”. O terceiro lugar também ficou com um texto de dois autores: “Estado Novo de Vargas: Um Caso de Populismo Econômico?”, escrito por Claucir Roberto Schmidtke e Pedro Cezar Dutra Fonseca.
Artigo Temático
Neste ano, a categoria Artigo Temático foi destinada a estudantes de economia e teve como tema a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30). O primeiro colocado – ganhador de um prêmio de R$ 3 mil – foi Luiz Gustavo Ismael Hellmann, da Universidade do Extremo Sul Catarinense.
A menção honrosa pelo segundo lugar coube ao estudante Bruno Almeida de Azara, da Universidade Federal do ABC; já o terceiro lugar ficou com Êmili Decesare de Oliveira, da Universidade de Passo Fundo.
Monografia
A categoria Monografia de Graduação entrega um prêmio de R$ 3 mil para o primeiro colocado – e, atualmente, é também a única que entrega um prêmio em dinheiro para o segundo colocado (R$ 1 mil) e menções honrosas até o quinto lugar. O primeiro colocado foi Felipe Marques Prado, estudante da Universidade Estadual de Santa Cruz, autor do texto “Análise Espacial da Pobreza Multidimensional no Norte do Brasil”.
Durante a entrega, a presidenta do Conselho Regional de Economia da Bahia, Isabel Ribeiro, mencionou que na mesma data o curso de Ciências Econômicas da UESC estava completando 60 anos.
O segundo lugar foi José Henrique Oliveira Costa, da Universidade Federal de Alagoas, autor de “Análises Sobre a Relação Entre Cadeias Globais de Valor e Pegada Ecológica no Período 2005 a 2018”. As menções honrosas foram para Marcos Vinícius de Oliveira Andrade, da Universidade Federal do Acre, autor de “Um Grito de Socorro: o Impacto da Pandemia de Covid-19 nos Índices de Suicídios no Brasil e Regiões – Uma Análise a Partir do Modelo Estrutural Bayesiano de Séries Temporais”; Jessica Malena Bastos de Almeida, da Universidade Federal do Pará, autora de “A Importância da Conclusão do Ensino Médio e do Ensino Superior Para a Superação da Pobreza Multidimensional: Um Recorte de Gênero e Raça/Cor no Estado do Pará”; e Júlia Manini Martins Bonilha, da Universidade Estadual de Campinas, autora de “Transferência de Renda Condicionada e o Mercado de Trabalho Formal: Uma Análise dos Municípios Brasileiros”.
XXVI CBE: Trajetória e desafios da economia gaúcha no contexto das mudanças climáticas
Economistas analisam os impactos das enchentes de 2024 e defendem reconstrução baseada em sustentabilidade e planejamento de longo prazo
As mudanças climáticas deixaram de ser uma previsão distante para se tornarem uma realidade concreta, com impactos severos sobre a vida das pessoas e a dinâmica econômica dos territórios. No Rio Grande do Sul, os eventos extremos que marcaram 2024 expuseram a vulnerabilidade da infraestrutura e da economia do estado, exigindo respostas urgentes do poder público, do setor produtivo e da academia. Foi nesse contexto que os professores Carlos Eduardo Schönerwald da Silva e Nelson Gruber, ambos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), participaram de debate no XXVI Congresso Brasileiro de Economia, trazendo uma reflexão profunda sobre os desafios da reconstrução e o papel estratégico dos economistas na transição para um modelo de desenvolvimento sustentável e resiliente.
Carlos explicou que os estudos conduzidos pela universidade analisam como a economia do Rio Grande do Sul tem se comportado ao longo do tempo, especialmente no contexto da emergência climática e tendo como foco as enchentes que atingiram Porto Alegre em 2024. Entre as áreas analisadas estão tributação, regulação e o impacto das políticas públicas no enfrentamento da crise ambiental. “A partir do evento climático, começamos a entender quais são os desafios para que tenhamos um desenvolvimento sustentável efetivo no estado, com uma transformação produtiva que incorpore a questão climática de forma endógena”, explicou.
Schönerwald destacou ainda o papel essencial dos economistas nesse processo, já que são profissionais que podem contribuir, tanto no setor privado, ajudando empresas a integrarem práticas sustentáveis em seus negócios, quanto no setor público, por meio de pesquisas acadêmicas e formulação de políticas públicas.
Gruber destacou a importância de um planejamento estratégico que considere os novos cenários climáticos e as frequentes adversidades ambientais. “Temos trabalhado intensamente com questões relacionadas às mudanças climáticas em diversos âmbitos, desde estudos na Antártica até análises sobre deslizamentos de terra, modelagens e impactos socioeconômicos e ambientais. É crucial adotarmos uma nova perspectiva de planejamento que priorize a sustentabilidade e a preservação ambiental, já que eventos extremos estão se tornando mais frequentes e intensos”, afirmou.
O professor ressaltou que o trabalho de prevenção e adaptação às mudanças climáticas deve ser integrado e multidisciplinar, envolvendo áreas como engenharia, arquitetura, economia, biologia, física e química. Ele também mencionou a necessidade de dialogar com planejadores e economistas para buscar soluções conjuntas.
XXVI CBE: Desafios do mercado financeiro brasileiro
Painel do XXVI Congresso Brasileiro de Economia discute impacto da inteligência artificial nas finanças e o avanço do endividamento das famílias no país
Em um cenário econômico marcado por incertezas globais, transformação tecnológica acelerada e aumento do endividamento das famílias, compreender as dinâmicas do mercado financeiro tornou-se essencial. O painel “Mercado Financeiro” contou com a presença dos economistas André Perfeito e Edval Landulfo e as apresentações abordaram desde o uso crescente da inteligência artificial nas análises financeiras até a preocupante escalada do endividamento das famílias brasileiras, revelando dois vetores decisivos para o futuro das finanças no país: a inovação tecnológica e a educação econômica.
Perfeito abriu as apresentações falando do uso da IA no mercado financeiro, área onde atua, na consultoria econômica e até mesmo na gestão de finanças pessoais, e destacou a importância da criatividade dos economistas diante das transformações tecnológicas. “O objetivo da minha apresentação foi trazer à tona alguns casos de uso da IA, não com o intuito de aprofundar explicações técnicas, mas para mostrar as possibilidades que essa ferramenta poderosa oferece”, diz.
O economista relembrou sua própria trajetória acadêmica, mencionando os desafios enfrentados na época em que estudava econometria. Ele citou o uso de softwares que exigiam processos manuais e detalhados para a análise de dados. “Era necessário organizar tudo no Excel, criar tabelas e gráficos manualmente para obter os resultados desejados”, relatou. No entanto, 2023, segundo ele, marca um ponto de inflexão na adoção de IA. “É impressionante perceber como a tecnologia está transformando a forma de trabalhar dos economistas. O que antes era feito com muito esforço e horas de dedicação agora pode ser realizado em minutos com o auxílio da inteligência artificial”, afirmou.
Edval, vice-presidente do Corecon-BA, fez um paralelo à fala de André, trazendo reflexões importantes sobre o impacto do consumismo na sociedade atual e os índices de endividamento das famílias no Brasil. Ele destacou que o desejo de consumir frequentemente ultrapassa as necessidades reais, levando as pessoas a gastarem mais do que podem.
Dados apresentados durante a palestra revelam que 78% das famílias brasileiras estarão endividadas até 2025, um cenário preocupante, já que esse índice vem crescendo desde o ano 2000. Neste contexto entra um agravante, segundo o palestrante, que é o crédito. ”Esse crédito, dado desnecessariamente a pessoas que não têm educação financeira, faz com que as contas fiquem ali desreguladas e isso vai criar uma inadimplência”, afirma. ”Como é que você tem uma renda de R$1.500, R$2.500 e um cartão de crédito com limite de R$5.000 sem ter a educação financeira para fazer ali o equilíbrio?”, questionou o especialista. Ele defendeu que o dinheiro deve ser utilizado para concretizar projetos que realmente façam sentido, com foco em construir primeiro uma base financeira sólida.
XXVI CBE: O comportamento e a tomada de decisão econômica
Especialistas em psicologia e economia comportamental discutem limites da racionalidade e impactos nas políticas públicas e finanças no XXVI Congresso Brasileiro de Economia
Um dos debates mais provocadores do XXVI Congresso Brasileiro de Economia foi o painel Economia Comportamental”, que colocou em evidência um tema cada vez mais central para a compreensão da dinâmica econômica: o comportamento humano. Participaram da mesa a psicóloga econômica Vera Rita Ferreira, o professor Fernando Nogueira da Costa e a economista Flávia Ávila. Em comum, os palestrantes defenderam que modelos econômicos sem conexão com a realidade psicológica e social das pessoas deixam de explicar o mundo como ele é – e, por isso, políticas públicas e estratégias financeiras precisam incorporar o conhecimento comportamental para gerar resultados concretos.
Vera brincou que veio para tentar “converter” os colegas economistas, já que ela é uma “infiltrada” no evento. “Eu sou psicóloga econômica, então vou trazer um pouco o olhar da psicologia econômica para as questões de desenvolvimento sustentável, que não é a mesma coisa que crescimento, e várias ciladas psicológicas que podem atrapalhar esse processo”, diz.
Ela falou sobre a compreensão do funcionamento mental; a relevância da psicologia econômica e das ciências comportamentais no enfrentamento dos desafios desse desenvolvimento sustentável; e a necessidade de um esforço coletivo, que Vera chama de ”quinteto fantástico”, composto por 1) psicologia econômica, 2) ciências comportamentais, 3) economia comportamental, 4) políticas públicas e 5) regulação.
Vera destaca que essas áreas devem trabalhar juntas para embasar ações como a arquitetura de escolha, a proteção do consumidor e a educação econômica e financeira, resultando num equilíbrio entre o entre crescimento econômico e a responsabilidade social.
Flávia falou sobre economia comportamental e destacou um ponto crucial que afeta tanto indivíduos quanto organizações: o descompasso entre intenção e ação. Segundo ela, muitas pessoas têm o desejo de agir de determinada forma, mas, no momento de colocar seus planos em prática, acabam não concretizando suas intenções. Esse “gap” entre o querer e o fazer é considerado alarmante.
A especialista explicou que, se apenas o acesso à informação fosse suficiente para gerar ação, “todos nós seríamos maratonistas, milionários e extremamente bem-sucedidos”. Contudo, a realidade mostra que o conhecimento por si só não é capaz de superar certos desvios sistemáticos que influenciam o comportamento humano.
Flávia ainda mencionou o conceito de “arquitetura de escolha”, que consiste em criar ambientes que incentivem mudanças positivas no comportamento das pessoas. Ela reforçou que as decisões nem sempre são tomadas com base na racionalidade e que é necessário considerar os fatores que influenciam o processo decisório.
Fernando Nogueira destacou a importância de adaptar os conceitos da área de economia comportamental à realidade brasileira, “em vez de reproduzir ideias estrangeiras”. Segundo ele, não considerar as especificidades locais, pode levar a decisões pouco práticas.
O palestrante enfatizou que a maior parte da riqueza no Brasil está na classe média e nos pequenos investidores, e não apenas nos clientes de alta renda dos bancos privados. Ele apontou mudanças recentes no comportamento financeiro dessas pessoas, como a migração da poupança para investimentos como CDBs e renda fixa.
Para ele, é preciso ensinar educação financeira não só ao público, mas também aos próprios economistas, para que estudem e adaptem suas análises ao contexto brasileiro. “Decisões financeiras devem ser baseadas em dados concretos e na realidade do Brasil, promovendo práticas mais eficazes e seguras para todos os envolvidos”, diz.
XXVI CBE: Estabilidade macroeconômica e crescimento
No painel Política de Estabilização, Samuel Pessôa defende reformas estruturais e equilíbrio fiscal para superar a armadilha da renda média
A estabilização macroeconômica voltou ao centro do debate no XXVI Congresso Brasileiro de Economia durante o painel “Política de Estabilização”, conduzido pelo economista Samuel Pessôa, pesquisador do Ibre-FGV. A discussão examinou os entraves que ainda impedem o crescimento sustentado do Brasil e as políticas necessárias para construir um ambiente econômico estável, previsível e propício ao investimento produtivo.
Pessôa destacou a necessidade de aprender com a experiência internacional.”Estamos devendo esse crescimento há décadas. É fundamental entender como garantir essa estabilização macroeconômica, que é crucial para o desenvolvimento da economia e para a previsibilidade necessária aos investimentos”, afirmou o moderador do painel, Oscar Frank Junior.
Entre os pontos abordados, destacou-se a urgência de rediscutir o arcabouço fiscal e reavaliar regimes tributários especiais, como o Simples Nacional, que, apesar de simplificarem processos, têm sido usados como ferramentas de elisão fiscal. “Esses regimes devem ser justos e não se tornarem instrumentos de desigualdade tributária”, afirmou Samuel.
O palestrante também citou a necessidade de manter o valor real dos salários e ajustar indexadores de saúde e educação. Além disso, comentou sobre a alocação entre capital e trabalho, apontando que essa desarmonia compromete o desenvolvimento econômico. Outro destaque foi a reflexão sobre a chamada “armadilha da renda média”, que impede o avanço econômico pleno. Para ele, enfrentar esses desafios exige coragem política e reformas estruturais que promovam equilíbrio fiscal e justiça social. “Somente assim poderemos construir um Brasil mais próspero e equitativo”, concluiu.
XXVI CBE: Painel sobre economia da saúde teve participação internacional
Debate destacou o papel estratégico do setor para o desenvolvimento e a produtividade do Brasil
O painel “Economia da Saúde” reuniu especialistas do Brasil e do exterior para discutir os desafios de financiamento, gestão e eficiência no setor de saúde. Com a participação da palestrante internacional Céu Mateus, professora da Universidade de Lancaster (Reino Unido), ao lado de Everton Nunes da Silva (UnB) e Ricardo Englert (Santa Casa de Misericórdia), o debate destacou como a saúde, responsável por cerca de 10% do PIB brasileiro, influencia diretamente a produtividade, o bem-estar social e o desenvolvimento econômico do país.
O moderador da mesa, Giácomo Balbinotto, comentou que o Congresso Brasileiro de Economia trouxe, pela primeira vez, um painel exclusivo sobre economia da saúde, abordando temas de grande relevância para o setor. Durante o debate foi destacada a importância da economia da saúde tanto para o Sistema Único de Saúde (SUS) quanto para o sistema privado, além de discutir a formação de economistas especializados e as pesquisas realizadas no Brasil e no mundo nessa área. “Com palestrantes de altíssimo nível, todos com doutorado, e uma abordagem abrangente e prática, o evento foi considerado um grande sucesso pelos participantes, oferecendo uma visão ampla sobre o papel estratégico da economia da saúde no país”.
Ricardo Englert, CFO da Santa Casa, falou do papel do economista na administração hospitalar, compartilhando sua experiência como administrador de um grande hospital. Ele ressaltou os desafios de gerenciar um hospital de grande porte, comparando-o a uma indústria que precisa constantemente avaliar resultados e otimizar recursos. “Eu procurei mostrar o quanto tem espaço para um economista desenvolver a sua profissão lá dentro”, afirmou.
O palestrante enfatizou a importância de equilibrar as necessidades ilimitadas com os recursos escassos, uma realidade enfrentada diariamente no setor hospitalar. “Como é que a gente pode fazer a melhor assistência com menor custo? ” Essa visão reforça o papel estratégico da gestão eficiente para garantir uma assistência de qualidade a um maior número de pessoas”.
Para Everton Nunes, este é um setor que possui um campo amplo. “A complexidade do setor acaba também gerando uma ampla gama de investigações, de métodos que você pode aplicar. A saúde representa torno de 10% do PIB, então é um setor bastante relevante”, afirmou.
A palestrante portuguesa Céu Mateus destacou a importância de inspirar estudantes de economia a se dedicarem à área da economia da saúde. Segundo ela, a saúde é um aspecto essencial que afeta a todos e desempenha um papel crucial no crescimento de um país.
Céu enfatizou que, para alcançar avanços como maior produtividade, inovação e reconhecimento global, é indispensável investir na saúde da população, com atenção especial à educação e ao bem-estar de meninas e mulheres, que têm um papel fundamental na transmissão de saúde para as futuras gerações. “Fala-se muito da necessidade de crescimento, de você precisar ter mais produtividade, de inovação e de ser uma referência no mundo em muitas áreas, mas isso nunca se consegue com uma população doente. Por isso, a necessidade de mostrarmos o todo o potencial e a necessidade de investir em saúde”, disse a economista.
XXVI CBE: Economistas defendem novo projeto de desenvolvimento para o Brasil
Painel de debates destaca papel estratégico do Estado, reindustrialização verde e superação do neoliberalismo
O avanço da neoindustrialização no Brasil exige um Estado capaz de coordenar políticas produtivas, tecnológicas e sociais. Este foi o debate ocorrido no painel “O papel do Estado e a neoindustrialização”, realizado no XXVI Congresso Brasileiro de Economia. A discussão – que contou com a participação dos economistas Odilon Guedes e Haroldo da Silva, com moderação de Júlio Miragaya – reforçou a urgência de um novo modelo de desenvolvimento baseado em inovação, sustentabilidade e redução das desigualdades.
Odilon Guedes reforçou a relevância da intervenção do Estado na economia como ferramenta essencial para combater desigualdades e promover a justiça social no Brasil. Ele destaca que políticas públicas bem estruturadas podem mitigar disparidades econômicas e fortalecer o suporte às populações mais vulneráveis. Defende também o papel ativo do Estado na regulação econômica e no estímulo ao desenvolvimento sustentável, enfatizando que investimentos em áreas como educação, saúde e infraestrutura são fundamentais para alcançar o progresso social.
Odilon, que é especialista em História do Brasil e possui vasta experiência como professor na área, trouxe fatos sobre desenvolvimento histórico do país, explicando que compreender o papel do Estado exige conhecer a trajetória política e econômica do Brasil, além de entender como as intervenções estatais moldaram o funcionamento dos órgãos públicos e impactaram a sociedade ao longo do tempo. O presidente do Corecon-SP ressaltou a importância de analisar os desafios para encontrar um equilíbrio entre a intervenção estatal e a autonomia dos mercados, sem que haja controle total por parte do governo.
Haroldo Silva falou sobre a importância da indústria de transformação para o crescimento econômico do país, destacando que ela é fundamental para a geração de empregos e salários dignos. No entanto, segundo o especialista, o Brasil enfrenta desafios significativos, incluindo a desindustrialização, que é atribuída a um ambiente econômico que foi dominado por ideologias neoliberais, desde o início dos anos 1990; e a necessidade urgente de reposicionar sua política industrial, de forma perene. “Precisamos de uma nova abordagem que fortaleça setores estratégicos e que promova a inovação e o aumento da produtividade”, diz.
Haroldo ressaltou que, num recorte temporal, enquanto o PIB brasileiro cresceu 53,5%, entre 2003 e 2024, a indústria de transformação cresceu apenas 9,2%, evidenciando um descolamento preocupante entre esses indicadores. Para reverter essa situação, o economista apontou que existem três caminhos para a legitimação das nações líderes: um foco econômico em diversificação, um compromisso ambiental com a sustentabilidade e um fortalecimento militar para garantir a segurança geopolítica. “A vertente que mais é adequada ao Brasil é a partir do desenvolvimento industrial verde, aproveitando o potencial ecológico disponível, a partir da economia donut. É essencial romper com a ‘doxa neoliberal’ e adotar um novo mindset para a reindustrialização”.
Ele também apresentou a estratégia nacional de economia circular como uma solução para revitalizar a industrialização, promovendo a otimização de recursos e a inovação. Ele alertou para a urgência da transformação produtiva em resposta às mudanças climáticas e aos desastres ambientais recentes, especialmente num evento na Cidade de Porto Alegre, marcada pelas enchentes do ano de 2024 e que ainda está se recuperando.”
XXVI CBE: Fórum da Mulher Economista teve debates e lançamento de livro
Espaço vem se tornando tradicional nos eventos do Sistema Cofecon/Corecons. Para Tania Teixeira, presença feminina na economia é fundamental para ampliar o olhar sobre as desigualdades
Em um mundo em que as desigualdades de gênero ainda se refletem em todas as esferas da vida social e econômica, pensar o desenvolvimento sob uma ótica feminista é mais do que uma necessidade: é um passo fundamental para a construção de uma sociedade mais justa. Esse foi o ponto de partida das discussões que marcaram o Fórum da Mulher Economista e Diversidade e o lançamento do livro Economia Feminista no Brasil, realizados durante o XXVI Congresso Brasileiro de Economia (CBE), em Porto Alegre.
A programação contou com três painéis de debates que abordaram questões relevantes sobre gênero, diversidade e o papel da mulher na economia. Na abertura do Fórum, a presidenta do Conselho Federal de Economia (Cofecon), Tania Cristina Teixeira, destacou a importância de espaços que tragam à tona o papel das mulheres na formulação de políticas públicas e na produção de conhecimento econômico. “A presença das mulheres na economia é essencial para ampliar o olhar sobre as desigualdades e propor soluções que contemplem toda a sociedade. Ainda há muito a avançar, mas o caminho passa pela ocupação de espaços e pela valorização da nossa voz”, afirmou.
Tania também ressaltou o compromisso do Cofecon em fortalecer a pauta da diversidade como eixo estruturante da profissão. “O Fórum é uma oportunidade de reflexão e também de reconhecimento. Cada vez mais, precisamos pensar a economia a partir das diferentes realidades do país, valorizando a contribuição das mulheres economistas em todas as áreas — da pesquisa ao mercado de trabalho.”
Lançamento de livro
Um dos destaques da programação do Fórum foi o lançamento do livro Economia Feminista no Brasil, organizado por Marilane Oliveira Teixeira, Margarita Olivera e Clarice Menezes Vieira. O livro apresenta uma coletânea de estudos que traçam um panorama da economia feminista brasileira, explorando temas como trabalho, renda, políticas públicas, orçamento sensível a gênero e economia do cuidado.
A obra transforma a análise da desigualdade de gênero ao deslocar o foco do “mercado” para o sistema econômico como um todo, integrando aspectos como reprodução social, tempo e relações de poder. Essa perspectiva permite visibilizar o trabalho não pago — tanto doméstico quanto de cuidado — como parte fundamental da produção de riqueza, evidenciando que as desigualdades não emergem apenas no mercado de trabalho, mas são geradas previamente nas dinâmicas familiares e sociais. A divisão sexual do trabalho, que atribui funções específicas às mulheres, é um exemplo claro dessa desigualdade.
Marilane reforçou a importância de conectar teoria e prática, aproximando a reflexão acadêmica da atuação profissional das economistas. “O livro é uma forma de reconhecer o trabalho que já vem sendo feito por muitas mulheres no campo da economia e, ao mesmo tempo, de inspirar novas gerações de economistas a pensar o desenvolvimento sob uma ótica mais justa e igualitária”, afirmou.
XXVI CBE: Gênero, diversidade e desenvolvimento sustentável
Especialistas destacam a urgência de integrar justiça de gênero, cuidado e sustentabilidade ambiental nas políticas econômicas e urbanas
O conceito de desenvolvimento sustentável, formulado nos anos 1970, continua sendo um desafio para o mundo contemporâneo. Para economistas como Marilane Oliveira Teixeira e Janine Alves, repensar crescimento econômico significa ir além do PIB, incorporando a igualdade de gênero, a justiça social e a sustentabilidade ambiental. As especialistas alertam que a crise climática não é neutra e reforçam a importância de políticas públicas e planejamento urbano que reconheçam o valor do trabalho de cuidado e protejam as populações mais vulneráveis, promovendo um desenvolvimento verdadeiramente inclusivo e sustentável.
A economista Marilane Oliveira Teixeira destacou que o conceito de desenvolvimento sustentável, criado nos anos 1970, precisa ser constantemente revisitado. “Alcançar o desenvolvimento sustentável é um grande desafio. Questionar o conceito de crescimento econômico, supostamente baseado apenas na expansão do PIB, é absolutamente necessário, mas construir outra perspectiva é difícil, sobretudo dentro dos limites do capitalismo”, afirmou.
Marilane destaca que a economia feminista oferece esse novo olhar. “A formulação da economia feminista parte de uma crítica profunda ao paradigma econômico dominante, centrado no PIB e na racionalidade do mercado. Propõe redefinir o conceito de desenvolvimento incorporando igualdade de gênero, justiça social, cuidado e sustentabilidade ambiental como dimensões interdependentes”, explicou.
Ela defendeu, ainda, a sustentabilidade da vida como conceito central, reunindo a preservação dos recursos naturais e o reconhecimento do trabalho de cuidado. “Sustentabilidade não é apenas ambiental, mas também social e reprodutiva. É preciso reconhecer o trabalho de cuidado e integrá-lo às contas nacionais, criando indicadores que reflitam o bem-estar e não apenas o crescimento econômico”, afirmou.
A economista Janine Alves, vice-presidente do Corecon-SC, trouxe um alerta contundente: a crise climática amplia as desigualdades de gênero. “A crise climática não é neutra em termos de gênero. Mulheres e meninas estão entre as mais impactadas”, afirmou, trazendo dados que revelam que 80% das pessoas deslocadas por eventos climáticos são mulheres e que elas têm 14 vezes mais risco de morrer em desastres ambientais. “Durante ondas de calor, os casos de feminicídio aumentam 28%. Até o fim do século, a mudança climática poderá estar ligada a um em cada quatro casos de violência doméstica”, relatou.
Segundo Janine, 94% dos municípios brasileiros ainda não incorporam estratégias de prevenção de desastres em seus planos diretores. “Os prefeitos e vereadores precisam compreender que o planejamento urbano é uma ferramenta de justiça climática. Quem não cuida do meio ambiente não está cuidando da vida das pessoas nem do desenvolvimento econômico”, afirmou.
XXVI CBE: Violência de gênero seu impacto invisível sobre o desenvolvimento
Especialistas apontam como a violência de gênero reforça a necessidade de políticas públicas inclusivas e equitativas
O tema da violência de gênero, discutido no Fórum da Mulher Economista e Diversidade, realizado dentro do XXVI Congresso Brasileiro de Economia, surgiu como desdobramento natural das discussões sobre autonomia e sustentabilidade. A palestra “Impactos da violência de gênero na economia, alternativas e soluções” trouxe dados alarmantes e reflexões sobre como o problema repercute na produtividade, na renda e na coesão social.
A economista Isabel de Cássia Ribeiro, presidente do Corecon-BA, lembrou que o Brasil registrou quase 4 mil assassinatos de mulheres em 2023. “As mulheres continuam expostas a diferentes formas de violência – física, psicológica e sexual. O feminicídio acaba com a vida, mas há outras violências que também vão destruindo a vida das mulheres”, afirmou.
Ela destacou o entrelaçamento entre violência racial e de gênero: “Não é mimimi, é racismo estrutural. É muito triste ver que as mulheres negras são as maiores vítimas.”
Os números confirmam: entre 2013 e 2023, 47.463 mulheres foram assassinadas, e o risco de uma mulher negra ser morta é 70% maior do que o de uma mulher não negra. “A violência maior está ocorrendo dentro da residência. É triste ver que o lugar que deveria ser de segurança se tornou o mais perigoso para as mulheres”, pontuou Isabel.
A conselheira federal Ana Cláudia Arruda, presidente do Corecon-PE, complementou: “A violência está muito relacionada à pobreza. Nas regiões mais pobres, ela se torna ainda mais intensa. É o crescimento econômico, com políticas consistentes, que pode dar conta desse problema.” Ela defendeu a construção de um novo pacto social, com políticas macroeconômicas voltadas à geração de emprego e renda para as mulheres. “A pobreza é feminina. E a economia precisa dar respostas a isso”.
XXVI CBE: A economia diante da crise climática
Economistas defenderam que a transição para uma economia ecológica é urgente — e que o Brasil pode ser protagonista na construção de soluções sustentáveis e inclusivas
A crise climática deixou de ser uma ameaça distante para se tornar um dos principais vetores de transformação econômica e social do século XXI. O tema esteve no centro do painel “Meio Ambiente-Economia Ecológica”, realizado durante o XXVI Congresso Brasileiro de Economia (CBE), em Porto Alegre. O debate reuniu economistas de diferentes regiões do país: Tania Cristina Teixeira, presidenta do Cofecon; Wallace Pereira, conselheiro do Corecon-MG e professor da Universidade do Pará; Michele Lins Aracaty e Silva, presidente do Corecon AM/RR; e Marcus Eduardo de Oliveira, delegado regional do Corecon-SP — sob a mediação da conselheira federal Mônica Beraldo.
Ao abrir o painel, a presidenta Tania Teixeira contextualizou a urgência do debate ambiental e destacou o papel ativo do Cofecon, por meio da Comissão de Sustentabilidade Econômica e Ambiental. Para a economista, “durante muito tempo essa questão foi colocada como um problema a ser resolvido no futuro, mas esse futuro já chegou”. Ela lembrou que desde a ECO-92 a ciência econômica foi desafiada a incorporar limites ecológicos do crescimento, dando origem a novas abordagens como a economia ecológica, a contabilidade verde e a precificação do carbono.
Tania traçou uma linha histórica da evolução das políticas climáticas — de Kyoto a Paris — e relacionou os marcos globais aos impactos cada vez mais severos dos desastres ambientais no Brasil. Citou as enchentes em Porto Alegre e a seca recorde na Amazônia como exemplos de “um país confrontado com os extremos da crise climática”. A presidenta do Cofecon defendeu que “é preciso superar a visão de que preservar custa caro”, argumentando que a transição para energias limpas e a economia circular podem gerar empregos e aumentar a competitividade. “Temos a escolha de ficar presos ao passado lamentando, ou assumir o protagonismo e nos reinventar”, concluiu, chamando os economistas a pensar políticas públicas que integrem crédito socioambiental e cofinanciamento de iniciativas sustentáveis.
Infraestrutura e transporte como eixos da transição verde
O professor Wallace Pereira trouxe uma análise técnica sobre a relação entre emissões de gases de efeito estufa, ocupação territorial e infraestrutura. Com base em dados recentes, destacou que “a região Norte, especialmente os estados do Pará e do Mato Grosso, se destacam como os maiores emissores devido à mudança no uso da terra e da floresta”. Segundo ele, o padrão de desenvolvimento herdado do período militar — centrado na expansão rodoviária — ainda molda a estrutura produtiva e o perfil das emissões brasileiras.
Para o economista, a mudança desse paradigma é uma das maiores oportunidades para o país. “O transporte ferroviário e a cabotagem podem ser estratégicos não apenas para reduzir emissões, mas também para melhorar a produtividade e a competitividade da economia nacional”, argumentou. Wallace defendeu que a reorganização dos modais de transporte deve estar no centro de uma nova política de desenvolvimento sustentável, capaz de combinar ganhos econômicos e ambientais. Em sua visão, “infraestrutura é política ambiental e econômica ao mesmo tempo”. Ele também alertou para o desempenho negativo do Brasil nas exportações de produtos verdes, reforçando a necessidade de agregar valor à biodiversidade e promover “sofisticação produtiva com base na inteligência ecológica”.
Amazônia no centro das soluções climáticas
Representando o Corecon AM/RR, Michele Lins Aracaty e Silva trouxe a perspectiva amazônica ao debate, destacando que “as mudanças climáticas já fazem parte da nossa realidade” e atingem de forma mais dura as populações vulneráveis. Relatando sua experiência direta na região, ela lembrou que “a Amazônia ficou sem água nos últimos dois anos, algo que parecia impensável”. A economista enfatizou que a crise climática agrava desigualdades e exige políticas que aliem mitigação e justiça social.
Michele defendeu que o Brasil precisa ser visto “não como um problema, mas como celeiro de soluções”. Para ela, as oportunidades estão na bioeconomia, nas energias renováveis e na geração de empregos verdes. A economista destacou ainda a importância de fortalecer o financiamento climático e criar infraestrutura mais resiliente, especialmente nas cidades amazônicas. Com a COP30 marcada para novembro de 2025, em Belém, Michele vê uma chance histórica de o país liderar uma agenda global de justiça climática. “O Brasil tem a chance de mostrar ao mundo que é possível crescer preservando”, concluiu.
Repensar a economia para preservar a vida
Encerrando o painel, o economista Marcus Eduardo de Oliveira reforçou a dimensão ética e civilizatória do desafio ambiental. Ele destacou que o modelo econômico atual está em desequilíbrio com os limites planetários e precisa ser repensado. “A economia não é uma ciência do lucro, é uma ciência da sobrevivência”, afirmou. Segundo ele, é fundamental compreender que a sustentabilidade não é apenas uma variável, mas o próprio eixo de sustentação da vida econômica.
Marcus defendeu uma “nova racionalidade econômica”, na qual o progresso seja medido não pelo PIB, mas pelo bem-estar e pela preservação ambiental. “O planeta não precisa de mais crescimento; precisa de regeneração”, disse. Ele propôs que a economia ecológica sirva de base para uma mudança estrutural no modo de produzir e consumir, integrando valores humanos e ambientais às decisões macroeconômicas. “Quando o meio ambiente entra em colapso, a economia também entra”, alertou.
XXVI CBE: Agricultura familiar ganha protagonismo em debate sobre o futuro produtivo e sustentável do campo brasileiro
Economistas destacaram a necessidade de fortalecer a agricultura familiar com políticas públicas, assistência técnica e educação, para impulsionar a produtividade
Mais de 70% dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros vêm da agricultura familiar. Por isso, o setor tem papel estratégico não apenas na segurança alimentar, mas também na sustentabilidade e no desenvolvimento regional. No entanto, os desafios para consolidar esse potencial — como acesso a crédito, assistência técnica e educação — ainda são grandes. O tema esteve no centro do painel “Agronegócio e Agricultura Familiar”, realizado durante o XXVI Congresso Brasileiro de Economia (CBE), em Porto Alegre, e reuniu os economistas Alexandre Sampaio Ferraz, assistente técnico do DIEESE, e Rogério Antônio Mauro, professor do Instituto Federal Goiano. A mediação foi da economista Mirsa Maria Nardi.
O debate expôs contradições, avanços e perspectivas de dois modelos que coexistem no campo brasileiro: o agronegócio empresarial, intensivo em capital, tecnologia e exportações, e a agricultura familiar, intensiva em trabalho e essencial para o abastecimento interno.
Desconstruindo mitos sobre produtividade e papel econômico
Ferraz propôs rever o discurso dominante sobre o peso do agronegócio na economia. “A gente tem ouvido sempre que o agronegócio carrega o Brasil, que é o motor da economia brasileira. E eu acho que isso daí não é verdade”, afirmou. Ele lembrou que o setor agropecuário representa cerca de 6,5% do PIB nacional, percentual relevante, mas distante da importância dos setores de serviços e indústria, que seguem sendo os principais motores da economia.
Segundo Ferraz, o destaque do agronegócio está nas suas sinergias com a indústria, especialmente a de alimentos e bebidas, que responde por cerca de um quinto da produção industrial brasileira. “É essa interface entre agropecuária e indústria que confere relevância econômica ao setor”, observou.
Mas foi ao tratar da produtividade que o economista provocou maior reflexão. “Sempre se imaginou que o grande agronegócio era o setor produtivo e desenvolvido, e a agricultura familiar o lado atrasado. Isso não é completamente verdade”, destacou, com base em dados do Censo Agropecuário 2017. Segundo ele, o valor bruto da produção por hectare da agricultura familiar tipo A (Pronaf-V) chega a R$ 2,6 mil, quase o dobro da produtividade do grande agronegócio, que é de R$ 1,5 mil por hectare.
Ferraz apontou a educação e a assistência técnica como gargalos estruturais para a modernização da agricultura familiar. “Só 18% dos estabelecimentos familiares têm acesso à orientação técnica. É um fracasso nacional”, afirmou. Ele destacou que, sem assistência técnica, muitos produtores ficam excluídos de políticas públicas, como o Pronaf, que exige planos de manejo e acompanhamento técnico para liberação de crédito.
Ferraz defendeu ambição maior nas políticas agrícolas e maior foco em sustentabilidade e mecanização. “A nova política industrial fala em mecanizar 80% da agricultura familiar. Hoje, não temos nem 10% mecanizados. É um potencial gigantesco de aumento de produtividade”, avaliou.
Dois modelos, um mesmo desafio: sustentabilidade
O professor Rogério Antônio Mauro começou sua exposição reconhecendo que há dois modelos agrícolas coexistindo no país, inclusive com dois ministérios distintos: o MAPA, voltado à agricultura empresarial, e o MDA, responsável pela agricultura familiar. Os dados apresentados por Mauro mostram a assimetria estrutural entre os modelos. Apenas 23% dos estabelecimentos rurais pertencem ao agronegócio, mas concentram 77% das terras agrícolas. Já a agricultura familiar representa 77% dos estabelecimentos, mas ocupa apenas 23% da área rural.
Além da concentração fundiária, há forte desigualdade tecnológica e de renda. “Temos uma das maiores concentrações de terra do mundo. Cerca de 1,4% dos imóveis rurais, com mais de mil hectares, concentram 61% do território rural”, destacou Mauro. Ele lembrou que a renda gerada pelo agronegócio tende a se concentrar em polos urbanos e fora do país, enquanto a da agricultura familiar circula localmente, estimulando o desenvolvimento regional.
Mauro enfatizou o papel estratégico da agricultura familiar na geração de emprego, renda e na produção de alimentos saudáveis e diversificados. “Mais de 10 milhões de pessoas no campo têm na agricultura familiar sua principal ocupação”, comentou. Ele também destacou o papel das políticas públicas e do Cadastro Nacional da Agricultura Familiar (CAF), que substituiu a antiga DAP e garante o acesso a programas como o Pronaf, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) — agora com 45% das compras obrigatórias da agricultura familiar.
Mauro apresentou um panorama da rota de inclusão produtiva que vem sendo construída: da documentação de trabalhadores rurais, em especial mulheres, à regularização fundiária e à agregação de valor por meio do cooperativismo. “Política pública para a agricultura familiar faz diferença e é extremamente importante. A turma do Estado mínimo vai chiar, mas sem essas políticas não há inclusão nem desenvolvimento rural”, afirmou.
XXVI CBE: Por que economia solidária? E para que economistas?
Painel com participação de Tania Cristina Teixeira, Marcio Pochmann e Renato Dagnino destaca economia solidária como resposta estrutural à desigualdade, ao desemprego e à crise ambiental
O último dia de debates do XXVI Congresso Brasileiro de Economia foi batizado de CBE Student Day, pela maior participação de estudantes no evento, e o primeiro painel do dia teve como tema a economia solidária: ela deixou de ser um tema periférico para ocupar espaço estratégico no debate público brasileiro. Os debatedores foram a presidenta do Cofecon, Tania Cristina Teixeira; o presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Marcio Pochmann; e o professor Renato Dagnino, da Universidade Estadual de Campinas. Eles analisaram o avanço das experiências solidárias no país e defenderam sua construção como um novo paradigma econômico, capaz de integrar justiça social, trabalho digno, sustentabilidade e democracia econômica.
A presidenta do Cofecon destacou que a economia solidária emerge como resposta aos limites do modelo econômico dominante. Para ela, trata-se de um novo modo de organizar a economia com as pessoas no centro. “Quando perguntamos por que economia solidária, estamos perguntando por que um novo paradigma econômico se faz necessário. O modelo centrado no lucro, na competição e na financeirização tem produzido fome, desigualdade, exclusão e devastação ambiental. É preciso construir alternativas viáveis e humanas”, afirmou. Tania lembrou ainda que a economia solidária floresceu historicamente nos espaços de marginalização criados pelo capitalismo. “Ela valoriza cooperação, autogestão, saber local e cuidado com pessoas e territórios. Ela devolve o trabalho ao seu sentido de dignidade e criatividade — não como alienação ou mera busca por renda, mas como espaço de autonomia e bem viver”.
Tania também reforçou o compromisso do Cofecon com o tema. “Temos a responsabilidade de fortalecer esse campo de atuação profissional. A Comissão de Responsabilidade Social e Economia Solidária tem avançado, e o Prêmio Paul Singer, que chega à sua quarta edição, é um marco nacional de reconhecimento a experiências transformadoras. Meu convite é que economistas se comprometam com a construção de um país mais justo. Que transformemos conhecimento em ação e ação em mudança real”.
Em sua intervenção, Marcio Pochmann destacou que a ascensão da economia solidária está diretamente ligada à transformação do mundo do trabalho e ao esgotamento do capitalismo como projeto civilizatório. “Desde a década de 1980 vivemos uma crise permanente do emprego. Hoje, menos da metade da população ocupada está em atividades tipicamente capitalistas. Entre 70 e 80 milhões de brasileiros estão sobrando ao projeto econômico atual — uma massa de trabalhadores empurrada para a sobrevivência, sem direitos e sem perspectivas”, afirmou. Para ele, o país vive uma ruptura histórica: “O projeto de sociedade salarial, que estruturou o Brasil industrial, se esgotou. O que está emergindo é outra realidade — fragmentada, desigual e perigosa, dominada pelo avanço do rentismo, do crime organizado e do fanatismo religioso”.
Para Pochmann, a economia solidária oferece um caminho estratégico para reconstruir um projeto nacional. “Ela não pode ser tratada como política compensatória. É um ensaio real de futuro. Trabalha com crédito social, novas formas de moeda, cooperação produtiva e tecnologias sociais. Enquanto as instituições atuais operam sobre as consequências, a economia solidária atua sobre as causas”. Ele concluiu com uma provocação: “Precisamos de políticas públicas preditivas e um novo sistema estatístico que enxergue a realidade do trabalho popular. Sem isso, vamos continuar tentando medir o futuro com instrumentos do passado”.
Renato Dagnino trouxe uma reflexão crítica sobre o papel da economia solidária no contexto de colapso socioambiental. “O capitalismo tenta resolver sua crise histórica com guerras e concentração de renda, mas não sabe enfrentar a crise ambiental. Suas alternativas são ineficazes e perigosas para a sobrevivência humana”, afirmou. Ele defendeu a centralidade da propriedade coletiva e da autogestão. “Não existe solidariedade sem confiança e não existe confiança sem democratizar o poder econômico. A economia solidária não se opõe apenas à desigualdade; ela enfrenta a lógica da tecnociência capitalista que transforma pessoas em meios de produção.”
Dagnino também criticou a baixa prioridade dada à economia solidária no orçamento público. “A classe proprietária recebe 8% do PIB em juros da dívida, 5% em renúncia fiscal e 15% via compras governamentais. As redes solidárias recebem apenas 0,02% em compras públicas — justamente a política mais eficiente para desenvolver esse setor.” Para ele, os economistas devem ter protagonismo no tema: “Para que servem os economistas, afinal? Para ampliar a compreensão do futuro e ajudar a construir um novo projeto de país. A economia solidária é hoje a única alternativa capaz de sustentar a vida com justiça social e equilíbrio ecológico.”
XXVI CBE: Economia gaúcha em debate
Painel discute impactos das políticas comerciais americanas sobre a indústria do Rio Grande do Sul e os desafios da sustentabilidade fiscal no país
O último dia do XXVI Congresso Brasileiro de Economia teve um painel de debates sobre a economia gaúcha. Participaram da discussão os economistas Antonio da Luz, economista-chefe da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul); Patrícia Palermo, economista-chefe do sistema Fecomercio/RS; e Giovanni Baggio, economista-chefe da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs). O painel foi mediado pela jornalista Marta Sfredo, colunista de economia do jornal Zero Hora.
Impactos do tarifaço
O anúncio de tarifas pelo governo americano gerou incertezas para a indústria gaúcha, já afetada por desafios internos e conjuntura econômica nacional. Os especialistas avaliaram o impacto sobre exportações, empregos e competitividade, destacando também oportunidades e estratégias de adaptação.
“A gente tem acompanhado com muita preocupação. Nossa indústria vem sofrendo há muitos anos. Quando comparamos com a brasileira e a do mundo, não conseguimos avançar. Cerca de 99% do que o Rio Grande do Sul envia para os EUA são produtos industriais. Em agosto, nossas exportações caíram 19% em relação ao ano passado, e em setembro já apontam queda de 51%. Os impactos no emprego começam a surgir, mas acredito que este diálogo recente entre os presidentes Lula e Trump traz alguma esperança, porque as empresas estão muito preocupadas”, afirmou Giovanni Baggio.
“Estas tarifas não fazem sentido nem do ponto de vista americano. Não é possível atender uma reindustrialização deste jeito. Países que competem com os EUA tendem a obter alguma vantagem, e o Brasil enfrenta dificuldade para acessar o mercado americano. A China, que compra tanto do Brasil quanto dos EUA, tem aumentado compras do Brasil e reduzido dos EUA — uma vantagem temporária, que não se sustenta a longo prazo. Eu preferia que as coisas funcionassem como devem”, destacou Antonio da Luz.
“O Rio Grande do Sul, no pós-enchente, recebeu injeções de recursos para retomar o consumo, o comércio cresceu mais de 7% e agora enfrentamos a desaceleração”, comentou Patrícia Palermo. “Somos o estado mais envelhecido do país e temos desafios pela frente. Saímos da enchente bastante fortalecidos como sociedade, mas com muitas contas para pagar. O endividamento das empresas afetadas aumentou muito, num momento em que as dívidas decorrentes da pandemia ainda não estavam pagas. Com a população envelhecida e o colapso das finanças públicas, nós temos um problema sério, e quem paga essa conta é a geração que entra no mercado de trabalho agora”.
Questão fiscal: sustentabilidade e desafios
A situação fiscal do país e do Rio Grande do Sul também foi tema central do painel. Os debatedores analisaram o novo arcabouço fiscal, a elevação de despesas obrigatórias e o impacto da dívida pública, destacando a necessidade de políticas de longo prazo e ajustes responsáveis.
“O crescimento das despesas obrigatórias consome cada vez mais o orçamento. Cada real de aumento do salário mínimo acima da inflação gera R$ 400 milhões adicionais de gastos. A carga tributária já é elevada, e a sociedade não suporta mais aumentos”, mencionou Baggio. “O governo corre atrás de recursos, mas existem gastos que são obrigatórios. As despesas discricionárias diminuem com o tempo, mas saúde e educação são um desafio permanente”, explicou.
“O Brasil gasta R$ 2,4 trilhões em despesas primárias, com orçamento equivalente à fatura da dívida, sem economizar para pagar juros. Girar mais de R$ 4 trilhões a cada três anos é insustentável. Estamos pagando cerca de R$ 950 bilhões por ano em juros; se apenas R$ 400 bilhões fossem investidos, o efeito sobre o crescimento seria significativo. A insustentabilidade já não é de longo prazo, é de médio prazo, e o próximo governo terá que enfrentá-la, seja pelo amor ou pela dor”, alertou Antonio da Luz.
“O arcabouço fiscal atual não alinha regras e metas com objetivos reais. Medidas populistas, como isenções irresponsáveis, beneficiam no curto prazo, mas cobram um preço altíssimo no médio e longo prazo”, analisou Patrícia Palermo. “Fazer ajuste fiscal não é fácil nem indolor, mas é necessário. Quem não entende isso verá consequências diretas, como falta de serviços básicos em universidades e setores públicos essenciais”, concluiu.
XXVI CBE: Inovação e oportunidades para economistas no agronegócio
Painel debateu a evolução do setor privado no Rio Grande do Sul e as perspectivas de mercado para o agronegócio
O agronegócio no Rio Grande do Sul se destaca como um dos pilares da economia regional e nacional, resultado de décadas de inovação, tecnologia e empreendedorismo. O painel sobre economia do setor privado, realizado no XXVI Congresso Brasileiro de Economia, recebeu os especialistas Frederico Logemann e Luiz Augusto Dumoncel, que falaram sobre as empresas em que trabalham – a SLC Agrícola e a 3 Tentos, respectivamente. Eles mostraram como a combinação de gestão eficiente, conectividade e sustentabilidade vem moldando o setor, criando oportunidades não apenas para produtores rurais, mas também para profissionais de economia e áreas correlatas.
Frederico contou um pouco da história da empresa, da origem ao momento atual: “A história da SLC começou em 1945, em Horizontina, e ao longo dos anos crescemos em escala e tecnologia. Hoje, estamos em oito estados do cerrado brasileiro, com 26 fazendas, 834 mil hectares na safra 25/26 e cerca de 5 mil colaboradores, entre eles economistas. Nosso objetivo sempre foi impactar positivamente gerações futuras e contribuir para o desenvolvimento sustentável do agronegócio”.
Sobre o momento contemporâneo, a inovação tem desempenhado um papel fundamental na agricultura. “Não há como falar de agricultura e inovação sem conectividade. Digitalizamos nossas lavouras com sensores e telemetria de máquinas, utilizamos robôs Leopard e aviões autônomos para monitoramento. Esses recursos reduzem custos, aumentam a precisão na aplicação de insumos e melhoram a produtividade. A tecnologia transforma não apenas a produção, mas toda a experiência do trabalho no campo”, destacou.
De forma semelhante, Luiz Augusto também contou a história da empresa em que trabalha –também iniciada no Rio Grande do Sul. “Nosso foco tem sido promover a evolução do campo junto ao produtor, colaboradores e sociedade. Hoje atuamos em grãos, insumos e indústria — incluindo biodiesel, farelo de soja, etanol e DDGS. Com a Lei do Combustível do Futuro, que aumenta a mistura de etanol e biodiesel, vemos novas oportunidades de expansão e inovação”, explicou.
Falando aos estudantes presentes ao evento, Dumoncel destacou que há espaço para economistas no agronegócio. “Nossa empresa já conta com profissionais da área, que aplicam análise de dados e visão generalista para diversas operações, desde mercado de insumos até cadeias de produção industrial. A atuação desses profissionais vem se tornando cada vez mais estratégica à medida que o setor se sofisticar”, concluiu.
XXVI CBE: Fórum sobre Perspectivas do Desenvolvimento Regional Brasileiro
Seis palestrantes discutiram o papel das instituições de financiamento nas políticas de desenvolvimento praticadas no Brasil e no exterior
O desenvolvimento regional brasileiro exige articulação entre políticas públicas, bancos de desenvolvimento e iniciativas privadas, buscando equilibrar crescimento econômico, inclusão social e sustentabilidade. Estas e outras conclusões foram apresentadas no Fórum sobre Perspectivas do Desenvolvimento Regional Brasileiro, realizado durante o XXVI Congresso Brasileiro de Economia, com participação de seis especialistas que apresentaram experiências práticas, dados estratégicos e lições nacionais e internacionais para fortalecer regiões com diferentes desafios socioeconômicos.
Banrisul: apoiando o Rio Grande do Sul durante as inundações
Durante um dos momentos mais críticos enfrentados pelo Banrisul, a sede do banco ficou com dois metros de água na entrada, colocando em risco não apenas a operação do banco, mas também o atendimento aos clientes. “Além de resolver os próprios problemas, porque o Banco estava afetado, precisávamos ajudar mais rapidamente a economia do estado. Tínhamos inaugurado um data center, e era fundamental que ele assumisse totalmente nossas operações em tempo recorde”, explicou Irany de Oliveira Sant’Anna Júnior. Com agilidade, a equipe conseguiu transferir as funções críticas para o data center 2, garantindo que todas as operações continuassem sem sobressaltos, mesmo em meio à crise.
O executivo destacou que o impacto sobre clientes e colaboradores exigiu uma ação ampla e rápida. “Naquele momento, muitas pequenas e médias empresas tinham suas atividades paradas, e pessoas físicas também precisavam de apoio. Concedemos mais de 4,8 bilhões em prorrogações de crédito, 7 bilhões em capital de giro, e 3,4 bilhões no Pronampe Solidário. Além disso, substituímos gratuitamente maquininhas danificadas, criamos linhas especiais para prefeituras e hospitais, e destinamos recursos para o agronegócio e projetos culturais”, relatou Irany, ressaltando que o esforço foi determinante para manter 100% das operações do banco em funcionamento durante a emergência.
BRDE: buscando fundos para desenvolver o sul do Brasil
O Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE), segundo maior banco de desenvolvimento do país, desempenha um papel estratégico no apoio a projetos que transformam vidas e fortalecem a economia regional. “Nossa missão é apoiar quem produz e transformar vidas. O BRDE financia desde a construção de uma nova fábrica até a infraestrutura urbana, passando por hotéis e empreendimentos que agregam valor aos negócios. Virtualmente, tudo o que seja investimento com potencial de impacto positivo nós podemos apoiar”, comentou Leonardo Busatto, destacando que a instituição atua tanto de forma direta, com recursos próprios e funding nacional, quanto de forma indireta, por meio de cooperativas e redes conveniadas, totalizando 512 colaboradores engajados no processo.
O executivo ressaltou a relevância social e econômica do banco. “Para cada R$ 1 liberado pelo BRDE, gera-se R$ 1,20 de valor adicional, incluindo salários, ICMS e outros impactos econômicos. Além disso, nossas operações contribuem diretamente para a geração de empregos — a cada R$ 1 milhão liberado, são 15,9 empregos criados. Atuamos também com foco nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável: 82% das nossas operações têm alinhamento com pelo menos um ODS, e destinamos recursos significativos a projetos de resiliência climática, como o Programa Sul Resiliente em parceria com o Banco Mundial, e à promoção de uma visão regional sustentável para 2040”, afirmou Busatto, reforçando que o legado do BRDE para a sociedade vai muito além do crédito, atuando na construção de cidades resilientes e no fortalecimento das cadeias produtivas.
Instrumentos de desenvolvimento da Amazônia
A Amazônia Legal, rica em biodiversidade e recursos naturais, representa um enorme desafio para o desenvolvimento sustentável do país. “A região ocupa 58,9% do território nacional, abriga 772 municípios, 13% da população do Brasil e responde por 9,5% do PIB nacional. No entanto, a desigualdade é evidente: dois municípios estão entre os 100 melhores IDHs do país, enquanto 58 estão entre os 100 piores. Roraima, Amapá e Acre contribuem com apenas 0,2% do PIB cada, e o Pará com 2,3%”, contou Kleber Mourão, presidente do Corecon-PA/AP, destacando que o Amazonas, com 70% de seu território preservado e economia concentrada no Polo Industrial de Manaus, é um exemplo do potencial econômico ainda não plenamente aproveitado.
Para Mourão, políticas públicas e instrumentos financeiros são essenciais para viabilizar o desenvolvimento regional. “O governo federal estruturou a PNDR com três instrumentos principais: fundos constitucionais para financiar quase todo tipo de atividade econômica, incentivos fiscais para atrair indústrias e fundos de desenvolvimento. Por exemplo, para cada R$ 1 aplicado pelo Fundo de Desenvolvimento da Amazônia, outros R$ 4 são investidos na região. É graças a esses mecanismos que a Amazônia está hoje interligada no sistema de energia elétrica. Precisamos fortalecer instituições, garantir segurança jurídica, verticalizar a indústria e gerar valor sem destruir o meio ambiente, encontrando alternativas de compensação monetária para a preservação da floresta”, observou, ressaltando a importância de equilibrar desenvolvimento econômico e conservação ambiental.
Sudene, BNB e o desenvolvimento do Nordeste brasileiro
O Nordeste brasileiro, apesar de sua riqueza cultural e potencial econômico, ainda enfrenta desafios significativos em termos de desenvolvimento regional. “Atuamos em nove estados no Nordeste, além do norte de Minas Gerais e do Espírito Santo, abrangendo mais de 59 milhões de habitantes e 13% do PIB nacional. Nosso trabalho envolve planejamento territorial, fomento ao setor produtivo e articulação com entes nacionais e subnacionais, sempre seguindo a perspectiva de Celso Furtado de gerar transformação regional”, explicou o presidente do Corecon-CE, José Wandemberg Almeida, destacando a importância da interiorização da economia nordestina e da descentralização do desenvolvimento para reduzir desigualdades e impulsionar a geração de renda.
Para Wandemberg, políticas públicas, fundos e incentivos fiscais são essenciais para potencializar a economia local. “O Banco do Nordeste é o maior banco da América Latina em microcrédito, com programas como Crediamigo e Agroamigo, transformando a realidade do pequeno empreendedor. Criamos também o FNE Mulher, para apoiar mulheres empreendedoras, e o FDNE, focado em infraestrutura para atrair empresas e gerar emprego. Além disso, incentivamos energia solar e eólica, bioeconomia e indústrias estratégicas. Nosso objetivo é reduzir desigualdades, fortalecer a indústria local e estimular inovação com sustentabilidade. O recurso aplicado está gerando emprego, renda e aumentando a capacidade de investimento da região”, afirmou, reforçando o compromisso com um crescimento equilibrado e responsável.
BNDES: rapidez no enfrentamento aos eventos climáticos
O BNDES tem tido uma atuação importante frente aos desafios climáticos e às emergências regionais, mostrando que a presença do banco vai além do financiamento tradicional. “Durante a pandemia de Covid-19 em 2020 e as inundações de 2023/24, tivemos que agir rapidamente para apoiar empresas e municípios. Em situações de emergência, o crédito precisa sair de forma ágil, e nem sempre havia linhas perenes previamente estruturadas, como foi o caso no Rio Grande do Sul”, explicou Fernanda Silveira, gerente do Departamento de Eventos Extremos da instituição, destacando a importância de programas emergenciais e preventivos para manter a economia e a infraestrutura resilientes.
Para a economista, a estratégia do banco combina monitoramento, prevenção e reconstrução. “Trabalhamos ações preventivas, emergenciais e de reconstrução, monitorando diariamente os eventos extremos no Brasil. Hoje, com o BNDES automático emergencial, o Programa de Liquidação de Dívidas Rurais e soluções financeiras para empresas em dificuldade, conseguimos dar fôlego a quem precisa. Também desenvolvemos o Programa BNDES Cidades Resilientes, que apoia municípios na implementação de soluções climáticas, e o BNDES Periferias, promovendo inclusão produtiva em favelas e periferias. Nosso objetivo é fortalecer a resiliência e garantir que a economia esteja preparada para enfrentar desastres naturais”, pontuoui.
Lições da China
Elias Jabbour provoca uma reflexão sobre os limites das teorias econômicas tradicionais ao analisar o fenômeno de desenvolvimento da China. “Uma pergunta que surge diante de alguns fenômenos: como os chineses conseguiram construir em 15 anos 45 mil km de trens de alta velocidade e urbanizar 200 milhões de pessoas em apenas uma década, oferecendo saúde, educação, emprego e moradia para todos? Esse é o principal paradigma teórico que precisamos compreender. As leis ortodoxas não explicam, e é preciso estudar os canais financeiros, o investimento público e a estratégia estatal para entender o crescimento extraordinário do país”, disse. Para ele, o exemplo chinês desafia o pensamento econômico clássico, mostrando que o investimento massivo e coordenado do Estado é capaz de gerar renda e desenvolvimento de forma acelerada.
Jabbour enfatiza que o papel do setor público é decisivo para viabilizar o desenvolvimento sustentável e inclusivo. “Quem abre caminho para o desenvolvimento não é o setor privado, mas o setor público. Na China, o capital está subordinado ao poder público, há 96 grandes conglomerados estatais em setores estratégicos, bancos públicos que criam moeda fiduciária, e cada capital de província tem seu próprio banco. É uma economia socialista organizada para servir à sociedade. O Brasil precisa se organizar enquanto projeto nacional de desenvolvimento. Temos poucos anos para agir, e o papel dos economistas é gigantesco nesse esforço. Precisamos aprender com exemplos concretos e adaptar políticas para reduzir desigualdades e acelerar o crescimento”, recomendou.
O olhar da análise Econômica do Direito em debate no XXVI CBE
Painel destacou como a integração entre Direito e Economia pode aprimorar políticas públicas e tornar o sistema judicial mais eficiente
O diálogo entre Direito e Economia ganhou espaço no XXVI Congresso Brasileiro de Economia (CBE), durante o painel “Análise Econômica do Direito”. O tema, que une duas áreas tradicionalmente tratadas de forma separada, foi debatido pelos economistas Luciana Yeung, Guilherme Resende Mendes e Pery Shikida. A mediação foi do conselheiro federal Pedro Afonso Gomes. Os especialistas mostraram como a abordagem econômica pode contribuir para decisões jurídicas mais racionais e políticas públicas mais eficazes.
A professora do Insper Luciana Yeung, iniciou a discussão explicando o conceito que fundamenta a Análise Econômica do Direito (AED). Segundo ela, trata-se de um campo interdisciplinar que busca compreender os efeitos econômicos das normas jurídicas, identificando incentivos, custos e consequências práticas das decisões. “Quando o Direito é visto apenas sob a ótica normativa, perde-se a noção de eficiência e de impacto social. A Análise Econômica do Direito nos permite avaliar se as regras realmente produzem bem-estar e reduzem desigualdades”, afirmou.
Luciana destacou que o método, embora tenha origem nos Estados Unidos, vem se consolidando no Brasil como uma ferramenta de apoio à formulação de políticas públicas. “O objetivo não é transformar o Direito em uma ciência exata, mas trazer racionalidade à tomada de decisão. Isso ajuda o Estado a desenhar leis e políticas que gerem resultados mais próximos do interesse público”, completou.
Em seguida, o economista Guilherme Resende Mendes, do Supremo Tribunal Federal, aprofundou o debate sobre a aplicação prática da AED, citando exemplos de como a análise empírica de dados pode apoiar o processo decisório. “A economia oferece instrumentos para medir impactos, testar hipóteses e prever resultados de políticas. Essa abordagem é essencial para avaliar, por exemplo, a eficiência de programas de transferência de renda, políticas de crédito ou reformas tributárias”, afirmou. Para ele, a aproximação entre economistas e juristas é fundamental para que as leis deixem de ser reativas e passem a ser planejadas com base em evidências.
Mendes também ressaltou a importância da avaliação de impacto regulatório, um campo onde a AED tem contribuído significativamente. “Toda intervenção estatal tem um custo. Se não medirmos esse custo e o benefício gerado, corremos o risco de criar regras que travam o desenvolvimento em vez de estimulá-lo”, alertou.
Encerrando o painel, o professor Pery Shikida, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), trouxe uma reflexão sobre o papel do economista na construção de um sistema jurídico mais eficiente. Para ele, a Análise Econômica do Direito é uma ponte necessária entre teoria e prática. “A economia mostra que recursos são escassos, e o Direito define como esses recursos serão distribuídos. Quando as duas áreas dialogam, há mais chances de alcançar justiça distributiva e eficiência alocativa”, disse.
Shikida também destacou o desafio de incorporar a AED ao ensino superior e à formação de novos economistas e juristas. “É preciso formar profissionais capazes de pensar o impacto das leis no comportamento das pessoas e nas decisões econômicas. Essa integração é essencial para o avanço institucional do país”, concluiu.
O painel reafirmou a relevância da Análise Econômica do Direito como um instrumento para compreender e aprimorar as interações entre o sistema legal e a economia real. Ao trazer evidências e racionalidade às decisões públicas, a AED se mostra uma aliada indispensável na construção de políticas mais eficientes, justas e sustentáveis.
XXVI CBE: Maurício Martinho Lino Junior é o campeão da XIV Gincana Nacional de Economia
O estudante goiano Maurício Martinho Lino Junior é o grande campeão da XIV Gincana Nacional de Economia. O evento, que distribuiu R$ 10 mil em prêmios, foi realizado em Porto Alegre nos dias 07 e 08 de outubro, durante o XXVI Congresso Brasileiro de Economia, e reuniu cerca de 80 estudantes de diversos estados do Brasil.
A Gincana, promovida pelo Sistema Cofecon/Corecons desde 2011, tem como objetivo estimular, por meio de um jogo virtual, o aprendizado e a interação entre estudantes de Ciências Econômicas. Os prêmios são de R$ 4 mil para a dupla vencedora, R$ 3 mil para a segunda colocada, R$ 2 mil para a terceira e R$ 1 mil para a quarta.
Abertura
A abertura do evento contou com a presença de Denise Kassama, conselheira do Cofecon e coordenadora nacional da Gincana; Carlos Eduardo de Oliveira Jr., conselheiro do Corecon-SP, presidente do Sindicato dos Economistas de São Paulo (Sindecon-SP) e membro da comissão organizadora da Gincana; e Angélica Angélica Massuquetti, vice-presidente do Corecon-RS.
Kassama destacou a importância da participação dos alunos: “Vocês já são vitoriosos por estarem aqui. Superaram desafios como dedicação, estudo, distância e tempo para chegar até esta etapa”. Carlos Eduardo, por sua vez, também expressou seu entusiasmo, afirmando que tem um carinho especial pela Gincana: “Vocês são o futuro da nossa geração de economistas”, afirmou o economista.
Já Angélica Massuquetti, emocionada, ressaltou a honra de receber o evento na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, onde se formou há 30 anos: “É um momento especial para mim, especialmente no ano em que a faculdade completa 80 anos. Olhando para vocês, lembro-me de quando eu era aluna. Em breve, vocês estarão aqui organizando eventos como este”.
Finalistas
Após competirem entre si, quatro duplas foram classificadas para a final, na tarde do dia 08: Lucas Gloria Lopes e Tarcisio Iago Silva Nunes, da Universidade Federal de Tocantins; Breno Liebbmann Vervloet e Henrique dos Anjos Moura, da Universidade Federal do Espírito Santo; Danilo Ponciano dos Santos e Lucas da Silva Duda, da Universidade Federal do Rio de Janeiro; e Mauricio Martinho Lino Junior, da Universidade Estadual de Goiás.
Mauricio teve que competir sozinho – seu companheiro de dupla, Bruno Spies, não conseguiu viajar para Porto Alegre por motivo de saúde. “Foi um pouco assustador. Por mais que uma pessoa tenha conhecimento, é muito importante ter uma dupla. Às vezes você está cansado e a outra pessoa te apoia. Ao competir sozinho, você está só com seus pensamentos e ansiedades misturados”, contou o competidor.
A dupla tocantinense obteve o quarto lugar, recebendo o prêmio de R$ 1 mil. O terceiro lugar ficou com Breno e Henrique – o primeiro tem um histórico de boas participações na Gincana, tendo sido campeão da edição de 2023 fazendo dupla com outro colega. Eles dividiram o prêmio de R$ 2 mil. O segundo lugar ficou com a dupla da UFRJ – mesma instituição que havia vencido a edição anterior do evento, mas com outros estudantes. Danilo e Lucas dividiram R$ 3 mil.
O campeão deste ano foi Mauricio Martinho Lino Junior – que já havia conseguido o segundo lugar no ano passado. “Chegar ao final e ver que consegui tira um peso, por ter acabado a competição. É muita ansiedade”, comentou o estudante, que ganhou o prêmio de R$ 4 mil. Ao ser chamado para receber o prêmio, os demais competidores se levantaram aos gritos de “Mauricio, Mauricio” – o que só demonstra o carinho e reconhecimento que ele conquistou ao longo da competição. Esta também foi sua última participação na Gincana: “Estou me formando no fim do ano. Fechei com chave de ouro”, comemorou.
Alguns levam para casa um prêmio por seu desempenho. Mas todos levam memórias e histórias que ficarão para sempre guardadas, amizades que nasceram da competição, aprendizados que vão além das salas de aula e gestos de companheirismo que revelam a grandeza do evento. Uma celebração do esforço e da jornada de cada um, e que faz com que esta história valha a pena ser vivida todos os anos.
XXVI CBE: Pressões enfrentadas pela Previdência Social
Em painel sobre Previdência Social, economistas apontaram caminhos para o fortalecimento do sistema
Em meio a um cenário de envelhecimento populacional e mudanças no mercado de trabalho, a Previdência Social voltou ao centro das discussões econômicas no XXVI Congresso Brasileiro de Economia (CBE), realizado em Porto Alegre. O painel “Previdência Social” reuniu os economistas Luis Adelar Ferreira e Isabel Ribeiro, sob a mediação do conselheiro federal Paulo Polli, para discutir o equilíbrio fiscal, a sustentabilidade do regime previdenciário e o papel das reformas estruturais na economia brasileira.
Os especialistas apontaram que o sistema previdenciário, em sua configuração atual, enfrenta pressões crescentes de natureza demográfica e financeira. O envelhecimento da população, a queda na taxa de natalidade e a informalidade do trabalho impactam diretamente a capacidade de arrecadação, exigindo soluções que aliem sustentabilidade e equidade social.
O desafio demográfico e fiscal da Previdência
O economista Luis Adelar Ferreira apresentou uma análise abrangente sobre a relação entre a Previdência Social e a economia brasileira, destacando o desequilíbrio crescente entre o número de contribuintes e de beneficiários. “Estamos diante de um desafio demográfico e fiscal que é global. A expectativa de vida aumentou e a base de jovens contribuintes diminuiu. O sistema, que deveria ser alimentado por quem trabalha hoje, está sob pressão porque cada vez menos jovens têm carteira assinada e contribuem com a Previdência”, explicou.
Ferreira ressaltou que o problema não é exclusivo do Brasil, mas uma tendência mundial. Países europeus já revisam suas estruturas previdenciárias para lidar com o envelhecimento populacional e a redução das taxas de fecundidade. O economista lembrou ainda que as reformas previdenciárias são respostas diretas ao aumento do déficit e à escalada da dívida pública. “Por um lado, há o interesse legítimo do cidadão que contribui e espera uma aposentadoria justa; por outro, o governo precisa manter o equilíbrio fiscal e projetar soluções para os próximos 10, 20 anos. O regime geral de Previdência Social, hoje limitado a cerca de R$ 8 mil, é um mecanismo de contenção de gastos futuros. Mas a verdadeira sustentabilidade depende do aumento da base de contribuição”, afirmou o economista.
Entre os fatores que afetam essa base, Ferreira destacou a terceirização e a informalidade. “A partir dos anos 1990, a terceirização se expandiu e muitos trabalhadores passaram a atuar como pessoas jurídicas, deixando de contribuir para o regime geral. Isso alterou profundamente a arrecadação. É um fato que precisa ser considerado nas projeções atuariais”, pontuou.
Ferreira encerrou sua participação chamando atenção para a necessidade de um sistema baseado em três pilares: “O Brasil tende a migrar para um modelo tripartite — com um piso mínimo garantido pelo regime geral, a previdência complementar obrigatória para servidores e a previdência privada individual. Essa estrutura é o caminho para um sistema mais equilibrado e sustentável”, concluiu.
A conta que não fecha: riscos e fragilidades do sistema
A economista Isabel Ribeiro trouxe ao debate uma análise realista sobre os limites estruturais da Previdência brasileira. “A Previdência Social no Brasil é uma questão muito séria e, na minha visão, ela nunca vai se equilibrar. Há mais de 40 anos, desde o início da minha carreira, discute-se a necessidade de reformas, mas o déficit permanece porque as gerações presentes sempre financiam as passadas. A conta não fecha”, afirmou.
Isabel destacou que o sistema é pressionado por diversos fatores: a isenção de grupos sociais, o envelhecimento populacional, o alto número de beneficiários que não contribuíram e a precarização do mercado de trabalho. “Há muitos isentos que recebem, mas nunca contribuíram. Nós, trabalhadores formais, bancamos essas pessoas, e essa transferência permanente fragiliza o equilíbrio do sistema”, explicou.
Ela também chamou atenção para as fraudes e a necessidade de uma fiscalização rigorosa. “Apesar da rigidez dos controles, ainda há muitas fraudes. Hoje vemos golpes que capturam o dinheiro de aposentados por meio de prestadoras de serviço. A governança melhorou muito, mas o risco ainda existe”, argumentou.
Para Isabel, o aumento do trabalho autônomo e a informalidade também ameaçam a arrecadação futura. “Vivemos um processo de precarização do mercado. Os jovens, cada vez mais, rejeitam o regime CLT, o que significa menos contribuintes para o INSS. Temos um país que envelhece, mas com menos pessoas contribuindo — uma equação insustentável no longo prazo”, avaliou.
Encerrando sua fala, a economista reforçou a importância da previdência complementar como instrumento de proteção individual e responsabilidade social. “A previdência é fundamental. Seja pública ou privada, ela representa segurança. O desafio é cultural: precisamos aprender a planejar o futuro. Poupar não é luxo, é prudência econômica”, concluiu.
Caminhos para o futuro
O painel sobre Previdência Social reforçou a complexidade e a urgência do tema no debate econômico brasileiro. As falas de Luiz Adelar Ferreira e Isabel Ribeiro convergiram em um ponto central: a sustentabilidade do sistema depende de reformas contínuas, educação previdenciária e fortalecimento da base de contribuintes.
Num país que envelhece rapidamente e ainda convive com altos níveis de informalidade, pensar a Previdência é pensar o futuro fiscal e social do Brasil.
O futuro do trabalho: desafios, rupturas e novas competências para os economistas
Transformações tecnológicas, novos modelos de trabalho e o papel do Estado foram temas centrais do painel “Perspectivas profissionais – qual seu próximo emprego?”, durante o XXVI CBE
Em meio a um cenário de rápidas transformações globais e tecnológicas, o futuro do trabalho se apresenta como um desafio complexo, marcado por incertezas e oportunidades. No XXVI Congresso Brasileiro de Economia (CBE), realizado em outubro, em Porto Alegre, o painel “Perspectivas profissionais – qual seu próximo emprego?” trouxe o economista José Celso Cardoso Júnior, secretário de Gestão de Pessoas do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, para uma análise profunda sobre as mudanças estruturais no mercado de trabalho e as competências necessárias ao economista do século XXI. A moderação foi conduzida pelo conselheiro do Corecon RS Clóvis Meurer.
José Celso iniciou sua fala contextualizando as transformações históricas que moldaram o mundo do trabalho. Segundo ele, o modelo de inserção predominante nos últimos 150 anos – o emprego assalariado formal – entrou em franca transição diante das revoluções tecnológicas e das novas dinâmicas do capitalismo global. “Durante boa parte do século XX, a trajetória profissional era estruturada, previsível, ancorada em contratos formais de trabalho. Esse modelo garantia renda, estabilidade e proteção social. Hoje, tudo isso se transforma radicalmente”, afirmou. O economista destacou que o fenômeno do desemprego estrutural, intensificado ao longo das últimas décadas, ganha uma nova dimensão no século XXI, atingindo também o trabalho intelectual e do conhecimento. “A atual revolução tecnológica substitui não apenas o trabalho manual, mas também o intelectual. A inteligência artificial cria uma nova camada de desempregados estruturais — pessoas aptas, mas sem lugar fixo no mercado.”
Cardoso chamou atenção para as sete megatendências globais que moldam o contexto contemporâneo do trabalho: globalização produtiva e financeira; perda de autonomia dos Estados nacionais; colapso produtivo e humano; degradação ambiental acelerada; fragmentação cultural e social; deslegitimação da política e ameaça de conflitos militares. “Essas tendências não são exclusividade do Brasil — elas afetam o capitalismo global e desafiam economistas e formuladores de políticas. Estamos diante de um contexto muito adverso, que exige realismo e lucidez para pensar o futuro do trabalho e da profissão”, pontuou. Para o economista, essas mudanças estruturais redefinem não apenas o modo de inserção no mercado, mas o próprio papel social do economista, que deve compreender e intervir sobre fenômenos complexos e interdependentes.
Novas competências para os economistas
Ao abordar o futuro das profissões, José Celso defendeu que as novas gerações de economistas precisam desenvolver competências transversais que combinem técnica, empatia e visão sistêmica. Citando o estudo Mapa das Transversalidades, desenvolvido pela Enap, destacou dez atributos essenciais para o profissional do futuro: capacidade de resolver problemas com base em evidências, foco em resultados para a cidadania, mentalidade digital, agir comunicativo, trabalho em equipe, valores éticos, visão sistêmica, pensamento complexo e prospectivo, conhecimento crítico sobre a realidade brasileira e compreensão profunda das relações entre Estado e desenvolvimento. “O profissional do futuro precisa unir rigor técnico e compromisso social. Foco em resultados para a cidadania significa entender que nenhuma atuação laboral é um fim em si mesmo”, disse.
O economista enfatizou ainda a importância de superar a fragmentação e o isolamento intelectual dentro da própria profissão. “Os economistas, muitas vezes, se fecham em seus métodos e modelos. Precisamos romper com essa tendência e resgatar o sentido coletivo da nossa atuação. Só o trabalho em equipe salvará a humanidade do colapso total”, afirmou com ironia e convicção. Para ele, a formação econômica precisa ser reformulada para incluir o pensamento complexo e a capacidade de projetar cenários diante de mudanças disruptivas. “Não podemos continuar projetando o futuro apenas a partir do passado. As séries históricas ajudam, mas as rupturas que estamos vivendo exigem outro tipo de olhar. Precisamos pensar prospectivamente.”
Valorização do serviço público
Entre as competências que considera essenciais, Cardoso destacou a necessidade de uma compreensão crítica e densa da realidade brasileira. “O método é importante, mas não substitui o objeto de análise. Sem um conhecimento profundo da realidade nacional, o economista perde sua capacidade de contribuir para a transformação social”, disse. Ao defender a centralidade do Estado no processo de desenvolvimento, reforçou que “não há desenvolvimento sustentável, equitativo e democrático sem um Estado forte e servidores públicos valorizados”. Ele alertou para a visão distorcida e desvalorizada do serviço público, muitas vezes reforçada socialmente. “Existe uma crença de que o servidor é marajá ou preguiçoso. Precisamos combater essa ideia. Sem o Estado e seus servidores, não há como avançar em direção a um desenvolvimento soberano e inclusivo.”
Ao final do painel, José Celso reforçou que os desafios contemporâneos — do colapso ambiental à revolução tecnológica — também abrem espaço para novas frentes de atuação profissional. “Quando falo de colapso ambiental, falo também de oportunidades. A política ambiental no Brasil é recente, mas hoje é uma das áreas com maior investimento em capacitação, recomposição de quadros e inovação. O mesmo vale para a revolução tecnológica: é uma avenida aberta de oportunidades, que exige atualização constante e disposição para aprender.”
Jovens apresentam soluções sustentáveis no Desafio dos Estudantes durante o XXI CBE
Iniciativa valorizou o protagonismo dos futuros economistas e destacou projetos voltados ao desenvolvimento sustentável nas diferentes regiões do RS
O futuro da economia gaúcha passou pelas mãos dos estudantes. Durante o XXVI Congresso Brasileiro de Economia (CBE), realizado em outubro, em Porto Alegre, um dos momentos mais inspiradores da programação foi o Desafio dos Estudantes de Ciências Econômicas do Rio Grande do Sul, que reuniu oito instituições de ensino em uma disputa saudável de ideias, criatividade e propósito.
Com o tema “Desenvolvimento Sustentável: Reconstrução, Desafios e Oportunidades”, o desafio propôs que cada equipe relacionasse o assunto ao contexto do seu município ou região, apresentando soluções práticas e inovadoras para promover o crescimento econômico com responsabilidade ambiental e social. Em apresentações de até cinco minutos e com o apoio de poucos slides, os grupos mostraram que o olhar jovem pode — e deve — contribuir para pensar o desenvolvimento do país.
O primeiro lugar no Desafio deste ano ficou com a equipe da Universidade de Caxias do Sul (UCS), com o projeto “Do impacto às estratégias: caminhos sustentáveis para a reconstrução e o desenvolvimento dos negócios na Serra Gaúcha”. O trabalho destacou ações voltadas à recuperação econômica da região após os desastres climáticos recentes, unindo dados e sensibilidade social em uma proposta de reconstrução sustentável.
O segundo lugar foi para a equipe da Universidade Federal do Rio Grande (FURG) com o projeto “Avaliação dos impactos dos eventos climáticos extremos no estado do Rio Grande do Sul e proposição de instrumento de mitigação para eventos futuros”. A proposta analisou os efeitos econômicos das enchentes e sugeriu mecanismos de prevenção e resposta mais eficazes.
O terceiro lugar foi para a Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), que trouxe uma análise sobre “Impactos, desafios e oportunidades da região”, enfatizando a importância do planejamento territorial e das políticas públicas locais para o desenvolvimento sustentável.
Além das equipes premiadas, também participaram do desafio:
- Faculdade Horizontina (FAHOR) – “Resiliência Comunitária e Gestão de Emergências”;
- Universidade de Passo Fundo (UPF) – “A energia renovável como vetor para o desenvolvimento sustentável no município de Passo Fundo”;
- Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) – “Desenvolvimento sustentável no Noroeste do Estado: reconstrução, desafios e oportunidades”;
- Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) – “Sustentabilidade urbana: otimização e adaptabilidade em cidades consolidadas”;
- Universidade Federal do Pampa (Unipampa) – “ODS e Cozinhas Solidárias: enfrentamento à pobreza e promoção da sustentabilidade em Sant’Ana do Livramento”.
Mais do que uma competição, o Desafio dos Estudantes se consolidou como um espaço de valorização do pensamento crítico e da capacidade de propor soluções que unam economia, meio ambiente e desenvolvimento humano.
XXVI CBE: A mulher e o dinheiro: autonomia financeira e poder de escolha
O painel “A Mulher e o Dinheiro”, realizado dentro do Fórum da Mulher Economista e Diversidade, no XXVI Congresso Brasileiro de Economia, trouxe um debate marcado por reflexões profundas sobre segurança, autonomia e o futuro financeiro feminino. Com mediação da economista e professora Juliana Nascimento, o encontro reuniu as especialistas Dirlene Silva, Izete Pengo Bagolin e Karen Focchesatto, que trouxeram experiências distintas, mas complementares, sobre o papel da mulher nas finanças e na economia.
A economista Dirlene Silva, CEO da DS Estratégias e Inteligência Financeira, abriu sua fala destacando que falar de mulher e dinheiro é, antes de tudo, falar de autonomia, escolhas e futuro. “A economia não é apenas números e estatísticas — é sobre pessoas e sobre como as decisões econômicas impactam o nosso dia a dia”, afirmou. Ao compartilhar sua trajetória, Dirlene relatou como venceu estigmas e transformou a paixão pela economia em propósito: “Passei 30 anos no mundo corporativo e percebi que muitas vezes não exercia plenamente minha profissão. Hoje, meu trabalho é desmistificar economia e finanças, mostrando que conhecimento financeiro é poder e pode mudar vidas.”
A professora e economista Izete Pengo Bagolin, docente da PUCRS, reforçou a importância de compreender a economia sob a ótica social. “As mulheres estão cada vez mais à frente das decisões financeiras, mas continuam enfrentando desigualdades estruturais”, observou. Citando dados sobre chefes de família, ela destacou que quase metade dos lares brasileiros é liderada por mulheres, muitas delas com renda inferior à média nacional. “Elas decidem o consumo daquilo que mais importa para o futuro do país — os filhos. E fazem isso, muitas vezes, com recursos insuficientes. Esse esforço constante de equilibrar necessidades e desejos impacta diretamente seu bem-estar e o da família”, explicou.
Já Karen Focchesatto, consultora de investimentos da Unicred Porto Alegre, trouxe números reveladores sobre a presença feminina no mercado financeiro. “Apesar de 93% das mulheres participarem ativamente das finanças familiares, apenas 25% dos CPFs cadastrados na bolsa são de mulheres. E nove em cada dez não se sentem seguras para investir”, pontuou. Para ela, a falta de confiança é reflexo de uma cultura que historicamente delegou aos homens as decisões financeiras. “Ouço com frequência: ‘investimento é coisa do meu marido’. Precisamos quebrar essa crença. Investir é coisa de mulher, sim. Educação financeira é o caminho para a liberdade e a segurança emocional”, afirmou.
Dirlene aprofundou essa reflexão ao distinguir educação financeira de inteligência financeira: “Conhecimento é poder, mas só transforma quando colocado em prática. A inteligência financeira é justamente aplicar o que se aprende — é o conhecimento que liberta.” Ela lembrou que as mulheres só puderam frequentar o ensino superior há menos de 150 anos e que, por isso, cada conquista ainda tem um peso histórico. “A equidade passa pela apropriação do saber e da autonomia sobre o próprio dinheiro.”
Izete, por sua vez, ressaltou que a pressão financeira e emocional das mulheres afeta sua saúde e seu bem-estar. “O endividamento feminino é maior porque elas assumem responsabilidades que vão desde o supermercado até a educação dos filhos. Isso gera ansiedade, exaustão e até adoecimento. Precisamos de políticas públicas que garantam tempo e renda para que as mulheres cuidem de si mesmas”, defendeu.
Encerrando o painel, Dirlene resgatou um provérbio africano que resume o espírito do encontro: “Eduque um homem e estará educando um indivíduo. Eduque uma mulher e estará educando uma aldeia”. Para ela, quando uma mulher conquista autonomia financeira, transforma não só a própria vida, mas toda a comunidade ao seu redor.
XXVI CBE: Brasil precisa transformar potencial marítimo em desenvolvimento sustentável
Painel de debates destaca como o litoral brasileiro pode se tornar um vetor de inovação
O oceano cobre mais de 70% da superfície da Terra e é responsável por cerca de metade do oxigênio que respiramos, além de regular o clima e garantir o sustento de milhões de pessoas. Ainda assim, continua sendo uma das fronteiras mais negligenciadas da economia mundial. No XXVI Congresso Brasileiro de Economia (CBE), realizado em Porto Alegre, o painel “Economia Marítima” chamou a atenção ao destacar como o Brasil pode transformar seu vasto patrimônio marítimo em vetor de desenvolvimento sustentável e inovação. O debate foi mediado pelo economista, professor da UCS (RS), Mosar Leandro Ness.
O oceano como protagonista da nova economia
A economista Andréa Carvalho, professora e pesquisadora da FURG RS, abriu o painel lembrando que a economia azul — conceito que integra sustentabilidade e uso racional dos recursos marinhos — é uma das chaves para o futuro econômico global. “O oceano é vida, é emprego, é alimento, é transporte, é energia. E, no caso do Brasil, é também uma oportunidade imensa de desenvolver políticas públicas que unam crescimento e preservação ambiental”, afirmou.
Segundo Andréa, o país ainda explora de forma tímida o potencial de sua costa de mais de 8 mil quilômetros. “A economia do mar não se limita à pesca ou ao turismo. Envolve logística portuária, biotecnologia marinha, energias renováveis, transporte, educação e pesquisa. É um ecossistema de atividades que, se integrado de forma estratégica, pode gerar riqueza com responsabilidade”, explicou.
Ela destacou também o papel do Planejamento Espacial Marinho, uma metodologia usada por países que buscam conciliar o uso econômico e a proteção dos ecossistemas oceânicos. “O Brasil precisa organizar o seu território marítimo como organiza o terrestre. É um espaço de disputa por recursos e de construção de políticas. Sem planejamento, corremos o risco de repetir os erros de exploração predatória que marcaram outros setores”, alertou.
Desafios ambientais e sociais
O economista Gustavo Inácio de Moraes, professor da PUCRS, complementou o debate reforçando a interdependência entre a economia e a saúde dos oceanos. “Os mares são grandes reguladores climáticos. Qualquer desequilíbrio — poluição, pesca excessiva, aquecimento das águas — impacta diretamente a produtividade agrícola, o abastecimento de água e o bem-estar das populações costeiras”, afirmou.
Gustavo lembrou que a economia do oceano é, ao mesmo tempo, uma oportunidade e um alerta. “Temos a chance de desenvolver cadeias produtivas sustentáveis e inovadoras, mas também o dever de evitar a degradação. A poluição plástica, por exemplo, é um problema global que exige regulação, inovação tecnológica e educação ambiental. Sem isso, os custos sociais e econômicos serão cada vez maiores”, pontuou.
O economista também ressaltou que a pauta da economia azul precisa dialogar com a redução das desigualdades. “As comunidades litorâneas, em especial as que vivem da pesca artesanal, precisam ser incluídas no debate. Não há economia sustentável se ela não for também inclusiva. É preciso garantir renda, capacitação e acesso a tecnologias para essas populações”, destacou.
Agenda de oportunidades
Durante o debate, Andréa apresentou experiências internacionais bem-sucedidas que podem inspirar o Brasil, como a criação de clusters de economia azul em países como Portugal, Noruega e Chile, que integraram universidades, empresas e governos locais em torno de objetivos comuns. “Precisamos reconhecer o mar como parte da nossa identidade produtiva e científica. O investimento em pesquisa e inovação é o caminho para transformar o potencial marítimo brasileiro em desenvolvimento sustentável”, disse.
Gustavo acrescentou que o país já possui base técnica e científica para avançar nessa direção, mas precisa transformar conhecimento em ação. “O Brasil tem centros de pesquisa de ponta e uma das maiores zonas econômicas exclusivas do planeta. O que falta é traduzir isso em políticas públicas, investimentos e marcos regulatórios que incentivem a inovação verde e a economia circular”, defendeu.
Encerrando o painel, os economistas convergiram em uma mensagem de urgência e esperança. Para Andréa, “o oceano não é apenas um espaço geográfico — é um ativo estratégico que precisa ser visto como parte essencial do planejamento econômico do país”. Gustavo reforçou que o desenvolvimento sustentável depende de decisões tomadas agora. “O futuro da economia está no equilíbrio entre crescimento e preservação. E o oceano é o maior símbolo desse equilíbrio que precisamos aprender a respeitar.”
Desigualdade e produtividade: economistas destacam a educação como motor do desenvolvimento
Tema foi discutido no Painel “O combate à pobreza e à desigualdade social” do XXI CBE
Mais do que um tema econômico, a educação foi tratada no XXVI Congresso Brasileiro de Economia (CBE) como a base de um projeto de país. No painel “O combate à pobreza e à desigualdade social”, os economistas Naercio Menezes Filho e Jorge Abrahão Castro trouxeram dados e reflexões que mostraram como o investimento em capital humano deve estar no centro da agenda de desenvolvimento nacional para redução das desigualdades. O painel, mediado pelo economista João Manoel Gonçalves Barbosa, destacou a importância de pensar o crescimento econômico sob a ótica da inclusão e da sustentabilidade social, reforçando a necessidade de articular políticas públicas que unam educação, produtividade e oportunidades.
Educação como base da mobilidade social
O economista Naercio Menezes Filho, professor do Insper, iniciou sua exposição destacando a forte relação entre educação, renda e desenvolvimento econômico. “O Brasil é um país com alta desigualdade e baixa produtividade. Esses dois fatores estão diretamente ligados ao nosso atraso educacional”, afirmou.
Segundo ele, os ganhos de aprendizado na educação básica ainda são insuficientes para gerar transformações estruturais. “O problema não é só de acesso, mas de aprendizado. Muitas crianças concluem o ensino fundamental sem dominar leitura e matemática. Isso compromete a produtividade futura e perpetua o ciclo de desigualdade”, explicou.
Naercio apresentou dados que revelam o impacto da educação sobre o crescimento: “Cada ano adicional de estudo eleva em média 10% o rendimento de um trabalhador. Países que conseguiram melhorar a qualidade do ensino — como Coreia do Sul e Finlândia — experimentaram saltos expressivos na renda per capita e na inovação tecnológica.”
Ele também chamou atenção para a necessidade de políticas públicas baseadas em evidências. “Não basta gastar mais em educação; é preciso gastar melhor. Avaliar resultados, incentivar boas práticas e formar professores são medidas essenciais para garantir qualidade. A economia da educação tem mostrado que investimento bem direcionado traz retorno não apenas individual, mas para toda a sociedade.”
Na visão de Naercio, a educação é o principal caminho para a mobilidade social. “O Brasil tem uma das maiores transmissões intergeracionais de renda do mundo: o filho de uma família pobre tende a continuar pobre. A única forma de quebrar esse ciclo é por meio da escola pública de qualidade, com políticas que comecem na primeira infância e sigam até a formação técnica e superior.”
O economista ressaltou ainda que o investimento em primeira infância é o de maior retorno social e econômico. “As evidências mostram que quanto mais cedo a criança é estimulada, maior o impacto na vida adulta — em termos de escolaridade, renda e cidadania. É nessa etapa que se formam as habilidades socioemocionais que sustentam o aprendizado ao longo da vida.”
Desenvolvimento sustentável e redução das desigualdades
O economista Jorge Abrahão Castro, Coordenador-Geral da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do IBGE, deu continuidade ao debate com uma análise sobre a relação entre desenvolvimento, bem-estar e sustentabilidade. Para ele, “o crescimento econômico por si só não garante qualidade de vida. O desafio é transformar riqueza em bem-estar, com políticas que reduzam desigualdades e melhorem as condições de vida da população.”
Abrahão apresentou dados que mostram a concentração de renda no Brasil e os efeitos da desigualdade sobre a coesão social. “Os 10% mais ricos concentram quase metade da renda nacional. Isso gera um país dividido, com baixa confiança social e grandes disparidades no acesso a serviços básicos. A desigualdade não é apenas um problema moral — é também um entrave econômico.”
Segundo o economista, o país precisa de uma nova métrica de progresso, que vá além do Produto Interno Bruto. “Desenvolvimento não pode ser medido apenas pela quantidade de bens produzidos, mas pela qualidade das relações sociais, pela inclusão e pela sustentabilidade ambiental. É preciso colocar as pessoas no centro das decisões econômicas.”
Abrahão destacou que educação e meio ambiente são pilares complementares para o desenvolvimento sustentável. “Não existe sustentabilidade sem conhecimento, e não há educação transformadora sem compromisso com o planeta. A escola tem papel central na formação de cidadãos críticos e conscientes do seu papel na construção de um futuro melhor.”
O economista também citou experiências municipais que vêm combinando políticas de educação, renda e sustentabilidade, como programas de compras públicas locais, ampliação da educação integral e incentivo à economia verde. “São políticas integradas que geram resultados duradouros, pois fortalecem as comunidades e criam oportunidades de desenvolvimento com base territorial.”
O papel do economista na construção de soluções
Ao encerrar o painel, os palestrantes convergiram em um ponto: a economia deve estar a serviço da sociedade. Naercio Menezes Filho reforçou que o economista tem um papel essencial na formulação de políticas públicas que priorizem o investimento humano. “Precisamos deixar de tratar educação e desigualdade como temas sociais e trazê-los para o centro do debate econômico. São eles que determinam o potencial de crescimento do país.”
Jorge Abrahão complementou destacando que o momento atual exige novas formas de pensar o desenvolvimento. “A economia precisa incorporar indicadores sociais e ambientais em sua lógica de planejamento. A verdadeira prosperidade é aquela que é compartilhada e sustentável.”
XXVI CBE: Gilneu Vivan, diretor do Banco Central, realizou palestra de encerramento
Diretor do Banco Central defende inovação, competição e inclusão financeira como caminhos para ampliar crédito e reduzir desigualdades
O economista Gilneu Vivan, diretor de Regulação do Banco Central do Brasil, foi o responsável pela palestra de encerramento do XXVI Congresso Brasileiro de Economia. Ele destacou que enquanto as discussões se concentram majoritariamente em temas macroeconômicos, são as mudanças micro — aquelas que afetam o funcionamento do sistema financeiro no cotidiano de empresas e cidadãos — que vêm impulsionando inovação, ampliando a concorrência e criando novas oportunidades na economia brasileira.
“Não vim falar sobre macroeconomia, mas sobre reformas microeconômicas que têm trazido novas oportunidades. O debate microeconômico não ocupa o espaço que deveria no Brasil”, afirmou. Ele destacou que, embora as reformas estruturais sejam essenciais, muitas vezes o impacto transformador vem justamente das mudanças que aprimoram regras, ampliam o acesso ao crédito e reduzem custos financeiros. “Você consegue, por meio do microeconômico, mudar o dia a dia de várias empresas e milhões de pessoas”, pontuou.
Ao traçar uma linha histórica da atuação do Banco Central, Vivan afirmou que inovação faz parte do DNA da instituição. “O BC sempre foi associado à ideia de inovação. Posso contar várias histórias de iniciativas do Banco Central que foram mudando o Brasil”, disse, citando exemplos como o Sisbacen, o avanço na contabilidade do sistema financeiro, a criação do SPB (Sistema de Pagamentos Brasileiro) e, mais recentemente, a regulamentação das instituições de pagamento. “Todas essas medidas foram pensadas para reduzir a concentração, aumentar a competição e gerar benefícios concretos para os usuários do sistema financeiro”, explicou.
Vivan também destacou medidas recentes que estão revolucionando o mercado de crédito. Uma delas é o sistema de registro de ativos financeiros, que permite usar recebíveis e outros instrumentos como garantias. “Estimamos que existam cerca de R$ 13 trilhões em ativos que podem ser utilizados como garantia e que ainda não estão sendo aproveitados pelo sistema financeiro”, declarou. Ele também ressaltou o sucesso do Pix, que em apenas cinco anos praticamente eliminou o uso de dinheiro em espécie para pagamentos cotidianos. “O Pix é um sucesso incontestável. Reduziu custos para os bancos, aumentou a inclusão financeira e melhorou a eficiência do sistema.” O diretor também citou o Open Finance como outra mudança profunda: “Hoje mais de 60 milhões de brasileiros já utilizam o Open Finance. Estamos devolvendo ao cliente o poder sobre seus dados financeiros e ampliando seu poder de negociação com os bancos.”
Encerrando sua fala, o diretor abordou o próximo ciclo de transformação do sistema financeiro, baseado em tokenização de ativos, digitalização do crédito e novas fronteiras para financiamento produtivo. Para ele, a criação de um sistema financeiro mais dinâmico passa pela modernização da infraestrutura de mercado. “A tokenização permite transformar qualquer ativo em representação digital negociável, reduzindo custos, aumentando transparência e dando velocidade às operações”, afirmou. Vivan também destacou que, apesar do avanço tecnológico, é preciso ter responsabilidade no uso de ferramentas como inteligência artificial. “A IA tem enorme ganho de escala, mas traz desafios quando reduz a criatividade e a tomada de decisão crítica. Precisamos usar tecnologia sem perder o elemento humano”, alertou. Segundo ele, inovação deve ser instrumento de desenvolvimento econômico e inclusão, nunca exclusão: “A agenda do Banco Central é baseada em competitividade, inclusão e sustentabilidade. Inovamos para gerar oportunidades para todos”.
XXVI CBE: Evento chega ao fim; São Paulo será a próxima sede
Encerramento do Congresso Brasileiro de Economia destaca unidade, compromisso social e novos desafios para a profissão
Após três dias de intensos debates, palestras, painéis, fóruns e trocas de experiências, o Congresso Brasileiro de Economia chegou ao fim deixando como marca o sentimento coletivo de missão cumprida. Economistas de todas as regiões do país, estudantes, pesquisadores e autoridades se reuniram em Porto Alegre para discutir caminhos para o desenvolvimento nacional, com foco na inovação, sustentabilidade, inclusão social e fortalecimento das instituições. Com auditórios cheios e discussões qualificadas, a edição reafirmou o papel do Congresso como espaço estratégico para a reflexão crítica e a construção de propostas para os grandes desafios da economia brasileira.
No evento foi aprovada a Carta do Congresso Brasileiro de Economia, documento que sintetiza as propostas e deliberações construídas ao longo das plenárias. O texto final recebeu contribuições que foram discutidas e votadas pelos economistas presentes. O documento aprovado traz diretrizes voltadas à retomada do desenvolvimento com justiça social e ao fortalecimento da posição de protagonismo do Brasil no cenário internacional.
Outro destaque foi a apresentação do Manifesto do Cofecon sobre a questão climática, aprovado por aclamação. O documento reconhece a urgência das mudanças climáticas como um desafio econômico e civilizatório, defendendo uma transição ecológica justa para o País, afirmando também que o Brasil tem um lugar de protagonismo neste movimento. O texto também reforça a importância dos debates realizados em nível nacional (como o ciclo de seminários promovido pela Comissão Sustentabilidade Econômica e Ambiental do Cofecon) e regional (Encontro de Economistas da Região Sul e Encontro de Entidades de Economistas da Amazônia Legal) – em cada um destes âmbitos, foi produzido um documento com recomendações para levar à COP30, que acontecerá em Belém no mês de novembro.
A escolha da sede do próximo Congresso Brasileiro de Economia também movimentou o público: a única candidatura foi a de São Paulo, que assumiu o compromisso de dar continuidade ao legado construído em Porto Alegre.
“Este foi um Congresso feito a muitas mãos. Receber economistas de todo o país em Porto Alegre foi uma honra. Espero que São Paulo tenha muito trabalho para fazer um evento ainda melhor”, expressou o presidente do Corecon-RS, Rodrigo Salvato de Assis. Já a presidenta do Cofecon, Tania Cristina Teixeira, destacou o caráter unificador do evento. “Debatemos juventude, diversidade, políticas públicas e o futuro da economia brasileira. Saio com a alma lavada, convicta de que fizemos um congresso grandioso, com democracia e participação”, comentou. E finalizou, quebrando o clima formal: “Bye bye, Porto Alegre – a saudade já começa agora”.
Manifesto do XXVI Congresso Brasileiro de Economia – Por um Brasil líder na transição justa e no equilíbrio climático
O XXVI Congresso Brasileiro de Economia apresenta à sociedade brasileira e à comunidade internacional este Manifesto, às vésperas da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), que será realizada em Belém do Pará. Pela primeira vez na história, a Amazônia, coração da biodiversidade planetária, acolhe o encontro climático mais importante do mundo, consolidando o papel estratégico do Brasil no enfrentamento da emergência climática e na construção de um futuro sustentável.
Esta Conferência não representa somente uma oportunidade para debater emissões, tecnologias ou metas climáticas; é um chamado à compreensão de que sem equilíbrio climático não haverá prosperidade econômica, justiça social ou democracia sólida. A emergência ambiental exige uma atuação integrada, em que governos, empresas, organizações da sociedade civil e cidadãos assumam responsabilidades compartilhadas para a preservação do planeta e a garantia de um futuro digno para todas as gerações.
Nós, economistas, e demais profissionais desempenhamos um papel central ao analisar impactos econômicos, propor políticas públicas ecoeficientes e avaliar, através de múltiplos critérios, os impactos socioeconômicos e ambientais de cada processo econômico que se realiza na busca por soluções que permitam uma transição ecológica justa. Nossa profissão tem um papel importante na formulação de medidas e na construção de políticas.
O Sistema Cofecon/Corecons, como instância de representação da categoria, reafirma seu compromisso de não se omitir neste debate: estará ativo na discussão de estratégias e soluções que conciliem desenvolvimento econômico, justiça social e sustentabilidade ambiental, reforçando que a economia do presente e do futuro deve ser verde, inclusiva e responsável com a nossa geração e com as próximas.
Necessidade de transição justa
Vivemos tempos em que os impactos das mudanças climáticas já não podem ser ignorados. Eventos extremos (enchentes, estiagens, ondas de calor e desastres ambientais) afetam milhões de brasileiros e comprometem a produção, a infraestrutura e a qualidade de vida. No ano passado, o Rio Grande do Sul viveu a maior catástrofe climática de sua história, com 184 mortes, 25 pessoas ainda desaparecidas e quase 100 mil desabrigados. Na Amazônia, uma estiagem prolongada levou vários rios ao menor nível de sua história e ocasionou o registro de mais de 25 mil focos de incêndio. A região sofre, ademais, com os efeitos do avanço do desmatamento, da grilagem e da exploração predatória.
Nas grandes cidades, a combinação de ilhas de calor urbano, precariedade habitacional e desigualdade socioambiental evidencia a urgência de políticas integradas e resilientes. É necessário articular planejamento urbano, investimentos em infraestrutura verde, mobilidade sustentável e gestão eficiente dos recursos hídricos e energéticos, de modo a reduzir vulnerabilidades e promover cidades mais justas e saudáveis. O papel do economista reveste-se de relevância estratégica nesse processo ao avaliar os impactos socioeconômicos, propor mecanismos de incentivo à adaptação e orientar a implementação de políticas que conciliem crescimento econômico, inclusão social e preservação ambiental.
O Cofecon entende que a transição necessária não pode se restringir a mudanças tecnológicas – ao contrário, deve ser ecológica, social e econômica, ancorada em princípios de justiça climática. Isso implica que os povos da floresta, comunidades ribeirinhas, quilombolas, indígenas e trabalhadores (urbanos e rurais) não sejam meros objetos de políticas, mas protagonistas e beneficiários de uma transformação estruturante.
Amazônia: centro da agenda global
A Amazônia, além de ser o maior patrimônio natural do Brasil, é também um pilar do equilíbrio climático global. Conscientes de que a floresta em pé tem valor superior ao da derrubada indiscriminada, defendemos a construção de um pacto econômico pela Amazônia, que fortaleça a bioeconomia, valorize os conhecimentos tradicionais, enfrente o desmatamento e atividades ilegais e assegure alternativas econômicas endógenas e sustentáveis.
Neste sentido, é imprescindível ampliar os investimentos em ciência, tecnologia e inovação, criar mecanismos de compensação financeira justa (como royalties climáticos, pagamentos por serviços socioambientais e créditos de carbono com viés redistributivo) e garantir o protagonismo dos amazônidas no planejamento e execução das políticas públicas para a região. Só assim será possível conciliar conservação ambiental, justiça social e desenvolvimento econômico sustentável.
Participação no debate econômico
Como resultado de um amplo processo de reflexão coletiva, três documentos foram consolidados no âmbito do Sistema Cofecon/Corecons, expressando o compromisso da categoria com a agenda climática e a transição justa. Após os debates realizados no 29º Encontro de Economistas da Região Sul (Enesul), em agosto de 2025, o Corecon-SC apresentou um documento com propostas para discutir no âmbito do Sistema Cofecon/Corecons e, posteriormente, levar à COP30. A Carta do XIII Encontro das Entidades de Economistas da Amazônia Legal, sediado no mesmo mês em Manaus, também foi confeccionada com o intuito de ser encaminhada à COP30. Da mesma forma, no Cofecon, a Comissão de Sustentabilidade Econômica e Ambiental conduziu o ciclo de seminários “Diálogos Econômicos à Luz da COP30”, reunindo especialistas, acadêmicos, representantes da sociedade civil e economistas de diferentes regiões do país. A partir desse processo, foi elaborado o documento “Equilíbrio Climático para um Futuro Ecológico Comum”, cuja finalidade é oferecer subsídios qualificados à liderança brasileira na COP30 e contribuir para que o país assuma um papel protagonista na governança climática global.
Entre as medidas propostas pelo Sistema Cofecon/Corecons, encontram-se:
- Transição ecológica justa: integração de bioeconomia, economia circular, agroflorestas regenerativas, energias renováveis e renda básica como instrumentos de inclusão e sustentabilidade.
- Valoração econômico-ecológica: políticas que reconheçam o valor dos serviços socioambientais, garantindo redistribuição justa e evitando a financeirização predatória da natureza.
- Governança climática: fortalecimento de marcos regulatórios, transparência, combate ao greenwashing e alinhamento entre políticas fiscal, monetária e ambiental.
- Financiamento sustentável: criação de fundos nacionais e internacionais para adaptação e mitigação, incluindo o Fundo Florestas Tropicais para Sempre, proposto pelo Brasil.
- Educação e ciência: incentivo a laboratórios regionais de economia ecológica, integração entre saberes tradicionais e científicos e fortalecimento da formação técnica para gestores e comunidades.
O Cofecon reafirma que não há economia próspera em um planeta doente. A COP30 oferece a oportunidade histórica de consolidar um projeto nacional de desenvolvimento sustentável, inclusivo e democrático. O Brasil deve assumir uma posição de liderança global, não como exportador de commodities ambientais, mas como exemplo de transição justa, de justiça climática e de construção de prosperidade a partir da biodiversidade e do êxito na descarbonização da economia.
Este Manifesto é um chamado a governos, empresas, instituições e cidadãos. O equilíbrio climático deve ser o alicerce de um futuro ecológico comum. Somente com ação coordenada, conhecimento científico e valorização das comunidades locais será possível construir um Brasil líder na transição justa e no equilíbrio climático, capaz de oferecer segurança ambiental, prosperidade econômica e justiça social para todos.
Carta de Porto Alegre
Os economistas brasileiros reunidos no XXVI Congresso Brasileiro de Economistas (CBE), com o tema “Desenvolvimento Sustentável: Reconstrução, Desafios e Oportunidades”, realizado em Porto Alegre/RS, de 7 a 9 de outubro, vêm se manifestar a respeito do momento vivenciado pela economia brasileira e suas condicionalidades e perspectivas.
A economia mundial vive um período de grandes transformações. Nos últimos anos, a Pandemia Covid-19 e os impactos da crise climática e das guerras representam reflexos profundos nas cadeias produtivas internacionais, mais recentemente também influenciadas pelo tarifaço imposto pelo governo dos EUA.
Internamente, os programas governamentais de transferência de renda, tanto do ponto de vista econômico quanto social e ambiental, precisam ser preservados e aprofundados. Seus desdobramentos representam avanços significativos na retomada do papel do Estado na condução de um projeto de desenvolvimento sustentável.
Sob o ponto de vista social, a reformulação e o aprimoramento de tais iniciativas são relevantes para minimizar os efeitos de uma sociedade desigual e injusta. Nesse sentido, também a política de valorização do salário mínimo, com impactos diretos nas aposentadorias, pensões e benefícios, tem sido relevante para a preservação do poder de compra da parcela mais vulnerável da população. No mercado de trabalho, a baixa taxa de desocupação tem favorecido a recuperação da renda das famílias brasileiras, sobretudo as mais vulneráveis.
Destaque-se os avanços no campo da questão tributária, com a aprovação no Congresso Nacional da primeira fase (envolvendo os impostos indiretos), e a discussão em andamento da desoneração do Imposto de Renda para as menores faixas de renda e a tributação dos super-ricos, corrigindo distorções históricas nesse campo.
Ainda no âmbito das políticas macroeconômicas, urge reduzir o custo do capital representado por uma taxa Selic de 15% ao ano, ainda excessivamente elevada comparativamente à rentabilidade esperada dos projetos, inibindo investimentos e ainda onerando excessivamente o financiamento da dívida pública e privada.
A proximidade da Cúpula do Clima, em Belém, no mês de novembro, será outra oportunidade para o posicionamento brasileiro na geopolítica do clima e do meio ambiente. O Brasil aumentou a ambição da sua meta de redução de gases de efeito estufa e retomou componentes fundamentais do plano nacional de ação climática rumo à implementação de medidas concretas para atingimento das metas.
No âmbito externo, o reposicionamento do Brasil, exercendo seu papel geoeconômico e político de pertencer ao grupo das dez maiores economias do mundo, tem sido primordial para garantir uma reinserção internacional soberana e autônoma, no sentido da preservação dos nossos interesses comerciais e estratégicos, com a defesa do Estado Democrático de Direito e da liberdade de expressão.
Os desafios impostos pela nova configuração da economia mundial, por outro lado, também representam oportunidades para a recolocação do Brasil, considerando nossas potencialidades de autonomia alimentar, hídrica e energética. É a partir desse referencial que, no nosso papel de entidades representativas dos economistas brasileiros, apoiamos e defendemos as iniciativas e ações em curso em prol da consolidação de um Projeto Nacional de Desenvolvimento autônomo e sustentável.
Fonte: Cofecon